Cidades

A pedido do Correio, dez pessoas fizeram teste do bafômetro depois de beber

Experiência foi feita no dia da estreia da Seleção na Copa do Mundo. Apesar de apenas um resultado negativo, todos afirmaram que voltariam para casa dirigindo

Juliana Boechat
postado em 18/06/2010 07:00

Em 2009, os agentes de trânsito autuaram 6.838 motoristas que dirigiam alcoolizados nas ruas do DFPrestes a completar dois anos, a Lei n; 11.705/08 ; mais conhecida como a lei seca, que entrou em vigor em 20 de junho de 2008 ; ainda é desrespeitada por muitos brasilienses. Apesar dos números crescentes de autuações por embriaguez ao longo dos últimos 23 meses, muitos motoristas misturam álcool e direção e apostam na sorte para escapar ilesos das blitzes. Um levantamento do Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF) mostra que, de janeiro a maio deste ano, 3.752 motoristas foram flagrados por dirigirem depois de beber, o que representa uma média de 24 pessoas notificadas a cada dia. O número cresceu em relação ao registrado em 2009, quando os agentes de trânsito expediram 6.838 autuações ; 18 por dia. Na última terça-feira, após a estreia da Seleção Brasileira na Copa do Mundo, o Correio percorreu quatro bares na Asa Sul com bafômetros descartáveis(1) cedidos pelo Detran. Das 28 pessoas consultadas sobre a lei seca, 10 admitiram que pegariam o volante mesmo tendo ingerido álcool.

Os testes feitos pela reportagem mostraram que quatro pessoas estavam com a concentração de álcool acima de 0,3 miligrama por litro de ar expelido dos pulmões, o que configura crime (veja O que diz a lei). Cinco condutores registraram menos de 0,3mg/l e, para apenas um deles, o teste acusou uma concentração abaixo de 0,1mg/l. Alguns dos voluntários compartilharam histórias de amigos que perderam a carteira de habilitação ao serem pegos na Operação Álcool Zero ; alguns deles já haviam sido punidos com a multa e a apreensão da CNH. Ainda assim, preferem confiar em algumas táticas para escaparem da fiscalização. Muitos optam por dormir na casa de um amigo, mudam o caminho ou tentam convencer o agente de trânsito de que não estão embriagados. Por outro lado, alguns grupos cumprem a lei. Elegem o amigo da vez ou optam por voltar para casa de metrô ou de táxi.

Experiência foi feita no dia da estreia da Seleção na Copa do Mundo. Apesar de apenas um resultado negativo, todos afirmaram que voltariam para casa dirigindoNa última terça-feira, 79 motoristas foram autuados pelo Detran e pelo Batalhão de Trânsito da Polícia Militar por conduzirem sob o efeito de álcool. Os órgãos de trânsito reforçaram a fiscalização antes e depois do jogo do Brasil nas principais vias do Distrito Federal, o que deve voltar a acontecer nas próximas partidas da Seleção. O batalhão militar conta com 30 homens e 15 viaturas extras para realizar o trabalho de prevenção nos bares e combater, com fiscalização, a mistura de álcool e direção. Das16h30 às 23h, o BPTrans multou 58 motoristas e encaminhou três pessoas à delegacia. Na Operação Bafômetro, realizada pelo Detran nas ruas do Plano Piloto, de Taguatinga, do Sudoeste, de Ceilândia e de Samambaia, 21 condutores foram autuados e quatro deles, presos. O Sudoeste registrou o maior número de infratores, com sete ocorrências.

Moradora de Águas Claras, Jéssica*, 23 anos, assistiu ao jogo do Brasil com as amigas em um bar na Asa Sul. Como ela é a única que reside fora do Plano Piloto, não pode contar com carona para voltar para casa. Ainda assim, bebeu vodca durante quase quatros horas. ;Eu bebo e dirijo desde os 15 anos. Nunca aconteceu nada comigo e não tenho medo de ser pega. Nessas horas, eu abaixo o vidro e o som do carro e aposto na sorte;, confessou. Ela conhece, no entanto, três amigos que perderam a carteira de habilitação, tiveram o carro apreendido e foram obrigados a pagar a multa de R$ 957 por adotarem o mesmo comportamento. ;Quando a lei seca entrou em vigor, parei de beber e dirigir durante uns quatro meses, mas nunca fui pega e voltei à antiga rotina;, contou. Segundo Jéssica, ela só pega o volante quando sente que está em boas condições. Do contrário, dorme na casa de uma amiga.

A chave do carro do estudante Marcus Alberto Nóbrega, 25 anos, estava em cima da mesa ao lado do copo de cerveja em um estabelecimento na 206 Sul. Ele, a namorada e um amigo aproveitaram o fim da partida para conversar e beber. ;Eu ia para Vicente Pires. Mas como sabia que ia beber, preferi ficar perto de casa;, justificou o morador da Asa Norte. Segundo Marcus, a Lei Seca nunca o intimidou. Ele confessa, no entanto, que presta mais atenção no trânsito e muda o caminho na tentativa de driblar a fiscalização. ;Já passei numa blitz e tinha bebido. Fiquei com medo, mas não fui parado;, relatou. O jovem estava bebendo havia quase três horas quando foi entrevistado pela reportagem. O resultado do teste do bafômetro revelou que ele seria preso caso algum agente de trânsito o abordasse. ;Estou bem para dirigir. O nível de álcool no organismo é relativo;, teorizou.

O ator Maximiliano*, 32 anos, dirige sem carteira de habilitação há quase 10 dias e responde a dois processos administrativos por guiar alcoolizado. Ele estava em uma festa no Setor Bancário Sul quando decidiu beber uma lata de cerveja, mas desistiu ainda na metade da dose. Ao sair do local, foi parado em uma blitz e o teste do bafômetro acusou 0,16mg/l. ;Eu estava com a barriga vazia. Não tem o que argumentar;, disse. Ele apoia a iniciativa de combate ao álcool nas vias do Distrito Federal, mas acredita que a lei não deve ser aplicada apenas como uma forma de punição. ;A tolerância é muito baixa;, disse. No teste realizado pelo Correio, o bafômetro registrou menos de 0,3 mg/l para o teste de Maximiliano, que havia bebido uma dose de uísque e algumas cervejas.

A estudante Tainá Ferreira, 19 anos, decepcionou-se quando viu o resultado do exame ; menos de 0,3 miligrama de álcool por litro de ar expelido ; acusar que ela tinha bebido. ;Eu só tomei meia caneca de chopp;, defendeu-se. As amigas que acompanhavam a jovem defendem a lei seca e garantem que não misturam álcool e direção. ;Sempre fui contra beber e dirigir. Mas só bebo se estiver sem o carro, aí optamos pela carona sóbria. Não é medo da blitz, mas sim de causar um acidente grave;, resumiu. A colega Gabriela de Araújo Magalhães, 18 anos, defende a fiscalização, mas acredita que hoje não há o mesmo rigor de um ano atrás. ;Eu quase não vejo blitz na rua e as pessoas usam a desculpa de não produzir provas contra si mesmo para não realizar o teste. Acaba que as pessoas driblam a lei e saem impunes.;

Mais simples
O bafômetro descartável não é tão preciso quanto o aparelho usado nas blitzes pelo Detran e pela Polícia Militar. No aparelho mais simples, a pessoa deve assoprar o balão de forma lenta e contínua até enchê-lo. Em seguida, o ar coletado deve ser expelido em no tubo onde ocorre a reação química. Se a parte amarelada ganhar um tom esverdeado, indica que a pessoa bebeu. Se a coloração verde ultrapassar o anel central do tubo, o resultado é superior a 0,3 miligramas de álcool por litro de ar expelido.

*Os nomes fictícios foram escolhidos pelos personagens para preservar a identidade de cada um.


O que diz a lei
A Lei n;11.705/08, popularmente conhecida como lei seca, alterou alguns pontos do Código de Trânsito Brasileiro. A norma introduziu punições rigorosas para quem combina bebida e direção e passou a tratar como crime os casos em que o condutor está com uma concentração alta de álcool no sangue. Para verificar o nível de alcoolemia do motorista, os agentes de trânsito podem realizar o teste do bafômetro, exame de sangue, auto de constatação ou ainda exame no Instituto Médico Legal. No caso do bafômetro, se o resultado acusar até 0,1 miligrama por litro de ar expelido dos pulmões, o condutor é liberado. Se a concentração ficar entre 0,1mg/l e 0,29mg/l, o motorista paga multa de R$ 957 e pode ter o veículo apreendido e o direito de dirigir suspenso por um ano. Acima de 0,3mg/l, o condutor pode ser preso, além de ser submetido a todas as demais punições.


Tolerância zero
A lei seca poderá ficar ainda mais rigorosa. Um projeto de lei, previsto para ser votado na próxima semana em uma subcomissão da Câmara dos Deputados, prevê a extinção da quantidade mínima de bebida alcoólica que o condutor pode ingerir antes de dirigir. A proposta dá ainda aos agentes de trânsito poder para comunicar o flagrante à polícia. O deputado Marcelo Almeida (PMDB-PR), relator do matéria, defende que vídeos, fotos e testemunhas possam ser usadas como provas da embriaguez. Outra novidade no relatório de Almeida é a criação de uma nova tipificação criminal: a condução suicida. Poderão ser enquadradas nesse artigo pessoas que tiverem qualquer atitude de desapreço à vida alheia. ;Estamos falando do motorista que entra na contramão em alta velocidade, por exemplo;, explica o parlamentar.

Interdição da EPTG
Os motoristas que utilizam a Estrada Parque Taguatinga (EPTG) devem ficar atentos amanhã, quando o tráfego na via será interrompido das 14h às 16h. As vigas metálicas da passarela aérea n;1 serão erguidas durante o período. Como não há via marginal para desviar o trânsito, a solução encontrada foi bloquear a pista. O motorista deve optar pelas seguintes opções: seguir pelo Pistão Sul, retornar próximo ao Taguatinga Shopping ou seguir em direção à Águas Claras e retornar à EPTG na altura da Unieuro. Quem desejar, pode optar pela Estrada Parque Núcleo Bandeirante e pela Estrutural.

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