Cidades

Acusado de fazer "gato", casal de idosos fica sem energia desde 2006

Somente agora, por decisão judicial, eles terão luz em casa. Sem provas da ilegalidade, Celg cobra R$ 2,8 mil referente ao ressarcimento da suposta energia furtada

postado em 28/08/2010 07:48
Um casal de idosos está há quatro anos e quatro meses sem energia elétrica em casa. O aposentado Evaldo Pereira da Silva, 71 anos, e a mulher, Maria Delita do Nascimento, 61, foram acusados pela Central Elétrica de Goiás (1) (Celg) de fazer gambiarra de 2001 a 2005 e, por esse motivo, tiveram o serviço cortado em 26 de abril de 2006. O problema é que o casal nunca fez o chamado gato. ;Nem sei como é que faz. Sempre paguei minhas contas direitinho. Não tenho dinheiro, mas tenho responsabilidade e dignidade para não pegar nada de ninguém;, desabafou Evaldo.

Para ter energia, Evaldo e Maria Delita usam uma extensão do vizinho

Por causa do suposto ;gato;, a Celg cobrou R$ 2,8 mil de ressarcimento pela energia furtada. Sentindo-se injustiçado, Evaldo procurou uma advogada. A Justiça concluiu que a cobrança era indevida e, em 18 de junho deste ano, determinou o religamento da energia, bem como a instalação de um novo medidor na casa do casal. Mais de dois meses depois, a sentença ainda não foi cumprida. Ontem, o casal registrou ocorrência policial e o gerente da agência da Celg da Cidade Ocidental, Paulo Marcelo Alves, recebeu intimação para comparecer ao Centro Integrado de Operações de Segurança (Ciops) às 14h de segunda-feira para prestar esclarecimentos.

A reportagem do Correio procurou Paulo Marcelo. Ele disse que não sabia da decisão e garantiu que iria determinar o restabelecimento da energia. ;Fiquei surpreso. Vou encaminhar os pedidos para o departamento jurídico;, garantiu. A sentença foi publicada no Diário de Justiça de Goiás em 25 de junho. Segundo Eliana Duarte, advogada do casal de idosos, a Celg participou de duas audiências, mas não conseguiu comprovar a existência de gambiarras na casa de Evaldo e Maria Delita. ;É um absurdo porque eles passaram pelo transtorno de não ter energia durante muito tempo, mesmo não tendo cometido erro algum;, disse.

Evaldo e Maria sempre pagaram as contas religiosamente e guardam até hoje os comprovantes. Os dois moram na Quadra 2 do setor Nova Friburgo, na Cidade Ocidental, com um filho de 30 anos, portador de necessidades especiais. O mesmo lote abriga três casas de pessoas da mesma família. Para que não ficassem completamente no escuro durante a noite, o pai de Evaldo, o aposentado José Gregório dos Santos, 94 anos, emprestou uma extensão para o casal plugá-la dentro de sua casa. A conta passou a ser dividida a cada fim de mês.

Mesmo com a ajuda do pai, Evaldo teve de abrir mão da água gelada, de sobremesas, da televisão, do rádio, da roupa passada e do chuveiro elétrico. Isso já dura quatro anos e quatro meses. Para ir ao banheiro durante a madrugada, a vela passou a ser a melhor amiga. A velha geladeira virou depósito para alimentos que não estragam com o calor. ;Eu guardo só algumas coisinhas, como limão, batatinha, cebola e por aí vai;, contou Maria Delita. Há dias em que ela se chateia por não poder se distrair. ;Sinto muita falta do meu radinho de manhã e de poder assistir ao noticiário. Se eu quiser fazer isso e até para beber água gelada eu tenho que pedir na vizinha;, lamentou.

No fim da tarde de ontem, eletricistas da Celg estiveram na casa do casal para religar a luz, porém, o interruptor estava quebrado e a energia só poderá ser restabelecida com a compra de um novo. Para Evaldo, o mais importante mesmo não é ter luz em casa nem assistir à tevê. ;Para a gente, que é humilde, essas coisas não fazem tanta falta. O que eu quero é ficar dentro do meu barraquinho sossegado, sem ninguém ficar me cobrando uma conta que eu não fiz. Sempre paguei minhas contas direitinho e nunca faço dívidas que eu não possa pagar.;

1 - 98,7% do estado
A Companhia Celg de Participações (CELGPAR) é uma concessionária de energia elétrica brasileira. Sua área de concessão abrange cerca de 98,7% da distribuição do estado de Goiás, num total de 237 municípios e aproximadamente 5 milhões de habitantes.

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