postado em 14/10/2010 08:00
O surto da bactéria Klebsiella Pneumoniae Carbapenemase (KPC) no Distrito Federal começa a preocupar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Um grupo seleto de infectologistas e bacteriologistas, de todo o Brasil, irá se reunir no próximo dia 22 para discutir o poder de resistência do micro-organismo e padronizar informações. Desde janeiro, 14 pacientes internados em hospitais privados e públicos da capital morreram infectados pelo KPC. Outros quatro casos estão sendo investigados.O micro-organismo já foi detectado em oito hospitais particulares e em nove (60%) das 15 unidades da rede pública do DF. Dos hospitais públicos, os com maior ocorrência de contaminação pela superbactéria são o Hospital Regional de Santa Maria e o Hospital de Base, todos de responsabilidade do Governo do Distrito Federal. Mantido pela União, o Hospital Universitário de Brasília (HUB) registrou cinco casos suspeitos. Desses, três fatais. A KPC ataca pacientes em estado grave, geralmente internados em Unidades de Terapia Intensiva ; UTIs.
A dificuldade em combater a superbactéria preocupa especialistas. Apenas três antibióticos ; tigerciclina, polimixina B e amicacina ; de eficácia ainda não comprovada, estão sendo usados no tratamento da infecção. ;A oportunidade de cura dele (paciente) fica muito limitada. Nós não temos, no momento, a informação se as indústrias estão lançando um antibiótico novo;, afirma Isabela Rodrigues, enfermeira e coordenadora do serviço de controle de infecção do HUB.
;Quando o paciente está mais debilitado ele se torna mais suscetível a qualquer infecção. Nesse sentido, ele não consegue defesa. São três antibióticos usados para combatê-la, mesmo assim não garantem que ele (o doente) vai se curar. O que está chamando a atenção é a dificuldade de tratamento;, complementa Isabela. A KPC é multirresitente ao efeito de remédios. Ela produz uma enzima que inibe a ação dos antibióticos carbapenemênicos, muito usados contra infecções bacterianas.
Documento
Justamente essa dificuldade levou a Anvisa a convocar a reunião do dia 22 próximo. Dela, a agência do governo federal pretende editar um documento para orientar profissionais de saúde de todo o país. ;Desse encontro deverá sair um documento de alerta aos profissionais de saúde com orientações para o controle da bactéria;, adianta o gerente-geral do serviço de saúde da Anvisa, Heder Murari.
Além de ser difícil de ser combatida, a KPC requer exames laboratoriais minuciosos para ser diagnosticada ; apenas um estudo com material genético colhido do paciente é que pode confirmar sua presença. Ela se manifesta com sintomas de uma infecção normal, febre, dores na bexiga (se for o caso de uma infecção urinária), tosse (se for uma infecção respiratória).
;Recém-nascidos, pessoas com doenças de base (como diabete, problemas no coração, HIV, câncer) são mais suscetíveis à infecção da superbactéria;, alerta o médico Marcos Antonio Cyrillo, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). ;Em pessoas saudáveis o risco de ter qualquer infecção é muito pequeno;, esclarece a enfermeira Isabela Rodrigues.
Isolamento
Com poucas armas para a cura, a Secretaria de Saúde do DF tem focado na prevenção. A pasta criou um Comitê Gestor Central para monitorar e acompanhar a evolução do surto nos hospitais públicos e privados. Pacientes infectados e colonizados ; que têm a bactéria, mas não a infecção ; estão sendo mantidos em áreas isoladas. Como a contaminação se dá por meio do contato direto, os materiais hospitalares usados no trato dos pacientes infectados, como luvas, aventais e máscaras, são descartáveis.
Medidas simples de higiene também são fundamentais para evitar a propagação do micro-organismo, ;como instalar higienizadores de álcool em gel no leito dos pacientes. Assim como os profissionais de saúde, os visitantes precisam lavar a mão com água e sabão e usar álcool em gel sempre que entrar em contato com uma pessoa infectada;, ressalta Heder Murari, da Anvisa. Por enquanto, a bactéria está limitada ao ambiente hospitalar, garantem os técnicos da Secretaria de Saúde do DF e da Anvisa.
Um boletim com números atualizados sobre o surto de KPC no Distrito Federal deverá ser publicado amanhã. Apesar da gravidade das infecções, ninguém do órgão tem dado entrevista. A assessoria de comunicação limitou-se a informar ontem que, antes da divulgação da nova estatística, ninguém da secretaria falará sobre o assunto.
Faltam registros
O Distrito Federal é a Unidade da Federação com maior registros de ocorrências de pessoas infectadas pela KPC. Além das capital, há relatos de casos em outras grandes cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro e Recife. ;Mas não são dados oficiais. Isso tem a ver com a dificuldade de diagnosticar a bactéria;, afirma o gerente-geral do serviço de saúde da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Heder Murari.
Apesar do surto na capital da República, com 14 mortes confirmadas relacionadas à infecção do micro-organismo, Murari acredita que não há motivos para alarme. ;As orientações da Secretaria de Saúde estão dentro do preconizado pela Anvisa. Além disso, estamos fazendo um trabalho conjunto de retroalimentação de dados. O que não está sendo feito pelas coordenações de controle de infecções dos estados;, explica Murari. Ele, no entanto, reconhece a gravidade do problema. ;Em geral, a bactéria agravou o quadro principal de todos os pacientes infectados no DF.;
A bactéria vem de uma mutação genética e está presente em outros países como Estados Unidos e Itália. ;Não é um micro-organismo novo. Ele existe desde a década de 1990. De uns anos para cá, se fortaleceu e apareceu com mais frequência;, explica o diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) Marcos Antonio Cyrillo. ;Aqui no Brasil, por enquanto, o surto está restrito a Brasília;, alerta Murari.
