postado em 19/08/2010 08:10
Muito antes de o sonho desenvolvimentista de Juscelino Kubistchek tomar forma e arrastar tratores e toneladas de concreto ao Planalto Central, a pequena Planaltina (GO), a 38km do Plano Piloto, já tinha muitas histórias para contar. Histórias de vida em compasso de calmaria, de crianças correndo pelo cerrado e tomando banho nas águas cristalinas da região, de tropeiros atravessando riquezas Brasil adentro. Naquele tempo, a paisagem era emoldurada pelo casario colonial, pelas igrejas que surgiam no horizonte e pelo cerrado sem fim. Mas esse cenário, um dia bucólico, transformou-se em cidade, que hoje completa 151 anos. Poucos elementos dessa época ainda estão presentes.Quando foi absorvida pelo Distrito Federal, Planaltina transformou-se em mais uma das cidades-satélites que compõem o território. A arquitetura típica foi se perdendo em meio às casas modernas, os bairros carentes se multiplicaram, problemas comuns a todos os centros urbanos começaram a surgir. ;A cidade não passou por uma fase de crescimento, sofreu um inchaço;, descreveu o artista plástico Adeílton Oliveira, 37 anos. A sobrecarga teve efeito negativo na rotina de quem já vivia por lá. Entre os problemas recorrentes, os moradores citam os males visíveis em qualquer outra cidade que rodeia Brasília: educação precária, violência, hospitais superlotados.
Nascido e criado em Planaltina, o comerciante Elio Gomes, 33 anos, aponta que os jovens da cidade sofrem com a falta de emprego e de oportunidades para aprender uma profissão. ;As empresas não investem muito na mão de obra de região;, apontou. O metrô, alardeado como solução para o trânsito carregado das cidades em expansão, também não chegou até lá. ;É o tipo de solução que deveria se estender a todos;, considerou Gomes. Os hospitais, cercados por municípios do Entorno, estão sobrecarregados com o excesso de demanda.
Presidente da Feira de Hortifrutigranjeiros de Planaltina, José Maria Melo, 39 anos, mostra-se preocupado com o avanço da violência. ;Antes, a meninada andando de bicicleta era cena comum. Hoje, a gente acha logo que é bandido se aproximando;, lamentou. Ele também relata que, ontem, um amigo procurou o hospital da cidade para avaliar uma fratura no pé e esperou cerca de sete horas para ser atendido. Em resumo: os problemas da Planaltina contemporânea não são os mesmos de um vilarejo goiano perdido no mapa.
Quem sente saudade dos velhos tempos pode beber da fonte do artista Adeílton de Oliveira, que usa suas criações para enaltecer o passado. Em suas obras, da inspiração à matéria-prima, tudo é relíquia. Para comemorar o aniversário da cidade que povoa suas lembranças, ele desenvolveu 21 peças para a exposição Quando aqui era sertão (1), em cartaz até 5 de setembro, no Museu Artístico e Histórico de Planaltina. Todas as cenas reproduzidas fazem referências a tradições que remontam a tempos anteriores à criação de Brasília, quando o homem do cerrado ainda desconhecia o progresso que seria trazido pela nova capital.
São brincadeiras infantis, pescarias, grãos de café trabalhados no pilão, cenas de festas, altares das Folias do Divino e de Reis (2). Como se trata de miniaturas, as obras ficam expostas em uma mesa, acompanhadas de lupas, para permitir uma apreciação mais detalhada. Até mesmo Mestre d;Armas, personagem mitológico da região, é retratado em uma das imagens. Os trabalhos são feitos em madeira, palitos de fósforo, pedaços de carros de boi e de casarões demolidos, restos que o artista recolhe em suas andanças por todos os cantos que visita. ;Há seis anos coleto esse material, à espera de uma oportunidade de usá-lo. Agora, pude contar a história da cidade com despojos dela mesma;, reforçou.
Muitos dos casarões históricos que ganham vida em suas pequenas esculturas foram recriados a partir de fotos históricas. Uma das peças é adornada por um oratório restaurado, do século19, e outra tem como base uma cruz fincada em uma fazenda da região, na década de 1950. Parte da memória afetiva do artista, a recordação dos meninos chupando cagaita (fruta nativa do cerrado), também ganha forma em madeira. ;Antigamente, os pés de cagaita estavam por toda a parte, mas o crescimento da cidade está destruindo a vegetação típica daqui. Hoje, para chupar cagaita direto do pé, é preciso ir muito longe, se embrenhar no mato;, contou. O artista também se lembra de, quando menino, tomar banho no Córrego do Pompilho, que atravessa a entrada de Planaltina. Hoje, a turbidez da água, causada pela poluição, espanta qualquer banhista.
Atualidade
Diante dos dramas de uma cidade do século 21, a Administração Regional de Planaltina contra-ataca com realizações. Segundo o administrador da cidade, Geremias Lopes, durante um período de cerca de 16 anos não houve qualquer investimento para elevar a qualidade de vida na cidade. ;Planaltina passou muito tempo sem representação nenhuma na Câmara Legislativa. Mas na atual legislatura, três parlamentares defenderam os interesses da cidade;, esclareceu.
O resultado, segundo ele, foi a inauguração de oito postos policiais, cinco escolas, nove quadras poliesportivas, sete playgrounds, dois campos de futebol sintético e a construção da Praça do Estudante. Também foram reformadas 15 quadras de esporte e mais cinco campos de futebol society foram iluminados. Lopes garante ainda que todo o bairro de Arapoanga já foi asfaltado e recebeu obras da rede de saneamento básico. Não há ações previstas na área da saúde, problemática em todo o Distrito Federal, mas o gestor da cidade pretende continuar investindo em educação. ;Nossa intenção é que pelo menos mais cinco escolas sejam erguidas nos próximos cinco anos;, salientou.
Para comemorar os 151 anos, a organização do evento prevê torneios esportivos, exibição de filmes, disputa de baralho, o já tradicional desfile cívico, estudantil e militar e até mesmo uma megaevento de rock, com a participação da banda Raimundos. Em ano eleitoral, a festa terá menos pompa do que as edições anteriores. Pode ser que, diante de uma comemoração discreta e voltada para as tradições regionais, a comunidade experimente, de novo, o sabor de uma cidade goiana, pequenina e orgulhosa, como foi muito antes de Brasília existir.
1 - Religiosidade
A cidade também tem a melhor via sacra do DF. A encenação do espetáculo da Paixão de Cristo começou em 1973 e até hoje arrasta milhares de fiéis de todos os cantos ao Morro da Capelinha, cenário escolhido para a montagem. Durante a cerimônia, a plateia participa da peregrinação até o local e depois assiste ao espetáculo sobre a crucificação de Jesus Cristo
2 - Inspiração folclórica
O nome da exposição é trecho de uma música de um artista da cidade, seu Erasmo, famoso professor e catireiro. Após lecionar disciplinas tradicionais, ele passou a ensinar a dança folclórica para interessados. Na catira, o ritmo é marcado pelas batidas dos pés e das mãos dos dançarinos.
Programação
Hoje
8h ; Ações gerais do Senac ; Praça do Estudante
Das 8h às 18h ; Festival de Esporte e Educação ; Praça do Estudante
16h ; Cultura Viva na Praça ; Praça do Estudante
20h ; Lançamento do documentário A festa do Divino Espírito Santo ; Igrejinha Velha de São Sebastião
Sábado
8h ; Arena de Golzinho ; Praça da Igrejinha São Sebastião
20h ; Sarau em ação ; Auditório da Administração Regional de Planaltina
Dia 23
19h ; Torneio de Truco ; Funções Múltiplas. Os jogos também serão realizados nos dias 24, 25, 30 e 31 deste mês e em 1;, 2, 8 e 9 de setembro
Dia 27
20h ; Cine Ação ; Auditório da Administração Regional de Planaltina
Dia 28
20h ; Porão do Rock ; Praça do Estudante. A seletiva do festival será realizada na cidade, contando com a presença de bandas do DF. O show de encerramento será com o grupo Raimundos. A entrada é franca.
Dia 29
Das 8h às 14h ; Desfile cívico, militar e estudantil ; Avenida Independência
14 de outubro
18h ; Campeonato de Futebol dos Órgãos ; Praça do Estudante