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Cidades

Comunidade de Monte Alto reivindica que o município goiano passe a fazer parte do DF

Desde os anos 80, quando começou a ocupação, faltam serviços básicos

Com aproximadamente 10 mil habitantes, Monte Alto, distrito de Padre Bernardo, em Goiás, ainda sofre com a falta de infraestrutura. Além de policiamento e transporte escassos, os moradores convivem com o medo de contrair doenças como a hepatite. A água que abastece as casas, segundo a comunidade local, está poluída com lixo, dejetos de animais e defensivos agrícolas. Coceiras e dores de estômago são comuns em crianças e adultos na localidade. O pedaço de terra fica distante 25km de Brazlândia e 65km da sede urbana, mas ainda não está no mapa do Brasil. Por causa da maior proximidade com o Distrito Federal, moradores da região começaram, nesta semana, a fazer um abaixo-assinado para a área deixar de ser responsabilidade do município goiano e passar a ser atendida pelo DF.

A comunidade pretende entregar a solicitação ao governo federal, mas para isso seria necessário fazer um novo zoneamento geográfico. No mapa, Monte Alto aparece como uma fazenda, no alto de uma chapada ; daí a razão do nome. O chacareiro Jesuíno Caldeira Quintal, 74 anos, é o morador mais antigo da região. Ele se mudou de Ceilândia para a localidade em 1986 e conta que no espaço existiam apenas três barracos feitos de tábua. O proprietário da fazenda se chamava João Galetti, e o terreno tinha o nome de Fazenda Desterro. ;Ele era dono de imobiliária e picotou toda a terra para vender;, contou Jesuíno.

A partir de então, dezenas de famílias começaram a habitar as pequenas chácaras que estavam sendo formadas. ;Nós existimos, mas no mapa continuamos sendo um pedaço de terra;, explicou. O distrito foi criado por lei, em 2007, e é reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas nem toda a divisão geográfica aparece no mapa do país.

Carteiros não chegam a Monte Alto. As correspondências são entregues em caixas postais ; cada morador aluga uma ;, em Brazlândia. Há um posto policial instalado logo na entrada do povoado, mas os moradores quase não encontram agentes na sede ou circulando pelo lugar. Mesmo durante o dia, não há quem se arrisque a deixar a casa sozinha ou destrancada. ;Para ir ao vizinho, a gente tem que ficar de olho, porque é questão de segundos para os bandidos entrarem e levarem nossas coisas;, contou a doméstica Fernanda Pereira da Silva, 26 anos.

Água ruim
Na casa de Telma Antônia dos Santos, 50 anos, a água não é canalizada e, por não chegar às torneiras, precisa ser armazenada em caixas de fibra. ;Morro de medo do mosquito da dengue e vivo tampando bem as caixas. Para beber água, a gente tem que colocar um remédio chamado hipoclorito, distribuído pelo Ministério da Saúde. O gosto é muito ruim;, disse.

A barragem que abastece as residências também é utilizada para lavar animais e para a diversão de jovens. Quem visita o local vê de longe inúmeras sacolas plásticas, maços de cigarro vazios, latas de cerveja e garrafas pet espalhadas às margens do reservatório. O comerciante Vicente da Costa, 52 anos, precisa passar pomada em todo o corpo depois de se banhar. ;É só tomar banho que já começo a me coçar. Não deixo nenhum dos meus filhos chegar perto da barragem.; A Saneago, empresa de saneamento de Goiás, disse por meio de nota que a operação do sistema não é sua responsabilidade. A nota afirma ainda que ;a Saneago, atendendo pedido da prefeitura, faz manutenção eletromecânica; e que tem ;estudos preliminares para elaboração de projeto e implantação de sistema, dentro dos padrões técnicos que atendam e garantam o fornecimento de água potável;.

Ambulância
Segundo o secretário de administração pública de Padre Bernardo, Salvador Duarte, o município se preocupa com a situação de Monte Alto, ao contrário do que alegam os moradores. Ele disse que o Ministério Público entrou com ação civil pública em 22 de abril deste ano por causa da falta de água tratada, e que a prefeitura tem cobrado soluções rápidas para o problema. Assim como Monte Alto, outros três distritos como Trajanópolis, Vendinha e Taboquinha estariam na mesma situação. Na próxima segunda-feira, a prefeitura tem reunião marcada com a Saneago para discutir a questão da água nessas áreas.

Outra reclamação recorrente é a falta de ambulância no posto de saúde. Os médicos atendem durante o dia, mas quem precisar ser levado para algum hospital tem de contar com a boa vontade dos vizinhos que tenham carro. Pelo gasto com gasolina, o frete sai por pelo menos R$ 40. Como Brazlândia é a cidade mais próxima, os moradores de Goiás sempre procuram atendimento no DF, o que contribui ainda mais para o inchaço na rede pública. ;A maioria dos eleitores aqui transferiu o título para votar no DF. Já nos cansamos do descaso de Goiás;, desabafou a dona de casa Glória dos Santos, moradora da região há 17 anos. Segundo a secretária municipal de saúde, Fabíola Xavier, a ambulância foi retirada para atender pacientes de hemodiálise. ;Eles fazem tratamento em Brasília três vezes por semana e, além de estar em situação mais grave, não têm condições de arcar com as despesas de transporte;, explicou. Outra ambulância para emergência, disse, já foi providenciada.

A comunidade twem se unido pela independência, mas a maior vontade é fazer parte do DF. Para alguns especialistas, a emancipação não seria a solução. Para alcançar a condição de município, o povoado precisa primeiro adquirir autonomia financeira, à custa do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Para tanto, é necessário também cumprir determinações mínimas previstas em lei, como apresentar potencial arrecadatório.


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