Ana Maria Campos
postado em 30/06/2010 07:41
Está na pauta da sessão de hoje do Supremo Tribunal Federal (STF) o pedido de intervenção federal na capital do país, protocolado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que poderá tirar do poder o governador Rogério Rosso (PMDB) e interferir nos trabalhos da Câmara Legislativa. Presidente da Corte, o ministro Cezar Peluso, relator do caso, deverá apresentar seu relatório e voto sobre a situação institucional do Distrito Federal depois da crise provocada pela Operação Caixa de Pandora. Há, no entanto, expectativa de que o julgamento seja concluído apenas depois do recesso do Judiciário em agosto, quando o quorum estará completo. Dos 11 integrantes do plenário, três deverão se ausentar nesta quarta: Eros Grau, Ellen Gracie e Joaquim Barbosa.
Entre os interessados no caso, há expectativa de que algum ministro peça vista do processo para analisar com detalhes e aguardar a volta dos demais magistrados. Prestes a se aposentar, Eros Grau está em Paris; Ellen Gracie em missão oficial representando o STF fora do país; e Joaquim Barbosa renovou na semana passada uma licença médica. Ele é considerado um dos votos favoráveis ao pedido de intervenção. Para advogados que acompanham o processo, a única possibilidade de conclusão do julgamento ainda hoje, última sessão antes das férias dos ministros, é uma decisão unânime ou uma tendência majoritária de concordância com o voto do relator.
Mesmo que seja decretada a intervenção pelo STF, na prática, a medida não deverá ser aplicada imediatamente. Pela Constituição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisará editar um decreto com a extensão da interferência nos poderes locais e submetê-lo ao crivo do Congresso. Para o Ministério Público Federal (MPF), uma demora no julgamento pode ser uma boa estratégia. As investigações relacionadas ao suposto esquema de corrupção instalado na capital do país ainda não estão concluídas e devem apontar novidades não reveladas publicamente que, pela gravidade, poderão influenciar a decisão dos ministros.
O procurador-geral do Distrito Federal, Marcelo Galvão, se prepara para fazer a sustentação oral no plenário do STF. Ele vai dizer que o DF vive uma situação de normalidade institucional após a crise que provocou um grande abalo no comando da administração local. Galvão vai alegar que o contexto atual, com a eleição indireta de Rosso, é de ;serenidade;. Gurgel, no entanto, deverá defender o oposto. O chefe do MPF acredita que Rosso não tem legitimidade para comandar o DF por ter sido eleito por distritais sob investigação na Operação Caixa de Pandora. Na semana passada, o Núcleo de Combate às Organizações Criminosas (Ncoc) do Ministério Público do DF ajuizou ação(1) de improbidade administrativa contra nove dos 13 deputados que votaram em Rosso.
Repercussão
O setor produtivo continua com aversão a qualquer decisão envolvendo a perda da autonomia administrativa local. Empresários e industriais argumentam que as instituições do Distrito Federal, embora atingidas pela Caixa de Pandora, estão reagindo à situação com sindicâncias e punição aos acusados. Eles temem uma paralisação das obras e da atividade econômica e se dizem satisfeitos com a atuação do governador. A Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF), que, em março, encabeçou protesto contra a interferência, mantém a posição contrária à medida.
;Eu já era contra e, agora, vejo ainda menos motivos do que antes. Temos um governador trabalhando com seriedade, inclusive fazendo auditorias em contratos. Vivemos uma situação administrativa absolutamente tranquila;, afirmou Adalberto Valadão, presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do DF (Ademi-DF).
Para o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF (Sinduscon-DF), Elson Ribeiro e Póvoa, uma decisão favorável à intervenção traria transtornos não só para o Distrito Federal, mas para o país. ;Não podemos nos esquecer de que a votação de PECs (Propostas de Emenda Constitucional) ficaria impedida, e creio que uma situação assim respingaria na própria eleição nacional;, declarou.
Parte do setor comercial também se mostra apreensiva. ;Um interventor não terá tempo de fazer uma administração adequada. Tudo que está andando vai parar;, afirmou Antônio Augusto de Moraes, presidente do Sindicato do Comércio Varejista (Sindivarejista). O presidente da Federação da Indústria do DF (Fibra), Antônio Gomes, também comentou a possibilidade de intervenção sob o ponto de vista econômico. ;Nós entendemos que vai dar uma paralisia no Estado e afetar atividades empresariais;, ressaltou.
Conselheiro e presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais da OAB-DF, Igor Carneiro de Matos acredita que as instituições do DF deram prova de maturidade ao longo da crise política. Já para o presidente da OAB-DF, Francisco Caputo, a auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (leia matéria abaixo) é a prova cabal de que a intervenção é desnecessária. ;As instituições têm total liberdade para fiscalizar o GDF;, destacou. Caputo lembrou que as irregularidades identificadas pela CGU estão virando alvo de ações judiciais, o que, para ele, é ;prova que a ordem pública no DF não está fragilizada;.
;Os serviços essenciais estão funcionando. Não há motivos para intervenção;, disse o presidente da OAB local. Ele diz que a Ordem espera que as autoridades do GDF adotem medidas necessárias para corrigir as distorções apontadas no relatório da CGU e que a Justiça puna os eventuais responsáveis.
Argumento
O argumento dos promotores de Justiça foi de que os distritais feriram os princípios constitucionais da impessoalidade e moralidade ao aceitar que despesas de hospedagem num hotel em Goiânia (GO) fossem pagas por um empresário do ramo imobiliário e da construção civil. Eles ficaram concentrados fora de Brasília na véspera da eleição indireta para fugir das pressões políticas em torno da candidatura adversária de Rosso, do então governador em exercício, deputado Wilson Lima (PR).