Luiz Calcagno
postado em 13/07/2010 07:00
Depois de 159 dias, os quase 100 representantes de 12 comunidades indígenas acampados na Esplanada dos Ministérios receberão reforços. Nos próximos dias, são esperados cerca de 200 índios. Apesar da retirada dos acampados pelas polícias militar, civil e federal, sábado último, em cumprimento a uma decisão judicial, eles resistem e prometem continuar debaixo das árvores, às margens da Via N1, no sentido Congresso Nacional/Rodoviária. Os líderes indígenas exigem a revogação do Decreto n; 7.056, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 28 de dezembro último, dispondo sobre a reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai). Eles reivindicam ainda nomeação de um representante indígena em lugar do atual presidente do órgão Márcio Meira e a criação do Conselho Nacional dos Direitos Indígenas, composto exclusivamente por índios.O clima no local é tenso. No acampamento há muitas crianças e jovens. Mas apenas os adultos pernoitam ao relento. Os manifestantes estão determinados a ficar o tempo que for preciso, até que o governo atenda às suas exigências. Mas temem uma nova tentativa de retirada pelas forças policiais. No último sábado, durante a ação, a polícia confiscou barracas, cobertores e alimentos, na tentativa de demovê-los da intenção de voltar à Esplanada. Muitos dos materiais confiscados foram doados por igrejas, pela população e pelo Sindicato dos Servidores Públicos Federais do DF (Sindsep-DF). Houve confronto. Um índio e um ativista do movimento indígena, que filmava a ação da polícia, foram detidos por policiais.
O Decreto n; 7.056 substituiu as antigas administrações executivas regionais e postos indígenas da Funai por coordenadorias técnicas. Os líderes tribais discordaram da mudança. Para eles, as administrações regionais e os postos eram os meios pelos quais as comunidades se conectavam com o governo federal. As negociações para reverter a alteração não deram resultado, o que levou os representantes indígenas a decidirem pela ocupação da Esplanada e, assim, chamarem a atenção das autoridades para a insatisfação das comunidades.
Mais servidores
O presidente da Funai, Márcio Meira, garante que a criação das coordenadorias técnicas é positiva, pois permitirá ao órgão a contratação de um número maior de servidores para atender às comunidades indígenas. Segundo ele, o decreto é apoiado pela Comissão Nacional de Política Indigenista e pela maioria das organizações indígenas do Brasil. Para Meira, os manifestantes não têm representatividade. ;As coordenações técnicas têm equipes melhores. Ganhamos 85 cargos novos e estamos contratando 425 servidores. Serão 297 coordenadores técnicos locais e 36 coordenações regionais em todo o Brasil. Estamos realizando seminários para explicar a reestruturação. Só que isso fere interesses específicos de pessoas que perderam cargo e benefício;, afirma
Carlos Pankararu, um dos líderes do acampamento, discorda e afirma que a nova estrutura não tem poder para agir e apoiar os povos indígenas. ;Eles tiraram a estabilidade da Funai. Eles fazem isso porque muitos dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) são em terras indígenas;, acusa Carlos Pankararu.
Edileida Guajajara, da etnia guajajara, afirmou que o decreto provocou um clima de incerteza em sua aldeia sobre o atendimento de itens básicos como educação e até emissão de documentos. Ela explica que teme não ter acesso aos direitos garantidos a todos os cidadãos brasileiros. ;Quando tem invasores nas terras, acionamos a Funai, que chama a Polícia Federal, que nos protege. Essa proteção, a gente não tem mais, desde que surgiu esse decreto;, reclama
Para o secretário adjunto do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cléber Busato, ambos os lados precisam fazer concessões. ;É preciso contextualizar a crise. Por um lado, a situação criada tem relação direta com a iniciativa do governo federal, que restruturou a Funai sem considerar as participações dos povos indígenas na elaboração do decreto. A indignação deles vem daí. Por outro lado, os acampados são contrários à criação do Conselho Nacional de Política Indigenista, como previsto em um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, resultado de debates com as lideranças indígenas nos últimos anos;, explica. Embora o Cimi compreenda o entendimento dos acampados, diverge da resistência do grupo em relação ao projeto de lei.