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Número de videolocadoras cai nos últimos anos e pirataria é um dos motivos

Segundo levantamento do sindicato local, número de lojas despencou de 650, no início dos anos 2000, para 160. A revolução digital e a pirataria são apontadas como as causadoras do declínio. O blu-ray e as locações virtuais dão sobrevida ao setor

postado em 26/09/2010 08:55
Alexandre Rocha não resistiu às dívidas e fechou as portas da Classic Vídeos, na Asa Norte: Foi a piratariaTrês em cada quatro videolocadoras do Distrito Federal esvaziaram as prateleiras e fecharam as portas na última década. A revolução digital e o avanço da pirataria dilaceraram o setor. A crise fez o número de lojas despencar de 650, no início dos anos 2000, tempos áureos do aluguel de fitas VHS, para 160, segundo o último levantamento feito pelo sindicato local, no fim do ano passado. Quem sobreviveu às intempéries se diferenciou para permanecer em um mercado drasticamente enxuto, mas que não permitiu ser enterrado de vez. Os remanescentes apostam na fidelidade de gente que ainda faz questão de sair de casa, ouvir o palpite de quem entende e levar filmes para ver deitado no sofá da sala.

O advento do blu-ray e as locações virtuais dão sobrevida ao setor. ;A crise forçou uma profissionalização que não existia, apesar das demissões;, afirma o presidente do Sindicato das Empresas Videolocadoras do DF (Sindivídeo), Paolo Piacesi, há 20 anos no mercado candango. ;Nosso comércio em Brasília perdeu em quantidade, mas não a essência. Entre os que ficaram e se adaptaram aos novos tempos, há uma tendência de consolidação;, pondera. Até quando a investida dará certo, nem ele nem ninguém arrisca dizer.

Mais do que a pirataria (veja O que diz a lei) ; crime Marcos André e Herbert trabalham na Oscarito, tradicional videolocadora na 407 Norte especializada em filmes de arte, alheios ao circuito hollywoodiano: diferencial que a mantém na ativaenraizado e aceito por parte da população ;, o que preocupa os empresários do setor são os downloads gratuitos na internet, em que qualquer um pode ter acesso a filmes sem pagar nada nem sair de casa. ;A impressão que temos é de que as locadoras não vão desaparecer em hipótese alguma, mas terão de acompanhar as mudanças;, avalia Piacesi. A favor do espaço físico criado para o aluguel de filmes, conta o tratamento personalizado. Cinéfilos adoram ser orientados pelos atendentes e, depois da sessão caseira, conversar com eles sobre a obra.

Filmes de arte
Os jovens Marcos André Rodrigues, 19 anos, e Hebert Nogueira, 24, trabalham na Oscarito, tradicional videolocadora na 407 Norte. Recebem clientes até do Entorno, ávidos pelas películas coreanas, suecas, russas. A videolocadora é especializada nos chamados filmes de arte, aqueles alheios ao circuito hollywoodiano. ;Há filmes aqui que ninguém encontra na internet;, avisa Hebert. ;Quem não se diferenciar está fadado à falência;, acrescenta o colega Marcos. O foco nos clássicos da sétima arte consegue atrair novos cadastros com frequência.

As videolocadoras sobreviventes sustentam um público fiel. Clientes da Classic Vídeos, na 209 Norte, lamentaram o fechamento da loja, previsto para até o fim deste mês. Todos os títulos do acervo estão sendo vendidos a preços promocionais, que variam de R$ 4,90 a R$ 49,90. ;Estamos tristes. Mas é melhor do que ficar triste e endividado. Tristeza passa. Dívida só tende a aumentar;, compara o proprietário, Alexandre Rocha. A empresa chegou a ter quatro unidades no DF. Em 2006, no auge, 500 filmes eram alugados nos fins de semana. Nos últimos dois anos, essa conta caiu para 200 locações. ;Vamos acabar com o negócio para fugir do prejuízo;, justifica.

Decidir fechar as portas não foi fácil. Uma faixa pregada na entrada da videolocadora anuncia o fim das atividades depois de 17 anos. As prateleiras e o balcão já estão vendidos. ;Foi a pirataria. Ela entortou a mentalidade das pessoas;, culpa Rocha. ;Estamos bem localizados, temos clientes fiéis, mas não dá mais. A margem de lucro encolheu muito e a liquidez da empresa cai a cada mês;, conta o empresário. ;A tábua de salvação para quem quiser se manter no mercado será o blu-ray;, acredita ele, que abrirá um restaurante do outro lado da rua.

Até 2006, era comum encontrar três videolocadoras em uma mesma comercial do Plano Piloto. Uma única loja chegava a ter 10 funcionários. Hoje, não passam de quatro. A Cult Vídeo, uma das mais conhecidas do DF, há uma década no mercado, fechou uma das cinco lojas que tinha, mas se estabilizou e planeja voltar a crescer. No primeiro semestre deste ano, o faturamento da empresa avançou 12% ante igual período de 2009. ;O mercado está muito mais enxuto, é verdade. Mas quem resistiu está colhendo os frutos;, comenta o proprietário, Alexandre Costa.

Especializada em filmes de arte ; como a Oscarito ;, a Cult Vídeo percebeu o movimento aumentar depois do fechamento do cinema da Academia de Tênis. A procura por títulos de games também ajuda a manter a clientela. ;Ninguém sabe o que vai acontecer com o mercado, mas ainda acredito nele. Falaram que o livro acabaria. Não acabou;, lembra Costa, antes de contar que fitas VHS ainda são alugadas. ;A Cult continua crescendo. Para mim, isso é sinal de que o mercado sobrevive;, conclui.

Alta definição

O Blu-ray, também conhecido como BD (de blu-ray disc), é um formato de disco ótico de 12cm de diâmetro (igual ao CD e ao DVD) destinado a vídeos de alta definição e armazenamento de dados de alta densidade. É considerado o sucessor do DVD, mas com capacidade para filmes com resolução muito superior. Requer uma televisão full HD de LCD, plasma ou LED para ser reproduzido em toda sua qualidade de imagem.

Filmes alternativos

As 10 salas de cinema da Academia de Tênis estão fechadas desde maio deste ano, quando um incêndio atingiu as instalações. O local ficou conhecido por projetar filmes alternativos e independentes, que não passam no circuito comercial. O complexo também abrigava grandes eventos, como o Festival Internacional de Cinema de Brasília.

O que diz a lei


O Código Penal, reformado em seus artigos 184 e 186 pela Lei n; 10.695/03, diz que a reprodução ilegal de músicas, vídeos, livros, obras de arte ou programas de computador, inclusive a violação de direitos autorais por meio da internet, pode render de dois a quatro anos de cadeia, mais multa. Está sujeito à mesma pena quem oferece ou distribui ao público a obra sem autorização do autor ou produtor da obra.

A Lei n; 9.609/98 define que programas de computador estão incluídos no âmbito dos direitos autorais. Com isso, é proibido reproduzir, copiar, alugar e usar cópias de software sem a autorização do dono dos direitos autorais. Quem usa software pirata pode ser condenado de seis meses a dois anos de prisão e a pagar multas diárias enquanto usar o software. Quem revende software ilegal está sujeito a uma pena de um a quatro anos de cadeia e a multa de até 3 mil vezes o valor de um software legal.

E eu com isso?


Ao comprar produtos piratas, o consumidor movimenta um comércio totalmente clandestino, em detrimento de atividades legalizadas. Entre os males da pirataria estão o desemprego, a sonegação de impostos, a prática de concorrência desleal e o incentivo ao crime organizado. Também existe o risco de produtos piratas danificarem aparelhos de DVD e computadores, entre outros equipamentos eletrônicos.

Eu acho


Segundo levantamento do sindicato local, número de lojas despencou de 650, no início dos anos 2000, para 160. A revolução digital e a pirataria são apontadas como as causadoras do declínio. O blu-ray e as locações virtuais dão sobrevida ao setor;Alugo filmes em videolocadoras desde a época do VHS. Hoje, levo para casa, em média, dois por semana. Vejo na hora em que quero, paro e continuo a ver como e quando quiser. Não acredito que esse mercado vá acabar. Falaram isso do livro também, mas é pura bobagem. Claro que houve um boom, mas agora é a hora da consolidação. Filme pirata, não compro: a qualidade é horrível;.

Cléber Lago, 60 anos, arquiteto, morador da Asa Norte

Aposta no virtual


A crise que devastou o mercado de videolocadoras pode ser percebida na Blockbuster. A rede que dominou o setor por mais de uma década encolheu assustadoramente. A cada mês, diminui o número de prateleiras com filmes nas Lojas Americanas, que, em 2007, compraram a franquia internacional de locação de filmes no Brasil. Nos Estados Unidos, a Blockbuster encaminhou, na última semana, pedido de concordata como parte de acordo pré-arranjado com credores para reduzir a dívida de quase US$ 1 bilhão para cerca de US$ 100 milhões.

Para se manter viva no mercado, a rede aposta, agora, nos pacotes de locação virtual. Livrarias também têm optado por esse caminho. Este mês, começou a operar em Brasília a NetMovies (www.netmovies.com.br), considerada a maior locadora on-line de filmes do país. Usuários têm 22 mil títulos à disposição. Pagam mensalidades que vão de R$ 9,99 a R$ 79,80 e podem receber em casa um número determinado de filmes por mês e ficar com eles por tempo indeterminado. Aos poucos, o modelo rouba clientes das locadoras físicas.

O bancário Ivel Onório Pereira Júnior, 26 anos, descobriu o serviço no início deste ano, quando incluiu na sala uma televisão de 42 polegadas e alta definição. Ao constatar que poucas locadoras da cidade trabalham com blu-ray, enviou um e-mail para a empresa on-line e cobrou a presença dela na capital federal. ;Você paga uma mensalidade, não precisa sair de casa e pode ficar com o filme o tempo que quiser. Esse modelo proporciona mais liberdade ao cliente;, opina o jovem, que paga R$ 64,90 pelo pacote escolhido. Tem direito a três filmes em formato blu-ray mensalmente.

O principal executivo da NetMovies, Daniel Topel, diz que o mercado de Brasília é promissor. Sem falar em números absolutos nem percentuais, ele conta que o desempenho na cidade, no primeiro mês, surpreendeu e já superou a média de Belo Horizonte e Curitiba. ;As pessoas gostam de ver filmes em casa. Isso não mudou;, sustenta. A empresa, presente em sete unidades da Federação, começou a operar em 2006. Desde então, conta Topel, o faturamento e o número de clientes crescem todo mês.

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