postado em 08/10/2010 07:47
A lona azul com vermelho está montada. O picadeiro espera para receber os palhaços, trapezistas, o globo da morte. Tem pipoca, algodão-doce e alegria. Tudo pronto para começar o espetáculo. Falta ;apenas; o essencial: o olhar do público. A plateia esperada é composta por gente muito importante, as crianças da Escola Classe 52 de Taguatinga e do Colégio Objetivo Master, de Vicente Pires.São centros de ensino inclusivos, ou seja, atendem também crianças com alguma limitação física ou mental. Foram convidados pelo projeto Festival dos Sonhos. A iniciativa ocorre todo ano, às vésperas do Dia das Crianças, com temas diferentes. A intenção é promover o desenvolvimento social e levar felicidade a quem vai construir o futuro. Este ano, a ferramenta escolhida foi o circo. Ontem, mais de 600 crianças passaram pelo espaço armado atrás da Administração do Guará.
Era cedo, por volta das 9h, quando o ;respeitável público; começou a chegar. Os pequenos pouco se importavam com o calor de quase 30;C. Debaixo da lona, o sol parecia aquecer mais forte. Quem liga se o suor escorre pelo corpo? E se a respiração sai abafada? A expectativa para ver o show era maior que tudo isso.
Antes do espetáculo, uma surpresa. Meninas e meninos seriam mais do que simples espectadores. Puderam participar do show, no palco, ao lado dos integrantes do Reality Circus. A trupe é reconhecida nacionalmente e já participou de desafios na televisão. Antes disso, as crianças receberam rápidas oficinas gratuitas para se qualificar. Aprenderam a fazer malabarismos, a se equilibrar no trapézio, a fazer palhaçadas. Quando o relógio marcou 10h, as cortinas se abriram. Os trapezistas começam a apresentação.
Os olhos espertos das crianças acompanhavam cada movimento com atenção. O pescoço de cada um se movia de acordo com o ritmo dos artistas circenses. ;É muito difícil essas coisas que eles fazem. O trapezista deve ter medo, mas não desiste. Isso é legal;, disse Ester Machado, 9 anos, sem tirar os olhos do rapaz que se balançava no ar. ;Ele corre o risco de cair, mas nem liga;, acrescentou a amiga Stephanie Cristina Mesquita, 10. As duas são alunas da EC 52 de Taguatinga e vivem na mesma região.
Primeira vez
A moradora de Taguatinga Kathleen Kamila Viana, 9 anos, nunca havia entrado em um circo antes. Imaginava como eram as atrações pelo que via na televisão e escutava dos colegas. ;Eu pensava que era tudo muito bonito e animado. Mas não tinha visto de perto;, afirmou. Ontem, além de assistir ao espetáculo, a menina teve a chance de se apresentar no palco. Algumas das crianças que tiveram bom desempenho nas oficinas foram convidadas a fazer parte do show.
Kathleen vestiu uma roupa roxa do acervo do circo, enfeitada conforme pedia a ocasião. Mostrou seu talento para a lira, um tipo de argola grande, que fica pendurada, na qual os artistas fazem acrobacias. No começo, ela estava tímida, mas depois entrou no clima. Parecia artista de verdade. ;A lira até que é fácil, mesmo para quem nunca viu o circo antes. É só prestar atenção;, ensinou.
As lições do circo ensinam muito além do entretenimento. Podem ser o início de um criativo aprendizado de persistência e superação. ;No começo, eu estava com medo. Tremi muito. Depois, fui criando coragem, ficando mais firme;, afirmou Dayane Beatriz Onorato, 12 anos, moradora de Vicente Pires, que se apresentou ao lado da contorcionista. ;Eu tentava fazer isso em casa, no meu quarto. Nunca imaginei ter um público;, acrescentou. A pequena Larissa Naomi Ishii, 7, também deu demonstrações de talento e elasticidade. ;Nem doeu. O mais legal são os aplausos;, constatou.
Depois de quase uma hora de diversão, muita gente saiu da arena com a sensação de que palhaçada é coisa séria. ;Ser palhaço não é só fazer uma graça. Pode ser um futuro inteiro de levar alegria e diversão para as pessoas. Gostei muito de estar no palco vestido de palhaço, é uma ligação que aproxima as pessoas;, explicou Ivan Gabriel Salvador, 11 anos, com ares de gente grande.
Gabriel esteve no picadeiro ao lado do palhaço Chevrolet, que tem mais de 30 anos de carreira. ;Cada sorriso é diferente. A emoção de se apresentar é sempre nova;, definiu o palhaço. A expressão de felicidade no rosto de Alice Firmiano, 7 anos, portadora de necessidades especiais, confirmava as impressões de Chevrolet. ;O palhaço é o melhor;, disse Alice, em sua cadeira de rodas, enquanto comia pipoca colorida.
A última atração foram os motociclistas do globo da morte, que já se apresentaram até em Las Vegas (EUA). Primeiro, um deles entrou na esfera. Em seguida, vieram mais dois. O globo parecia pequeno demais para tanta gente. A sensação era a de que, a qualquer momento, eles se atropelariam. As crianças acompanharam tudo, de coração acelerado. A possibilidade de a performance dar errado assustava o público. Depois de quase cinco minutos de manobras radicais, tudo saiu conforme o planejado. As cortinas vermelhas ornamentadas de dourado se fecharam. As crianças deixaram a arena com a sensação de que, no fim, tudo termina bem.
REALITY CIRCUS
Com sessões às 17h30 e às 20h30, gratuitas para crianças até o dia 12. Adultos pagam R$ 10. Local: atrás da Administração Regional do Guará.
Onze anos de alegria
O projeto Festival dos Sonhos existe há 11 anos. A primeira edição teve o teatro como tema. Os organizadores, apoiados por diversas instituições, entre elas a Caixa Econômica Federal, trouxeram a peça A cuca fofa de Tarsila ; sobre a artista plástica Tarsila do Amaral, um dos ícones do modernismo brasileiro ;, voltada para crianças. Um dos objetivos, desde o primeiro momento, é arrecadar brinquedos para crianças carentes. Mais de 1 milhão já foram doados.
Além disso, a Alquimia, responsável pela organização, construiu 12 brinquedotecas em hospitais públicos do DF. A iniciativa entusiasma, principalmente, os pequenos. ;Por meio do projeto, descobrimos que a criança tem por natureza o desejo e a vontade de colaborar com iniciativas de desenvolvimento social, principalmente quando é para ajudar outras crianças;, avaliou o coordenador do Festival dos Sonhos, Fernando Fernandes.
Este ano, por meio do circo, o projeto pretende incentivar as possibilidades de criar e de sonhar de pelo menos 9 mil meninos e meninas do DF. O projeto vai até o próximo dia 22.