postado em 14/07/2010 07:54
Quando o assunto é exuberância natural, Brasília se mostra privilegiada por ter sido erguida em um cenário caprichado. Para completar a majestade da região, os arquitetos e pensadores da cidade decidiram levantar monumentos feitos de concreto sinuoso. As igrejas, os prédios públicos e os enfeites arquitetônicos que Oscar Niemeyer criou para ornamentar a nova capital encantam tanto moradores quanto turistas. Essas obras, no entanto, nem sempre estão em sua forma mais plena. Com a passagem dos anos, há muitas formas que marcam a história da cidade encobertas, total ou parcialmente, por tapumes e andaimes.Na Catedral de Brasília, as obras, que começaram em agosto do ano passado, ainda não terminaram. É preciso concluir a instalação dos vitrais coloridos da área interna, impermeabilizar o espelho d;água e restaurar o campanário, torre que sustenta os sinos. O local ficou parcialmente fechado, mas foi reaberto em abril. A expectativa é concluir todos os restauros até fevereiro do ano que vem. O tapume que cerca todo o terreno não cobre o acesso à igreja e as visitas seguirão normalmente. A visão parcialmente encoberta da maravilha arquitetônica parece não inibir os turistas.
A operadora de telemarketing Juliana Santos, 25 anos, e seu marido, o fotógrafo Pierre Bomfim, 26, estão em Brasília pela primeira vez, visitando parentes. Do lado de fora da catedral, os dois se diziam impressionados com a arquitetura da obra. ;A foto na frente é que fica um pouco prejudicada, por causa das placas da obras;, reconhece ela, que aprovou o passeio ao Memorial JK. A turista notou também que a entrada do local estava suja. Mas o marido defende a necessidade de reparos em todos os patrimônios culturais: ;As obras têm que ser feitas. O problema é que toda reforma dá a impressão de bagunça. É frustrante no começo, mas depois fica tudo bem mais bonito;.
Reformas
O entusiasmo dos visitantes é confirmado por quem vive do comércio informal nas redondezas da igreja. ;Mesmo quando os tapumes fechavam toda a entrada, muita gente vinha aqui, tentando entrar;, revela o vendedor ambulante Augusto de Barros, 81 anos. Este ano, no entanto, as vendas ainda não prosperaram como nos anos anteriores. ;Mas vai melhorar, as férias estão só começando. Os gringos vêm com guias e todos eles sabem que a visitação está liberada;, torcia. Há mais de 15 anos, ele aproveita as temporadas de férias e o aumento na frequência de visitantes para faturar trocados vendendo pipoca colorida em frente à entrada.
Também turista de primeira viagem, Walkíria Roberta Prado, 24 anos, nem notou as placas de madeira atrapalhando a visão. ;Achei que fosse assim mesmo. Depois é que ouvi que a catedral está sendo reformada. De qualquer forma, ela está perfeita por dentro;, divertia-se. A vendedora de Presidente Prudente (SP) se dizia impressionada com a largura das avenidas, a quantidade de carros e o tamanho da cidade.
Mas, depois de contemplar a paisagem diariamente, muitos moradores deixam de lado o encantamento e começam a perceber que há problemas nos locais turísticos que ainda não ganharam solução. Principalmente quando já têm olhar aguçado como o do guia turístico Alex Souza Santos, 36 anos. ;A Torre de TV está um verdadeiro lixo. Os refletores do mirante estão cheios de chiclete. O elevador é velho, não tem ventilação, o carpete está destruído;, enumerou. Ele também defende que o comércio informal, que lida com a venda de lanches e lembrancinhas, deveria ser colocado em lugares específicos, e não invadir os acessos aos pontos turísticos. ;Você chega a um lugar e já se depara com a poluição visual. Atrapalha a sincronia da cidade.;
Circuito
Na capital pela primeira vez, as farmacêuticas Daniela Aquino, 32 anos e Sulamita Paiva, 38, aproveitavam o tempo e colecionavam uma extensa lista de visitas turísticas. No quarto dia de viagem, já estavam familiarizadas com a Torre de TV, o Parque da Cidade, a Feira dos Importados, o Museu e a Biblioteca Nacional, o Palácio da Alvorada e o Conjunto Nacional. Antes de explorar os detalhes da Praça dos Três Poderes, elas fizeram um tour completo pelo Congresso Nacional. Mesmo admitindo a imponência da arquitetura local, as duas não puderam evitar algumas impressões negativas.
Em alguns passeios, foram surpreendidas por pedintes na entrada dos locais. ;As reformas também incomodam. Ontem, subimos a Feira da Torre para tirar uma foto do balé das águas (a fonte luminosa). Tentamos vários ângulos, mas as placas de madeirite apareciam em todos. Acabamos desistindo de registrar o espetáculo;, contou Daniela. Ao se deparar com andaimes diante do Panteão, monumento da Praça dos Três Poderes, ela nem sequer identificou do que se tratava. ;Você pode me dizer o que é isso? Este vai ter que ficar para a próxima viagem.; Sulamita voltou aos tempos em que a nova cidade era apenas uma vaga ideia: ;Dá a impressão de que Brasília nunca será acabada. Vemos obras para todos os lados;.
As pedras portuguesas do calçamento já foram afixadas em seus lugares, mas ainda há resquícios de obra na praça. Além dos tapumes que circundam o Panteão e a Pira da Pátria, caminhões de empresas de engenharia circulam pelo local, e montes de areia e cascalho revelam que os trabalhos ainda estão em andamento. Segundo o secretário de Cultura, Silvestre Gorgulho, a reforma do Panteão prevê a impermeabilização e a substituição das placas de mármore danificadas.
Mas seria preciso muito mais para garantir um espaço de primeira mão. ;No local, não há sala para a administração, não há acessibilidade e também falta um sistema de fuga em caso de emergência;, citou Gorgulho. O secretário também se incomoda com o acervo do espaço. ;Você vai lá e fica cinco minutos. Não há muita coisa pra se ver.; Para melhorar a oferta de informações, ele contratou uma consultora mineira que fará um projeto para transformar o monumento em uma sala multimídia com vasta informação sobre cada herói homenageado. ;Nos próximos dias, um representante do Oscar Niemeyer virá a Brasília para tratar dessas adaptações. Em seguida, vou ao Rio para cuidar do projeto;, informou.
Acompanhamento
No caso do Teatro Nacional, ele admite que ainda há muito por fazer. A etapa externa da reforma já retirou goteiras, infiltrações e impermeabilizou o edifício. ;Até no palco havia goteiras;, ressaltou Gorgulho. Um restaurante localizado na cobertura, lacrado há cerca de 20 anos, foi todo revisado. Todos os cubos originais de Athos Bulcão, que estavam danificados, foram retirados, fotografados e refeitos. O processo de recolocação das formas geométricas ainda não foi concluído, e, segundo a Vice-Governadoria(1), na última segunda-feira foi liberada uma verba de
R$ 141 mil para garantir a conclusão do processo de recolocação dos cubos e a pintura das fachadas sul e norte.
;É importante fazer um controle constante. Temos percebido que não há essa constância, os monumentos se deterioram e o montante para recuperá-los acaba ficando maior;, destacou a vice-governadora Ivelise Longhi. Ela ressalta que outro passo importante é permitir que os monumentos tenham um espaço gerador de renda, como lanchonete, loja de conveniência ou espaço para a venda de suvenirs.
A Torre de TV, um dos programas dominicais favoritos do brasiliense, também passa por mudanças radicais. A urbanização da área que a rodeia já foi autorizada pelo GDF. O projeto que prevê a troca dos elevadores, impermeabilização, pintura do espaço e mudança de 600 feirantes para uma área próxima está orçado em R$ 450 mil.
O local onde funciona o Museu de Gemas, administrado pela Agência de Apoio ao Empreendedor e Microempresário, Sebrae, será devolvido ao GDF, que montará um café no local.
1 - De olho
No início de sua gestão, o governador Rogério Rosso criou o Comitê de Acompanhamento, Controle e Gestão de Obras Públicas. O objetivo é fazer levantamento das obras pendentes e dar continuidade às mais urgentes. A coordenação ficou a cargo da vice-governadora, Ivelise Longhi, que se reúne, periodicamente, com secretários responsáveis por sete pastas do GDF para avaliar a evolução das obras em vias, prédios públicos e monumentos do Distrito Federal.
"Você chega a um lugar e já se depara com a poluição visual. Atrapalha a sincronia da cidade."
Alex Souza Santos, guia turístico
Alex Souza Santos, guia turístico
Como estão as obras em alguns pontos turísticos do DF:
Catedral
A igreja que simboliza Brasília ganhou investimento de quase 25 milhões, custeados pelo Governo do Distrito Federal e pela Petrobras.
Catetinho
A primeira residência oficial do presidente Juscelino Kubitschek procura retomar as referências de época, preservando objetos e o mobiliário original do período em que Brasília foi construída. De tempos em tempos, é preciso fechar as portas durante um período e revisar a estrutura do museu, construído em madeira, que requer cuidados especiais. Em maio, a casa passou um mês fechada para visitação, mas a situação já está normalizada. Funciona de terça a domingo, das 9h às 17h.
Centro de Convenções
Já foram autorizadas obras de calçamento e de construção do estacionamento externo. Também estão previstas obras para garantir a acessibilidade, a instalação de elevadores, rampas, sinalização em braile e manutenção das poltronas. O orçamento prevê gastos da ordem de R$ 2,03 milhões. Abre de acordo com a programação prevista.
Clube do Choro
A nova sede está pronta, mas uma verba complementar será destinada à mobília do espaço. Os shows ocorrem sempre de quarta-feira a sábado.
Teatro Nacional
A reforma começou em 2007 e ainda não foi concluída. Na primeira etapa, foram resolvidas as questões externas, como os episódios constantes de infiltrações e a renovação dos cubos. A próxima fase prevê a impermeabilização dos cubos e a pintura das fachadas norte e sul, onde eles foram instalados. A expectativa é que, nessa fase, as salas de espetáculo continuem funcionando normalmente. Ainda estão previstas melhorias no interior dos teatros, como substituição dos sistemas elétrico e hidráulico. O espaço está sujeito à programação dos espetáculos.
Planetário
O centro de estudos passa por reformas estruturais e ganhará novos equipamentos. Um projetor de alta definição reproduzirá imagens espaciais. Segundo previsões da Vice-Governadoria, o projeto deve estar concluído até novembro.
Torre de TV
O espaço terá elevadores modificados, passará por impermeabilização, pintura e os feirantes mudarão de local. O Museu de Gemas dará espaço a um café. Os arredores serão urbanizados. A Feira vira atração turística durante os finais de semana, até as 17h.