Ana Dubeux
postado em 27/06/2010 08:20
Antônio Carlos de Andrade diz não ter ilusão. O candidato a governador pelo PSol sabe que enfrentará adversários de peso na eleição de outubro. De um lado, a chapa Agnelo-Filippelli, formada por dois expoentes da política brasiliense e respaldada pela aliança federal entre o PT e o PMDB. Do outro, o veterano Joaquim Roriz, que corre o risco de ter a candidatura barrada pela Ficha Limpa. Secretário de Administração no governo de Cristovam Buarque (1994-1998) e ex-administrador de Brasília, Toninho acredita que tem um diferencial dos concorrentes para conquistar o eleitor brasiliense: não estar envolvido em esquemas de corrupção. Ele aponta a área da saúde como a mais atingida do Distrito Federal, submetida a apadrinhamento e desmonte da rede pública de atendimento.Em uma cidade ainda traumatizada pelo escândalo da Caixa de Pandora e sob risco de intervenção federal, Toninho adverte: o arrudismo não morreu. Ele avalia que o discurso da ética, mais do que nunca, será valorizado nas eleições e guarda uma série de indagações para os adversários. A primeira delas seria a Agnelo Queiroz, que viu parte das gravações feitas por Durval Barbosa sobre o escândalo de Pandora mas não denunciou o esquema. ;Eu não teria nenhuma dúvida. No momento seguinte, eu estaria denunciando esses fatos;.
Toninho aposta no resgate das bandeiras oriundas da militância de esquerda e dos primórdios do PT como armas para a batalha dos votos. Segundo ele, os ex-aliados `mudaram para pior`, mas o eleitor e diversos setores do Distrito Federal ; inclusive do PT ; vão manifestar a discordância da coligação que pôs fim à histórica polarização na política brasiliense.
PT, PMDB e Roriz são iguais
Quais as credenciais do PSol para ser governo?
Nosso partido representa um pensamento socialista oriundo da tradição e da história petista. Enquanto o PT foi um projeto de esquerda, socialista, democrático, nós estivemos no PT. Quando ocorreram aqueles fatos graves da descoberta do mensalão e da corrupção no meio do partido, um grupo expressivo entendeu que era o momento de buscarmos uma alternativa partidária nacional com os pressupostos programáticos e ideológicos que orientaram a criação do próprio PT. O Psol participa pela segunda vez de um processo eleitoral no DF procurando disputar corações e mentes com um programa alternativo de combate sem trégua à corrupção. Temos como ferramenta principal do governo fazer uma auditoria em todas as contas do GDF, em todas as secretarias, em cada administração. Dar um choque e instaurar as respectivas auditorias, independentes, abertas à participação da sociedade, abertas à imprensa, ao Ministério Público e a ongs para acompanhar essa radiografia geral do Estado, de suas entranhas, para conhecer melhor o que foram essas últimas administrações, principalmente essa década e meia de governos.
Qual a área mais estrangulada?
A saúde é a área em que a população mais se ressente da falta de Estado. Fazemos a defesa intransigente dos serviços públicos na capital da República, da reorganização radical do sistema de saúde. Queremos realmente um sistema público sintonizado com os pressupostos do sistema único de saúde no nosso país. Tenho andado muito com vários de nossos pré-candidatos, mais, em particular, com a Maninha (Maria José Maninha, candidata a deputada federal), e podido ver de perto em que se transformou o sistema de saúde no DF. É deprimente, desumano, causa um profundo mal-estar às pessoas de bem, honestas, que pagam impostos ver o estado em que está a saúde. A saúde está em colapso e precisa de um tratamento de choque. Será necessário romper, obviamente respeitando os estatutos legais, esses convênios espúrios. Um exemplo é esse celebrado entre o GDF e a fundação que administra o hospital de Santa Maria. O contrato é nocivo ao poder público, é caro, é ineficaz . O Estado tem recursos de sobra. O que precisa é de uma gestão nova para o sistema.
Quando o desmonte começou? No governo Arruda ou antes?
O desmonte ocorreu desde a posse do governador Roriz em 1; de janeiro de 1991, aquele primeiro governo foi o pontapé inicial do desmonte da saúde no DF e coincidentemente foi quando a iniciativa privada mais cresceu no ramo da saúde. Há uma relação muito estreita entre os fatos: piora a rede pública de assistência e atendimento à saúde e crescem os convênios e os grupos da saúde privada. A mudança deve ser geral porque estou vendo também muitos outros movimentos suspeitíssimos na saúde. Cito, por exemplo, a privatização dos serviços gráficos. A ex-Fundação Hospitalar, hoje Secretaria de Saúde, tem um parque gráfico invejável ali no SIA. Há máquinas automáticas de boa qualidade, com impressão de excelente qualidade. Fecharam tudo para contratar empresas privadas que vão ceder formulários e impressos de modo geral para o governo.
Houve uma mercantilização?
Mercantilização da saúde é o termo certo que a gente tem utilizado inclusive nos nossos textos. Esse será o foco da nossa ação política. A maioria dos hospitais estão velhos, sucateados, com falta de equipamentos, com prontos-socorros sem as condições mínimas de funcionamento. Os concursos estão sendo feitos, mas as vagas não estão sendo preenchidas e o salário está defasado para esses profissionais. Temos que ter um plano de carreira, de cargos e salários. Essa área da saúde vai merecer, de nossa parte, toda a atenção.
Como acabar com essa suposta máfia na área de saúde?
Nós temos um pessoal, uma dirigente que conhece profundamente essa situação. A Maninha, que foi secretária de saúde, tem um domínio, conhece como ninguém essa situação e certamente vai nos ajudar muito a reformular esse sistema. Uma medida de imediato pra melhoria do atendimento será recriar, já no primeiro dia de governo, o programa Saúde em Casa. É um sistema que deu certo, foi inclusive modelo para o governo FHC, chegamos por dois anos a executá-lo no DF, sob a liderança da Maninha. Equipes multidisciplinares em cada cidade, em cada bairro, com médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, pessoas que vão promover a saúde pública de forma direta, no meio da população.
Por que a situação chegou a esse ponto?
Por causa da politização da saúde: cargos de direção sendo preenchidos por profissionais não gabaritados para esse fim. A carreira da saúde foi literalmente transformada num biombo, numa coisa vinculada estreitamente aos interesses políticos partidários, na execução do que tem de mais pernicioso aqui. Nós sabemos como é isso, a gente já foi governo. Você tem que ter alianças pra governar, agora nunca isso pode ser feito em detrimento da qualidade do serviço, da competência dos profissionais. Na própria estrutura da Secretaria de Saúde havia pessoas absolutamente colocadas ali para atender aos interesses da iniciativa privada. Vou falar sem maiores rodeios: o que foi a gestão do Arnaldo Bernardino (ex-secretário de Roriz) na saúde? Um desastre!
Essa reformulação também precisa ocorrer no transporte público?
Queremos recuperar a TCB. Quero até já deixar claro: sou um candidato estatizante. Não tenho nenhuma vergonha de dizer isso. O Estado cumpre um papel fundamental na sociedade, nos seus serviços e na promoção do bem-estar da nossa população. Defendo o reforço, a retomada, a reconstrução da TCB como uma empresa pública, com gerenciamento público acompanhado de perto também pelos órgãos que fazem a fiscalização dos transportes públicos. A frota da TCB atenderá a todas a cidades, com uma passagem que cubra os preços operacionais e não seja essa exploração que a iniciativa privada promove hoje. Queremos também que a Secretaria de Fazenda fiscalize as empresas de ônibus. Vamos acabar com essa história de empresa privada cuidar do gerenciamento do passe estudantil.
Brasília está sangrando desde a Pandora. O que difere a sua candidatura das demais?
A candidatura do PSol se distingue porque nós não temos origem em nenhum desses esquemas que estiveram e estão envolvidos com a corrupção em Brasília. O PSol vai fazer um combate muito firme ao que representam essas alianças apresentadas à população. A aliança do PT com o PMDB, caso seja vitoriosa, terá muita dificuldade de exercer um governo ético.
Por que?
Porque é só ver a nominata de candidatos dessa aliança que estão concorrendo. Muitos dos candidatos que estão concorrendo nessa aliança, por exemplo, estiveram com Joaquim Roriz na outra eleição. Em ambas as alianças há pessoas envolvidas citadas e algumas já indiciadas pelas operações que foram desencadeadas pela Polícia Federal e pela Polícia Civil. Então eu não creio que esse pessoal sobreviva, se sustente, ainda mais sob a vigência da nova legislaçao eleitoral, em particular da lei da Ficha Limpa. Há uma situação extremamente constrangedora em Brasília.Caso essas coligações vençam, as eleições não farão qualquer mudança ética, radical no quadro político do DF. Ao contrário, os vencedores terão que abrir espaços para composições que considero antiéticas, que manterão no poder e na estrutura do Estado. Serão pessoas, políticos e dirigentes que têm vinculação com o que há de mais atrasado na política local.
O discurso ético tem sido utilizado pela candidatura do PT. É um discurso genuíno hoje?
Não acredito mais no discurso da ética vindo da direção do PT. Infelizmente o PT preferiu, à revelia da sua base histórica, de pessoas históricas, honestas, corretas que estão nesse partido, fazer essa aliança com o PMDB. Existem setores do PT que, além de não estarem satisfeitos com essa aliança, estão propensos a votar numa candidatura do PSol. Porque a bandeira histórica do PT ; da ética, do combate à corrupção ; infelizmente não se sustenta com essa aliança com o PMDB.
A aliança nacional PT-PMDB também preocupa?
Plínio (de Arruda Sampaio, candidato a presidente pelo PSol) tem dito nacionalmente que, se formos chamados a todos os programas de televisão, vai cobrar de Dilma a coerência também por esse tipo de aliança para a governabilidade. Nós achamos que, aqui em Brasília, essa aliança nacional é o fim dos compromissos históricos que tinha o PT com as mudanças no nosso país. É o pragmatismo levado ao extremo. O PT tinha um programa de transformações da sociedade, e isso fica anulado pela prevalência dos acordos políticos paroquiais. É uma vergonha.
Como governar com uma Câmara Legislativa dominada por um grupo político pertencente aos últimos dois governos?
Quando o PT histórico ganhou as eleições em 1994, enfrentamos esse problema. O PT tinha uma bancada de cinco deputados distritais. Na aliança com o PCdoB e PSB, a bancada do governo chegava no máximo a 7 deputados. Éramos minoria, tinha 17 outros. A ampla maioria naquela época pertencia a uma oposição radical liderada pelo então deputado Luiz Estevão. Como o PT governou àquela época? Buscando apoio na sociedade civil, nas organizações populares existentes, sindicatos, entidades de movimento popular; criando o orçamento participativo, que era uma forma de envolver a comunidade também na gestão do Estado. Os projetos de iniciativa do Executivo que encaminharmos à Câmara e forem de interesse da sociedade, eu vou mobilizar a sociedade pra fazê-los aprovar. Quero ver algum distrital da oposição votar contra projetos de interesse do povo. Será uma relação conflituosa com certeza, eu não tenho ilusões.
Como o senhor imagina sua relação com empresários da cidade?
O empresariado tem virtudes mas muitos defeitos também. Um exemplo negativo: se tinha propina, se fulano recebeu aquele dinheiro, receberam de alguém, não é? Até hoje a Operação Pandora não chegou a esses maus empresários. Com esse tipo de gente, nós não vamos ter relação. A relação de um governo do PSol com a classe empresarial será pautada pela mais absoluta transparência. Se soubermos que tem formação de cartel, anularemos as licitações. Na época do governo Cristovam, conseguimos abaixar em quase 20% o valor dos contratos de licitações na área de vigilância, asseio e conservação. Eles operam com uma margem muito alta de lucro porque têm que pagar propina. Os empresários poderão trabalhar sem incluir esse fator no custo de seus serviços ao Estado. Quem trabalhar corretamente vai oferecer seus serviços ao Estado. Aqueles que insistirem nas práticas de hoje, da corrupção, do tráfico de influências, não terão lugar no nosso governo.
Em um eventual segundo turno, qual seria a aliança mais difícil: com o PT-PMDB ou com o grupo de Roriz?
Existem setores no PT que não têm as mãos sujas com tudo que aconteceu em relação ao PT. Eu sei que há setores no PSB, PCdoB, no PCB, no PSTU efetivamente comprometidos com as mudanças. É óbvio que no caso da nossa candidatura ir para um segundo turno, vamos conversar com esses segmentos que representam setores importantes da sociedade. Não tem conversa com mensaleiros, com pessoas envolvidas nessas operações da Polícia Federal. Não serão nem recebidos por mim ou por minha equipe de governo. Agora eu não vou fazer um governo apartado, eu não vou fazer um governo isolado da sociedade, nós vamos ter uma relação muito franca, muito leal, muito correta.
Seu partido saberá ser governo? Como o senhor enfrentará a oposição?
Acredito que esse segmento se una numa oposição sistemática a um governo popular do PSol. Temos que estar preparados pra isso. A forma de reverter esse quadro é a comunicação direta com o povo, com as suas organizações, com sindicatos e abrir um canal permanente de diálogo.
Como competir com candidaturas bem aquinhoadas?
Nosso partido tem uma pequena cota do fundo partidário. O PSol tem três deputados federais, o valor dessa cota nacionalmente é considerada, o TSE destina ao PSol um valor relacionado a esse número de deputados federais, muito pequeno. Acho que não chega a R$100 mil o valor mensal destinado ao PSol do Brasil inteiro. Aqui, onde há cerca de 1,3 mil filiados, o valor dessa cota deve chegar a R$ 4,6 mil. Esses recursos já estão sendo guardados para o programa de televisão. Nossa intenção é ter um bom programa de televisão, participar de todos os debates promovidos pelos meios de comunicação e ter uma campanha militante de rua, como aprendemos no velho PT.
A candidatura de Roriz vai vingar?
Foi o PSol que moveu uma ação contra o ex-governador Roriz no Senado. Foi por meio do senador do PSol, José Neri, que protocolamos a ação com o pedido de impedimento do então senador Roriz. Isso foi determinante. O PSol conseguiu forçar a renúncia do ex-governador Roriz do Senado. Pelo entendimento do conteúdo da lei da Ficha Limpa, Roriz não pode ser candidato. Nosso partido tem pronta uma ação caso ele registre a candidatura. No dia 6 de julho, o PSol entra imediatamente com uma ação pedindo a impugnação do ex-governador.
Se eleito, dará continuidade às obras do governo Arruda?
Vou vincular essa decisão às auditorias de todas as obras. Tem coisas óbvias que você não pode parar. Vamos supor que em janeiro de 2011 eu assuma o Buriti e a Linha Verde não esteja concluída. Quero afirmar, dizer para o povo, que vamos concluir a obra. Não tem como impedir. Agora, obras não licitadas ou com licitação em andamento serão efetivamente paralisadas para realização de novos processos licitatórios. É questão de honra do nosso programa de governo. Nós não confiamos em nenhum desses processos licitatórios que ocorreram durante a gestão do ex-governador Arruda e mesmo agora na gestão do governador Rosso.
Intervenção federal agora não é oportunismo?
Espero que haja intervenção federal. Isso impediria a continuidade de um esquema que ainda domina as finanças, as licitações e o Estado. Tem que dar um basta. Defendemos a intervenção desde o primeiro momento. É bom para Brasília, é bom para a nossa população e para quem for o governador eleito no pleito de 3 de outubro. Para que a gente possa encontrar efetivamente uma administração limpa, transparente e principalmente honesta. Qualquer que seja o interventor nomeado pelo presidente Lula, ele tem que ser uma pessoa com respeitabilidade e confiança da população. Terá que ter o respaldo da sociedade, dos meios de comunicação, das organizações sociais para fazer uma gestão saneadora. Tenho a visão mais otimista de um processo de intervenção. Jamais um governo federal iria nomear pra cá alguém vinculado aos esquemas atualmente no poder.
A campanha será agressiva?
Temo pelo que vi por exemplo na convenção do PMDB (agressão entre militantes). Temo que os ânimos se acirrem na campanha. De nossa parte, queremos fazer uma campanha verdadeira, ética. o TRE mudou e não deixará que absurdos do passado voltem a acontecer. O PSol quer respostas. Temos muitas indagações a fazer a essa aliança PT/PMDB, ao próprio ex-governador Roriz caso ele consiga se efetivar como candidato, ao Gim Argello se também for candidato, à Maria de Lourdes. Espero que seja uma campanha pautada pelo diálogo construtivo e respeitoso. Agora não posso, como representante do meu partido, do programa político que represento, deixar de fazer as perguntas que têm que ser feitas a todos os concorrentes que de alguma forma têm relação com o esquema de poder que está ainda governando o DF. Vou cobrar coerência de todos eles: por que fizeram essa composição? O que está por trás dessa aliança não é pela mudança do DF; é para acomodar a situação e ficar tudo como está.
Essa aliança PT e PMDB marca o fim da polarização nas eleições de Brasília?
A população está estranhando a aliança PT e PMDB. Tenho recebido bastante apoio de candidatos ; inclusive do PT ; que não vão fazer campanha para Agnelo e Filippelli. São grupos culturais e sociais com muita presença na vida das cidades do DF, como o Pacotão ; e olha que majoritariamente essa diretoria perpétua do Pacotão tem muita vinculação no PT. Em sindicatos, associações, universidades, entidades em geral, também tenho recebido esses apoios. Está para acontecer um fenômeno ; eu espero que ele se concretize ;, mas aqueles setores de esquerda na sociedade que durante décadas se confrontaram na luta entre o azul e o vermelho têm uma simpatia com a candidatura de Toninho do PSol.
Quem mudou: o senhor ou seus ex-aliados?
Eles mudaram com muita radicalidade e para pior. Considero que estou no caminho que sempre defendemos. Éramos aliados muito sinceros. Lembro até que a principal denúncia contra o nosso governo foram aquelas marmitas que o então secretário Eurípedes Camargo forneceu aos trabalhadores sem-terra, o marmitagate ; algo que faria novamente porque era uma questão de ajuda e solidariedade aos movimentos sociais. Aquele governo de unidade popular foi muito importante, aprendemos muito. Fiz uma administração em Brasília com o PCB, PC do B, PSB, o PDT; até o PPS teve uma diretoria. Buscamos partidos que tinham claramente uma ideologia de esquerda. Esses partidos anularam a sua ideologia ao se juntar ao PMDB. Cristovam acha que essa aliança é para impedir que o rorizismo volte. Mas eu disse: ;Não Cristovam, o rorizismo já está na chapa da aliança;.
O arrudismo está liquidado? A Pandora sepultou a carreira pública de Arruda?
Arruda está por muito tempo fora do cenário político local. Mas não tenho ilusões de que o arrudismo criou ; assim como o rorizismo ; a sua teia de apoio e de influência na sociedade do DF. O arrudismo não morreu apesar de o seu mentor estar temporariamente fora de combate. O governo Rosso não deixa de ser a continuidade do arrudismo, mas incorpora elementos que vêm de Joaquim Roriz. Figura de proeminência no governo Arruda, Rosso tem práticas muito próximas às que o chefe executou enquanto governador. Refiro-me ao populismo, à tentativa de ser um ícone político. Rosso acabou tentando fazer isso na convenção do PMDB; Então ele herdou muito da ;personalidade; ; e não estou falando como psicólogo, não estou fazendo nenhum tipo de análise dessa natureza ;, mas ele tem algumas características dos dois criadores: a juventude, essa ideia de uma modernidade herdada de Arruda; e os métodos políticos ; a sua própria vice-governadora, a Ivelise, que incorpora muito da herança Roriz.
Qual foi o sentimento ao ver aquelas imagens feitas por Durval?
O sentimento primeiro foi de muita revolta. Eu não só, a Maninha, a militância do PSol, principalmente a juventude da UnB, e alguns segmentos sindicais que estão conosco. A gente quis transformar essa revolta em mobilização. Fomos para as ruas ; poucos, é verdade ; fizemos com muita dificuldade nossos 200 mil panfletinhos. Distribuímos em todo o DF denunciando aquela situação, o escracho, o deboche, o escárnio contra aquela situação. Como cidadão estou aqui em Brasília há 24 anos e nunca vi, mesmo nos governos anteriores de Roriz, uma série tão deprimente para nós, para nossa cidadania, como vi nesse episódio da Pandora. A gente desconfiava que isso existia, mas não sabíamos como operavam, algo tão deprimente, tão revoltante como foi essa distribuição.
Qual a motivação de Durval Barbosa ao implodir a política no DF? Roriz está por trás?
Eu preferiria que as investigações fossem aprofundadas para saber qual a motivação precisa da divulgação dessas fitas e dessas denúncias. Não tenho dúvida da fidelidade do denunciante com o governador Joaquim Roriz. O Durval Barbosa é um homem de confiança de Roriz e do esquema do governador. Mas gostaria de ver o inquérito concluído para tirar todas as conclusões. Ainda há muito mistério em torno dessas denúncias.
O esquema lhe impressionou?
Nos debates em 2006, cobrei por que o Arruda tinha violado o painel do Senado. Nos espaços onde tive acesso, eu prevenia que Arruda era capaz de atos como esse que acabou acontecendo. Ainda assim me surpreendi. Foi tão violento e revoltante porque é o nosso dinheiro em última instância. Tudo que a gente paga estava indo pra corrupção. Não imaginava que o esquema fosse de tal monta, de tal envergadura.
Haverá uma renovação significativa na Câmara Legislativa depois da Pandora?
Haverá uma forte renovação. Em todas as nossas andanças nas comunidades, em todas as cidades, a gente tem conseguido aglutinar esses segmentos em torno da nossa militância, de igrejas, de entidades civis. A população está indignada, revoltada, preocupadíssima com tudo.
O senhor agiria como Agnelo em relação às fitas?
Essa vai ser uma questão importante para o candidato Agnelo responder ao povo. Se eu tivesse conhecimento daquilo, na hora seguinte eu chamaria uma coletiva ou viria até o Correio Braziliense para imediatamente denunciar. Foram gravíssimas aquelas imagens. Agnelo vai ter que explicar muito bem por que silenciou diante do conhecimento que teve das fitas e não comunicou ao PT ao qual ele já pertencia, principalmente sendo um homem público, deputado federal por dois mandatos, distrital, pessoa conhecida com reputação aqui no DF. Eu não teria nenhuma dúvida. No momento seguinte, estaria denunciando esses fatos.
Teme ser alvo de denúncias e dossiês?
Não tenho nenhum temor. Durante minha gestão como secretário de Administração, recebi certa feita a visita de um personagem que voltou à tona nesses escândalos, o jornalista Edson Sombra, que andou deixando no ar aí sem citar nome que teria sido sondado por um secretário de estado etc, etc. Felizmente não fui eu que fiz, mas tenho as fitas gravadas desse encontro, tenho as fitas gravadas do encontro com o empresário dono da empresa Fiança. O empresário desmentiu categoricamente o Sombra. Ninguém do nosso governo achacou ou tentou qualquer propina, ou qualquer tipo de insinuação.
Pode-se dizer que o senhor não tem medo do Sombra?
Não tenho medo do Sombra. Ao contrário, o Sombra é que tem que ter medo de mim por tudo que nós temos de gravação das insinuações dele. Dessas coisas todas ele, sim, é que tem que ter medo.
Surpreendeu-se com denúncias contra Leonardo Bandarra?
Foi uma surpresa. Leonardo Bandarra (chefe do Ministério Público do DF) gozava até então de muito prestígio tanto entre seus os pares do MP, quanto nas instituições aqui do DF e até do governo federal. Foi uma surpresa ver quanto tecido social aqui foi contaminado pela corrupção de forma sórdida. Espero que as autoridades façam a limpeza que tem que ser feita nesses órgãos também responsáveis pela preservação da lei, da ordem pública, dos estatutos constituintes do nosso país. Pensemos bem: o poder executivo aqui no DF foi envolvido completamente nessa situação; o legislativo também, por sua maioria de representantes envolvidos também na corrupção; e, de onde menos a gente esperava, uma instância importante do poder judiciário, responsável pela aplicação e observância das leis, também envolvida. Então o tecido foi tomado. Precisamos, em todos esses níveis, de uma sacudida na vida política local. Espero que esse processo político vindouro ajude a sanear a vida política, social, jurídica, econômica da capital, de forma a botarmos essa questão da corrupção como uma página virada da história da nossa capital.
"Bandarra gozava de muito prestigio. Foi uma surpresa ver o quanto tecido social aqui foi contaminado pela corrupção de forma sórdida"