Cidades

IML pede socorro

Apesar da demora no recolhimento de corpos, o órgão garante que a greve dos policiais não alterou a rotina de trabalho. Falta de estrutura é apontada como causa do problema

Naira Trindade
postado em 26/06/2010 07:00 / atualizado em 19/10/2020 11:18


Os carros estão muito rodados e o quadro de funcionários também é antigo Malthus Galvão, diretor do Instituto Médico LegalO quadro de funcionários e viaturas do Instituto de Medicina Legal está defasado. Dos cinco carros que recolhem corpos pelas ruas do Distrito Federal, dois estão na oficina com problemas mecânicos e um, que está muito desgastado, só é usado em casos emergenciais. Sobram assim dois carros ; cada um com cerca de 200 quilômetros rodados ; para remover os mortos de todo o DF, que tem uma população de mais de 2 milhões de pessoas. Segundo o diretor do IML, Malthus Galvão, a quantidade de profissionais, técnicos, enfermeiros e agentes de polícia é 30% menor que o necessário para o bom funcionamento do órgão. ;Nosso quadro é pequeno e está vazio;, revela.

Os reflexos dessa defasagem são sentidos pela população, que tem que esperar durante horas pelo serviço de transporte de corpos de parentes e amigos falecidos. A dona de casa Marta Martins, 58 anos, se viu refém do sistema sucateado na tarde de quinta-feira. Filha adotiva da uruguaia Enriqueta Barragan Farina, 98, a moradora de Ceilândia aguardou por mais de oito horas para que o corpo da mãe fosse recolhido ao IML para a emissão do atestado de óbito. ;Essa demora é muito triste. A pessoa quando morre é tratada como um bicho. Não há dignidade. Minha mãe ficou largada, jogada, abandonada por eles como se fosse um animal;, desabafou.

A aposentada faleceu às 14h30 de quinta-feira, em casa. O Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu) foi chamado, mas nem chegou a prestar socorro. O coração de Enriqueta Barragan já havia parado de bater. ;Eles (médicos do Samu) providenciaram tudo. Ligaram para a delegacia e nos pediram para aguardar;, lembra. ;Apesar de estarem em greve, os policiais civis não demoraram. Chegaram às 15h e registraram a ocorrência;, relata a dona de casa. Mas ela não teve a mesma sorte com a remoção. Das 15h às 23h, a agonia só aumentava ao olhar para o corpo da mãe e não poder fazer nada. ;Entendo que eles tinham outras pendências, mas é muito humilhante esperar tanto tempo;, reclama.

Diretor do Sindicato dos Policiais Civis do Distrito Federal (Sinpol), Luciano Marinho garantiu que o serviço não foi prejudicado em virtude da paralisação em prol dos reajustes salariais e reestruturação da carreira dos agentes, que completa uma semana hoje. A justificativa para o atraso nos procedimento na quinta-feira se deu por causa de duas ocorrências policiais registradas em horários próximos. Uma ossada teria sido encontrada em Sobradinho e, em Samambaia, os peritos transportavam o corpo de uma adolescente que estava desaparecida. Segundo Marinho, quem morre em uma via pública do DF tem prioridade no recolhimento. O diretor ainda explicou que o tumulto no trânsito, ocasionado depois do retorno das atividades dos rodoviários, também contribuiu para a demora.

Responsável por comandar a equipe médica do IML, Malthus Galvão explica a dificuldade de se trabalhar sem poder prever uma rotina diária. ;Já houve circunstâncias em que o IML recebeu ao mesmo tempo muitos pedidos em diferentes lugares do DF. A remoção de corpos de pessoas que morrem por motivos naturais deveria ser realizada pelo Serviço de Verificação de Óbitos(SVO), da Secretaria de Saúde, como acontece em outras capitais;, argumenta. No DF, porém, o serviço ainda não é oferecido pelo GDF. Galvão explica que há um pedido para aumentar o quadro de funcionários e para a compra de novas viaturas. ;Os carros estão muito rodados. Temos um pedido para a aquisição de quatro rabecões ( cada um com capacidade para transportar quatro corpos) e dois carros menores (para apenas um corpo). Nosso quadro de funcionários também é antigo e temos 30% dos profissionais com restrições médicas, impossibilitados de trabalhar.;


DELEGADOS REJEITAM PARALISAÇÃO
Após uma longa assembleia, que terminou na madrugada de ontem, os delegados da Polícia Civil decidiram, por unanimidade, não aderir à greve deflagrada pelos colegas da coorporação há cerca de uma semana. A categoria pede a reestruturação da carreira, que prevê um aumento salarial de até 30%, mas encontra no governo federal entraves para que a proposta seja votada no Congresso Nacional. ;Apesar de não entrarmos em greve, aprovamos a redação de uma nota de repúdio ao descaso do governo federal na implementação da reestruturação da carreira da Polícia Civil. Damos apoio ao direito de greve da categoria;, declarou João Carlos Couto Lóssio, presidente em exercício do Sindicato dos Delegados de Polícia do Distrito Federal (Sindepo). Como a segurança pública do Distrito Federal é custeada pelo Fundo Constitucional, subsidiado pelo governo federal, qualquer proposta de reajuste tem que ser aprovada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, onde o processo está travado. O ministro da pasta, Paulo Bernardo, já havia adiantado que não concederia reajustes este ano.



Peritos de Goiás aderem à paralisação

Os peritos criminais e os médicos legistas de Goiás também resolveram aderir à greve da Polícia Civil do estado, decretada em 17 de maio. A categoria reivindica um reajuste salarial de 100%. A Secretaria de Segurança Pública de Goiás ainda não se posicionou sobre o pedido. Segundo o presidente da Associação dos Peritos em Criminalística de Goiás (Aspec), Carlos Kléber da Silva Garcia, os peritos decidiram paralisar as atividades após o governo oferecer um aumento salarial aos policiais militares. ;Esta é a hora de pedirmos uma melhoria no nosso salário, que está congelado desde 2006;, esclarece.

A principal reivindicação é pela equiparação salarial com os PMs do estado, além da reposição das perdas referentes à inflação. Os grevistas têm presas, já que o prazo estipulado pela Justiça eleitoral para a concessão de reajustes é de 180 dias antes das eleições, ou seja, 30 de junho, a próxima quarta-feira. Com a adesão dos peritos à mobilização, alguns serviços ficam prejudicados. Segundo o presidente da Aspec, os servidores trabalham em esquema de plantão, com 50% do efetivo. ;Os atendimentos são feitos em casos de urgência. Cadáveres serão recolhidos, mas com mais demora devido ao efetivo reduzido;, afirma. Serão realizadas apenas as perícias que envolvam vítimas de mortes violentas, flagrantes, exames de crimes sexuais, estupro e atentado ao pudor. (NT)

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