postado em 22/06/2010 07:00
A sessão que definirá o destino da deputada distrital Eurides Brito (PMDB), flagrada em vídeo enchendo a bolsa com maços de dinheiro, será secreta. Por determinação do desembargador Natanael Caetano, do Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), a votação, marcada para as 15h de hoje no plenário da Câmara Legislativa, será fechada ao público e até mesmo à imprensa. Com a liminar, concedida no fim da tarde de ontem pelo magistrado, o voto de cada um dos distritais será mantido sob sigilo. Nos bastidores da Casa, a expectativa é de que a decisão judicial poderá favorecer a absolvição da parlamentar, acusada de quebra de decoro parlamentar. Eurides está afastada do cargo por determinação da Justiça.
No último dia 18, os advogados da distrital entraram na Justiça com um mandado de segurança, com pedido de liminar, para tentar suspender a sessão de hoje. De quebra, pediram que a votação fosse fechada, caso houvesse o quorum mínimo de 13 deputados no plenário. O desembargador acatou em parte o pedido da defesa. Os advogados alegaram que o depoimento sigiloso de Durval Barbosa à deputada Érika Kokay (PT), relatora do processo contra Eurides na Comissão de Ética da Câmara, não permitiu o direito de ampla defesa à distrital. Natanael Caetano entendeu que o argumento era insuficiente para suspender a sessão. ;Não sendo verossimilhante a alegação de ofensa ao contráditório e à ampla defesa, é incabível a pretendida suspensão da votação prevista para amanhã (hoje), 22 de junho de 2010;, escreveu em seu voto.
No entanto, em relação ao pedido de votação secreta, o desembargador fundamentou o voto favorável a Eurides em dois artigos da Constituição Federal. Na decisão, Natanel cita os artigos 27 e 55 da Carta Magna. O primeiro estabelece que, em caso de perda de mandato parlamentar, valem as regras da legislação federal, e não da local. O entendimento derruba a autonomia da Lei Orgânica do DF para legislar sobre o assunto. Já o artigo 55 da Constituição define que a cassação de deputado só será decida por voto secreto no âmbito legislativo.
Para ilustrar a decisão pela sessão à portas fechadas, o desembargador citou no voto o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (Adin) 2.461 no Supremo Tribunal Federal (STF), em 2005. Os ministros consideraram ilegal a alteração da legislação local do Rio de Janeiro (RJ) para casos de perda de mandato parlamentar. O estado fluminense previa que todas as votações da assembleia legislativa fossem abertas.
Sem recurso
O precedente foi considerado determinante pela Procuradoria-Geral da Câmara Legislativa para não recorrer da sentença proferida pelo TJDFT. Segundo o procurador, Fernando Nazaré, a decisão do STF é soberana. ;A Adin foi contra um dispositivo da Constituição do RJ que foi alterada, a exemplo do que ocorreu aqui. O relator Gilmar Mendes (no STF) entendeu que a votação de perda de mandato tem que seguir o modelo da Constituição Federal. É o suficiente para recomendar à Mesa Diretora que não recorra da decisão;, analisou.
Relator do processo contra Eurides na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o deputado Chico Leite (PT) tinha esperanças de que a Mesa Diretora recorresse contra a liminar. O petista, que é o autor da emenda à Lei Orgânica do DF que determina o voto aberto em todas as sessões da Casa, considerou lamentável a decisão da Justiça e contestou a tese construída pelo desembargador. ;A votação secreta parlamentar é que contraria os princípios constitucionais. Quem tem mandato tem o dever de prestar contas e votar abertamente para que o eleitor saiba como se posiciona;, afirmou.
Um dos advogados de Eurides, Jackson Domenico, disse que não há como ficar 100% confiante no voto dos parlamentares porque a Câmara, sobretudo, é uma casa política. ;A decisão é política e não técnica. Se fosse técnica, não poderia haver a cassação de um mandato que não existe;, defendeu. Domenico lembrou que as acusações contra Eurides ocorreram em 2006, ou seja, pertencem ao mandato anterior da distrital. Ele disse que, caso haja quorum na sessão de hoje, o direito de defesa da distrital será utilizado na tribuna. Para que o mandato de Eurides seja cassado, é necessária maioria absoluta de votos ; ou seja, 13, independentemente do total de parlamentares presentes à sessão.
"Quem tem mandato tem o dever de prestar contas e votar abertamente para que o eleitor saiba como se posiciona;
Chico Leite, deputado distrital pelo PT e autor da lei que acaba com o voto secreto na Câmara do DF
Chico Leite, deputado distrital pelo PT e autor da lei que acaba com o voto secreto na Câmara do DF
Análise da notícia
Segredo imprevisível
Lilian Tahan
A decisão da Justiça de autorizar sessão secreta para o julgamento da distrital Eurides Brito foi a senha de redenção política da distrital e a máscara desejada por colegas da deputada, que até topam salvá-la. Mas sem aparecer como os guardiões da distrital flagrada metendo R$ 30 mil entregues por Durval Barbosa em sua bolsa. Até o momento em que os distritais contavam com a votação em sessão aberta, nos bastidores a condenação política da deputada era dada como certa. Até mesmo por ela. O resultado seria próximo dos 13 votos necessários para a cassação de mandato.
Os faltosos já eram aguardados. Eurides foi da cozinha do governo. Era a líder do Executivo na Câmara. Conhece bem como se davam as negociações políticas. E, na avaliação de alguns distritais, poderia incluir nomes ao escândalo do mensalão. Há relatos de que teria ventilado essa possibilidade como estratégia de salvação.
O único risco do voto secreto para Eurides é o de que o formato protege com o anonimato os amigos da deputada, mas também torna os desafetos invisíveis. E uniformiza a decisão. Mas o fato a ser lembrado pelos eleitores em outubro próximo é que o conjunto de 24 deputados ficará marcado, seja pela cassação ou salvação da deputada que virou um dos símbolos do maior escândalo político do Distrito Federal.