Cidades

Em um mês, mais de 60 estabelecimentos sem alvará definitivo foram interditados

Terça-feira, dois postos de gasolina e o depósito do Carrefour também foram lacrados

Juliana Boechat
postado em 30/06/2010 07:30

Na Avenida Hélio Prates, entre Taguatinga e Ceilândia, fiscais interditam um posto de combustível que não tinha a documentação regularizadaIrregularidades encontradas no alvará de funcionamento de aproximadamente 11,5 mil estabelecimentos comerciais no Distrito Federal têm feito o brasiliense lidar com surpresas desagradáveis diariamente. Ontem, dois postos de combustível e o depósito do Carrefour foram interditados pela Agência de Fiscalização do DF (Agefis) por irregularidades na documentação. Este mês, mais de 60 estabelecimentos tiveram suas portas fechadas pelo mesmo motivo. Há 10 dias, a Agefis lacrou quatro faculdades e 100 bancas na Feira dos Goianos, em Taguatinga. Em seguida, salas de cinema dos shoppings de Brasília também receberam o lacre (veja cronologia).

O órgão reforçou a atenção às irregularidades desde a publicação da Portaria n; 22, no Diário Oficial do Distrito Federal, em 13 de maio último, que revogou os alvarás precários(1) ; ou temporários ; dos pontos comerciais do DF. O governo local tomou esta decisão oito meses depois que o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) julgou inconstitucional a legislação de concessões de alvará provisório.

Segundo o chefe da Assessoria de Fiscalização da Agefis, Cláudio Caixeta, a quantidade de estabelecimentos lacrados nas últimas semanas nada tem a ver com a determinação do Governo do Distrito Federal. ;A Agefis agiu ao longo dos últimos anos. Ano passado, também interditamos cinemas e tiramos os outdoors das ruas. As últimas ações coincidiram com a revogação dos alvarás por parte do GDF;, defendeu.

De acordo com Caixeta, apenas os estabelecimentos que oferecem atividade de risco ; depósitos, cinemas, teatros, circos etc. ; podem ser interditados imediatamente. Os demais têm o prazo de 30 dias para corrigir a situação. ;Obter um alvará é fácil. Se os documentos estiverem completos, o alvará é emitido dentro de 15 dias e vale por até dois anos;, explicou.

Após o decreto publicado no Diário Oficial, a Coordenadoria das Cidades enviou um ofício às administrações regionais para obter o levantamento dos estabelecimentos em condições irregulares. ;O número ao qual chegamos é apenas uma estimativa. Os administradores também estão entrando em contato com alguns pontos comerciais para confirmar a situação de cada um. A nova lei do alvará traz modernidades que impedirão algumas pessoas de continuar funcionando com o ;jeitinho; e de forma irregular;, acredita o coordenador adjunto das Cidades, Leonardo Antunes. Com a antiga lei, muitos empreendedores preferiam renovar alvarás provisórios em vez de regularizar a situação de uma vez com a concessão permanente.

Salários
O período de data-base da categoria, quando patrões e empregados se reúnem para analisar os termos dos contratos coletivos de trabalho, está próximo. Mas funcionários do órgão e o Sindicato dos Servidores Integrantes da Carreira de Fiscalização e Inspeção do Distrito Federal (Sindafis) negam que as constantes autuações estejam relacionadas com um suposto aumento salarial dos servidores. Quando estava no governo interinamente, Wilson Lima prometeu reajuste salarial aos servidores. Com o argumento de que a mudança causaria um rombo nas contas públicas, o governador Rogério Rosso propôs alternativas à categoria aceitas em assembleia. ;É um absurdo falar isso. Os empresários usam esse jogo baixo para desmoralizar nosso trabalho. A fiscalização tem que cumprir as determinações, se não os fiscais são punidos;, defendeu Marcus Cesar de Carvalho, presidente do Sindicato.

Uma pessoa ligada à categoria que não quis se identificar explicou que antes do decreto, o fiscal não podia interditar o estabelecimento que contava com alvará provisório. ;O fiscal não decide se fica aberto ou não. Ele pede o alvará. Se não tem, fecha o estabelecimento de risco ou dá o prazo para consertar as irregularidades. É assim que funciona;, disse. Segundo o ex-funcionário, os estabelecimentos de risco interditados pela Agefis são publicados no Diário Oficial do Distrito Federal. Caso ele deixe de agir em algum local e, depois, algum problema seja identificado ou ocorra um acidente, o responsável é o fiscal que deixou de agir na legalidade. ;Acho que a questão não é aumento de salário, mas a punição que o agente agora pode receber;.

Multa
Os alvarás precários ou de transição servem em um primeiro momento para permitir o funcionamento dos estabelecimentos até que o proprietário busque soluções para as pendências, como a falta de habite-se ou o atendimento às solicitações feitas pelo Corpo de Bombeiros. Quem descumprir o auto de interdição levará multa de R$ 7.500 e responderá por crime de desobediência, cuja pena varia de seis meses a um ano. Caso haja irregularidade na documentação da loja de conveniência, o proprietário pagará multa no mesmo valor e terá o estabelecimento lacrado, até a regularização.


Entenda o caso
Punições civil e criminal
Em 23 de dezembro do ano passado, o então governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, sancionou a Lei distrital n; 4 .457, que altera a forma de autorizar o funcionamento de estabelecimentos comerciais no Distrito Federal. A nova lei permite, por exemplo, que a renovação do alvará de funcionamento seja feita a partir da apresentação de um laudo técnico que atesta as condições regulares do comércio, a cada cinco anos. A determinação só foi possível após o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios considerar a antiga lei inconstitucional. Em 13 de maio deste ano, o governo editou a Portaria n; 22, determinando a revogação dos alvarás precários dos estabelecimentos comerciais. Os fiscais que não lacrarem os estabelecimentos considerados de risco envolvidos no decreto podem ser punidos civil e criminalmente.


Licenças sem efeito
A operação realizada ontem começou por volta das 10h e envolveu 17 fiscais. Eles percorreram os pontos da Avenida Hélio Prates, entre as cidades de Taguatinga e Ceilândia e tinham como foco os postos de gasolina. Dos 18 estabelecimentos visitados, dois tiveram as bombas de combustível lacradas, seis funcionam por autorizações liminares, e aguardam decisão judicial, e 10 possuem alvará definitivo. Até a decisão judicial de agosto de 2009, estabelecimentos que funcionam com autorização liminar não são interditados.

O depósito de mercadorias da rede de supermercados Carrefour, localizado em Santa Maria, também foi lacrado por problemas no alvará. Dois restaurantes que funcionam dentro do Complexo Penitenciário da Papuda foram notificados e terão que regularizar as pendências em até 30 dias. Senão, serão obrigados a fechar as portas.

Risco
O primeiro posto de combustível fechado, da bandeira Ale, foi vistoriado às 10h20 e apresentou um alvará transitório. Mas o texto que autorizava essa categoria de documento foi revogado pelo então governador em exercício Wilson Lima por meio do Decreto n; 31.482/10, e todos os documentos emitidos dentro dessa prerrogativa perderam a validade. Após a conferência do alvará inválido, os fiscais lacraram as bombas, colaram cartazes divulgando a interdição e cercaram a área de entrada do posto com cones. A loja de conveniência foi notificada, pois seu alvará estava vencido. Se a situação não for regularizada em 30 dias, ela também será interditada. ;Como os postos realizam atividade de risco, cabe a interdição sumária;, explica o fiscal da Agefis, José Carlos Alves de Souza.

O proprietário do local, Rivanaldo Gomes de Araújo, ficou indignado com a medida. ;Meu posto não estava na relação de estabelecimentos com problemas no alvará que o Diário Oficial publicou. Não estou aqui para brincar, e sim para trabalhar. Posso ter pecado por não ir atrás da nova versão do documento, mas com essa interdição, vou deixar de faturar cerca de R$ 50 mil por dia;, lamentou.

Segundo a Agefis, a Administração Regional de Taguatinga não especificou os estabelecimentos que deveriam se adequar e, como o empresário apresentou documento que não vale mais, a interdição seria mesmo o único caminho.

Dez postos de combustível estavam com o alvará em dia durante a operação de ontem. Um deles, cuja marca é Auto Shopping, tinha licença definitiva tanto para o posto quanto para a loja de conveniência.


Cronologia
  • 18 de junho
    A Universidade Católica de Brasília (UCB) e outras três faculdades de Taguatinga (JK, Unicespe e Projeção) são interditadas. No dia anterior, 18 estabelecimentos de diversos ramos haviam sido fechados ; duas revendas de gás, duas lojas de venda de fogos de artifício, cinco postos de gasolina e cinco faculdades no Gama.

  • 22 de junho
    Cerca de 100 lojas são fechadas e multadas na Feira dos Goianos, na Avenida Hélio Prates, em Taguatinga. Em 30 de abril deste ano, o órgão notificou as bancas irregulares e algumas fecharam as portas antes da chegada dos agentes. Nesse mesmo dia, as oito salas do Cinema Embracine, no Shopping CasaPark, são lacradas por não renovar os alvarás de transição.

  • 24 de junho
    Treze salas de cinema do Shopping Pier 21, localizado no Setor de Clubes Sul, recebem o lacre. Ainda no shopping, outros três estabelecimentos são fechados: os restaurantes Empório Santo Antônio, Zimbrus e Capital Steak House. O primeiro, com a cozinha sem condições de funcionamento, é punido pela Vigilância Sanitária, e os outros, por falta do alvará.

  • 28 de junho
    A Agefis interdita as salas de cinema do Shopping Pátio Brasil, no início da W3 Sul, e do Boulevard Shopping, na Asa Norte. As salas de projeção apresentaram apenas o alvará precário ou de transição e não o definitivo, como exigido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, segundo o fiscal do órgão.

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