Ana Maria Campos
postado em 24/06/2010 07:00
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve fechar o semestre com o julgamento do pedido de intervenção na capital do país, protocolado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Relator do processo, o presidente da Corte, Cezar Peluso, pediu a inclusão do caso na pauta de julgamentos. A expectativa é de que o assunto, um dos mais controversos da Operação Caixa de Pandora, seja apreciado pelo plenário na última sessão antes do recesso, na próxima quarta-feira. Uma decisão favorável significará interferência direta na gestão do atual governador Rogério Rosso (PMDB), eleito há dois meses pelos deputados distritais, e também uma forte ingerência de autoridades da União na pauta de votações da Câmara Legislativa.
Caso o Supremo acate o pedido de Gurgel, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá nomear um interventor para o lugar de Rosso. Na sessão de quarta-feira, Peluso, considerado um dos ministros mais técnicos e conservadores da Corte, apresentará um relatório e voto. Se nenhum ministro pedir vista, o assunto será resolvido com o voto de maioria do plenário. Seria a primeira vez que uma unidade da Federação sofreria intervenção federal. Roberto Gurgel apresentou o pedido em 11 de fevereiro ; mesmo dia em que foi preso o então governador, José Roberto Arruda ; sob a justificativa de que as instituições do Distrito Federal estão contaminadas pela corrupção, conforme indica investigação da Polícia Federal e do Ministério Público Federal no Inquérito n; 650 em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Antecessor de Peluso na presidência do STF, o ministro Gilmar Mendes, que esteve na relatoria do processo até abril, chegou a declarar que há uma ;metástase institucional; no DF.
Legitimidade
Há 10 dias, a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, anexou ao processo um aditivo em que voltou a defender a intervenção. Para o Ministério Público Federal, entre deputados titulares e suplentes, há 26 investigados no inquérito do STJ, sob suspeita de se beneficiarem de um suposto esquema de pagamento de mesadas e propinas em troca de apoio ao governo Arruda. Dessa forma, a Casa não teria legitimidade para eleger um chefe do Executivo para mandato-tampão até a transição para o próximo governador que será eleito em outubro.
Na petição, Duprat ressaltou que a Câmara não teve sequer capacidade para eleger um corregedor e reclamou de que, até então, o Legislativo não havia tomado nenhuma providência prática para punir os distritais citados na Operação Caixa de Pandora. Na sessão da última terça-feira, os deputados cassaram ; por 16 votos a favor, três contrários e três abstenções ; o mandato de Eurides Brito (PMDB), que protagoniza uma das principais gravações feitas pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa, ao aparecer guardando dinheiro na bolsa. Foi a primeira punição aplicada, uma vez que Leonardo Prudente e Júnior Brunelli renunciaram para escapar da cassação.
A Procuradoria-Geral do DF e da Câmara Legislativa sustentam que o Distrito Federal caminha com normalidade institucional depois da eleição de novo governador, Rogério Rosso. Todos os serviços públicos estariam sendo prestados e os distritais estariam tomando as medidas necessárias para investigar os envolvidos na crise.
O QUE DIZ A LEI
Prevista no Capítulo VI da Constituição Federal, a intervenção federal é considerada uma medida excepcional que suprime a autoridade de políticos eleitos e cassa temporariamente a autonomia política da unidade alvo da decisão. Para que seja decretada, é necessário o voto da maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Em seguida, a decisão é remetida ao presidente da República, que edita um decreto estabelecendo todos os parâmetros relacionados ao tempo e à extensão da medida. Um interventor é nomeado para tomar as providências da administração pública. O processo exige ainda um aval do Congresso que aprova ou rejeita o ato. Durante o período que durar a intervenção, fica suspensa a promulgação de qualquer emenda constitucional em tramitação.
IR RETIDO NA FONTE FICA COM O GDF
Os R$ 30 milhões mensais provenientes do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) pago pelos 40 mil servidores da área de segurança pública continuarão com o GDF. A decisão é do plenário do Tribunal de Contas da União (TCU), que referendou ontem a liminar concedida em 17 de junho. Como o governo federal custeia os salários desses funcionários, o Ministério da Fazenda reivindica os valores retidos desde 2003. A decisão vale até que o mérito da questão seja julgado e definido para quem deve ir o IRRF.
Visão do Correio
Sem justificativa para uma ação drástica
O pedido de intervenção no Distrito Federal foi feito pela Procuradoria-Geral da República há quase cinco meses. Desde então, José Roberto Arruda foi cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e Paulo Octávio renunciou ao cargo de governador interino. Como prevê a Constituição, as eleições indiretas transcorreram dentro da normalidade jurídica, e Rogério Rosso foi eleito pela Câmara Legislativa.
Há dois meses, o governo vem caminhando com as próprias pernas, na tentativa de reconduzir a capital do país a uma situação de tranquilidade institucional. Dos três deputados distritais flagrados em vídeo recebendo suposta propina, dois renunciaram ; Leonardo Prudente e Júnior Brunelli ; e Eurides Brito foi cassada. Além disso, as greves que tumultuam a rotina dos brasilienses independem do fato de estarmos sob um governo-tampão. Estamos às vésperas das eleições, e tanto rodoviários quanto policiais civis são duas categorias fortemente politizadas.
Nesses últimos cinco meses, em nada se agravou a situação para que seja justificada a decretação de uma intervenção federal no DF. Pelo contrário, o que Brasília mais precisa agora é de tranquilidade para enfrentar o processo eleitoral que escolherá o próximo governador . Este sim, eleito pelo povo, terá o dever de fazer com que a capital da República volte à sua normalidade institucional.