Helena Mader
postado em 24/07/2010 08:05
O médico e pioneiro Ernesto Silva, que morreu em fevereiro deste ano, aos 95 anos, comprou muitas brigas em defesa da cidade onde viveu por mais de meio século. Na sua trajetória de atuação em prol da preservação da capital federal, algumas de suas principais batalhas aconteceram durante as reuniões do Conselho de Preservação da Área Tombada de Brasília (Conpresb). Criado pelo GDF em 2003 para discutir questões ligadas ao tombamento, o conselho reunia especialistas, representantes da sociedade civil, do governo e do setor produtivo, que debatiam mensalmente medidas de proteção do plano urbanístico da cidade. Mas o órgão, que tinha poderes até para questionar leis aprovadas na Câmara Legislativa, foi sepultado poucos anos depois de sua criação. Desde então, não há nenhuma entidade ou conselho que delibere exclusivamente sobre o destino da zona tombada de Brasília.
Poluição visual, ocupação de área pública, puxadinhos e grades nos pilotis dos prédios foram alguns dos assuntos da pauta dos encontros dos 17 conselheiros. A atuação incisiva dos representantes do Conpresb em defesa do patrimônio desagradou a muita gente, inclusive aos deputados distritais, que tinham seu trabalho fiscalizado e monitorado permanentemente. Em maio de 2004, o então parlamentar Leonardo Prudente ; que renunciou ao mandato de distritial em 26 de fevereiro deste ano depois de ter o nome citado no escândalo da Caixa de Pandora e de ser flagrado guardando nas meias dinheiro oriundo de suposta propina ; apresentou um projeto de lei para extinguir o Conselho de Preservação da Área Tombada de Brasília. Alegou que o conselho apenas ;engessava; a cidade e afirmou que a população sequer conhecia o Conpresb. A tentativa de encerrar as atividades do órgão foi suficiente para mobilizar toda a sociedade em defesa da entidade e torná-la ainda mais conhecida. Ernesto Silva era um dos mais aguerridos conselheiros. Logo que começou a polêmica em torno da extinção da entidade, ele saiu às ruas para defender a manutenção dessa instância deliberativa. ;As regras de ocupação foram criadas para proteger a qualidade de vida de Brasília. Cabe ao Conpresb garantir o cumprimento dessas normas;, justificou à época o médico Ernesto Silva. Deputados federais, senadores, acadêmicos e até mesmo o então ministro da Cultura, o cantor Gilberto Gil, entraram na polêmica. ;Não vamos deixar acabarem com o conselho para não termos retrocessos na questão imobiliária no Distrito Federal;, afirmou Gil. Representantes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) também bateram firmemente contra o projeto de lei que previa a extinção do Conselho de Preservação da Área Tombada. Reação Diante da reação das autoridades e da mobilização popular, os deputados distritais aprovaram a proposta em primeiro turno, mas decidiram voltar atrás. Retiraram o projeto de pauta e o Conpresb foi mantido. Mas, em 2006, o próprio governo optou pela criação de um novo conselho. Técnicos do GDF incluíram no Plano Diretor de Ordenamento Territorial a implantação do Conselho da Unidade Territorial Central ; mas a medida ainda não saiu do papel até hoje. O Conpresb encerrou suas atividades há quase quatro anos, logo depois que José Roberto Arruda assumiu o governo, e Brasília ficou sem nenhuma entidade oficial para tratar especificamente da defesa do patrimônio tombado. Quando o Conpresb foi extinto, o Conselho de Planejamento Territorial, ligado à Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, passou a acumular essa função. Mas o Conplan não trata exclusivamente de problemas da área tombada e delibera sobre a ocupação urbana de todo o território do Distrito Federal. Além de integrantes do governo local, compõem o conselho dez representantes da sociedade civil indicados pelo governador, um representante do Conselho Regional de Arquitetura e Engenharia, e um acadêmico ligado a alguma universidade de Brasília. Para a professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB Sylvia Ficher, é importante que temas ligados à área tombada sejam tratados dentro do Conplan para que o planejamento urbano da zona central do DF não fique desvinculado das ações previstas para todo o território. ;Mas seria positivo se houvesse dentro do Conplan uma câmara para estudar exclusivamente a zona tombada;, afirma a especialista. ;Mais relevante do que isso seria a vinculação do Conselho de Meio Ambiente com o Conselho de Planejamento Territorial. Essas duas instâncias deveriam ser articuladas para que pudéssemos crescer sem comprometer o meio ambiente;, destaca Sylvia Ficher, que era conselheira do Conpresb. Quem também já integrou o antigo Conselho de Preservação da Área Tombada é a atual vice-governadora Ivelise Longhi, arquiteta de formação. Ela defendeu a manutenção do Conpresb e agora quer discutir a criação de uma nova instância dentro do governo para cuidar da área protegida pela Unesco. ;Já está em elaboração dentro do GDF o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília, que vai reavaliar o crescimento de Brasília. Mas depois da conclusão desse plano, podemos criar um fórum permanente de discussões, que reuna especialistas e pessoas envolvidas na preservação da cidade;, afirma a vice-governadora. A capital em debate Brasília e o patrimônio mundial moderno será o tema de um debate promovido pelo Correio Braziliense na próxima quarta-feira (28). Mediada pela jornalista Conceição Freitas, a discussão terá a presença de Francesco Bandarin, diretor do Centro do Patrimônio Mundial da Unesco; Luiz Fernando Almeida, presidente do Iphan; e Sylvia Fischer, mestre em preservação histórica. O debate será no auditório do Correio e quem quiser participar, pode inscrever-se gratuitamente pelos telefones 3214-1388 e 3214-1290, ou pelo site www.correiobraziliense.com.br/doispontos.