Cidades

Primeiras chuvas já causam estragos no DF

Luiz Calcagno
postado em 20/10/2010 08:00

O Distrito Federal mal aguentou as primeiras chuvas após a seca. Na última segunda-feira, a capital federal mergulhou no caos. Seis locais ficaram sem energia elétrica: Taguatinga Norte, Águas Claras, Colônia Agrícola Samambaia, Vicente Pires e as áreas rurais de Ceilândia e Braz-lândia. A água invadiu casas e derrubou muros no Park Way, em Taguatinga Norte e no Condomínio Mini Granja do Torto, na Granja do Torto. Na Rua 19 da Vila São José, em Vicente Pires, uma enxurrada que, segundo moradores, foi agravada por uma obra na parte mais elevada da Rua 4, abalou estruturas de residências e chegou até mesmo a entortar um poste de luz.

Ainda na Vila São José, em algumas casas, carros acabaram presos nas garagens após a enxurrada porque a via ficou intransitável. O local da obra se resume a uma erosão, montes de terra e manilhas espalhadas que populares atribuem a uma suposta praça que seria construída pela administração regional. O local ficou sem luz das 17h de segunda-feira até, pelo menos, as 13h de ontem. A lama também invadiu uma loja de materiais para construção próximo à Feira do Produtor e a água ficou acumulada nas ruas em diversos pontos da cidade.

Uma das casas afetadas foi a do comerciante Jaelson Silvio Santos, 28 anos. Ele mora à beira de um barranco de cerca de 2m de altura, perdeu parte do muro e o solo aparentemente está afundando. Jaelson contou que a água da chuva entrou pelo portão e ficou represada no muro. Quando a construção não aguentou mais, arrebentou levando, inclusive, a casinha do cachorro. O animal sobreviveu, mas está com as patas machucadas. Segundo ele, as enxurradas ficaram bem mais fortes após o início das obras, que já estão paradas há algumas semanas.

Jaelson passou a manhã arrumando os estragos, sem saber se seus trabalhos continuarão de pé após a próxima tempestade. "Eu estava no trabalho ontem quando um vizinho me ligou para avisar. Do outro lado da rua, a enxurrada está baixando um poste. Não sei como está a terra debaixo da minha casa. As bases são resistentes, o que me tranquiliza, mas se o solo afundar não sei como vai ser", preocupa-se. A mulher do comerciante, a bancária Conceição Cavalcante, 31, se revolta com a situação. "Isso é culpa da administração, que não fez a praça e não colocou esgoto. Pagamos IPTU e nem água encanada nós temos", se queixa.

Vizinho de Jaelson, o porteiro Cássio Honorato da Silva, 22, contou à reportagem que, antes das obras, parte da água da chuva descia para um córrego nas proximidades. "Eles tamparam a erosão que desviava a enxurrada, disseram que fariam uma praça, deixaram as manilhas no local, colocaram montes e montes de terra e os problemas começaram", relatou. Um amigo, o motoboy Nilton Modesto dos Santos, 40, perdeu toda a areia e a brita da obra de sua casa. "O monte de terra foi embora, mas desviou parte da enxurrada, o que foi bom, se não a água ia levar minha moto e meu carro", disse.

De acordo com o administrador de Vicente Pires, Márcio José de Melo, as obras não agravaram as enxurradas e os trabalhos começam esta semana. Segundo ele, o que acarretou os problemas foi a força da chuva. "Estamos tentando fazer uma obra lá porque tinha uma cratera grande. A água é da enxurrada. Temos problemas em vários pontos da cidade. Um exemplo é a grande quantidade de lama na Rua 3. Até o barro da EPTG, que não tem a ver com a cidade, desceu e causou transtorno aos moradores. Nós chamamos a Defesa Civil e estamos mapeando os riscos", amenizou.

Muro da vizinha
No Grande Colorado, a dona de casa Vanessa Naves, 34, se assustou quando, por volta das 20h, teve a área invadida por muita lama, água da chuva e o muro com cerca de 2m da vizinha, a professora Rosane Brito, 42. Vanessa perdeu a máquina de lavar, a secadora e vários brinquedos do filho. Ela conta que, na hora do incidente, sentiu o telhado da casa tremer. "Eu estava sozinha com meu filho. Precisei acalmá-lo. Foi terrível. Ele queria brincar aqui fora minutos antes. Ainda bem que não deixei", lembrou. "Quando cheguei e vi a destruição, fiquei sem palavras. Pensei no risco que meus vizinhos correram", completou Rosane.

Balanço positivo
Para o presidente da Companhia Energética de Brasília (CEB), Carlos Leal, apesar da imagem negativa que os blecautes trazem, o balanço de ocorrências na empresa ainda é positivo. Embora não tenha falado em números, Leal garantiu que, até agora, as interrupções no fornecimento estão aquém das do ano passado. "A chuva intensa na região oeste de Brasília, além de fortes ventos e descargas atmosféricas, causou os desligamentos. Além disso, tivemos 16 ocorrências com árvore na rede e cinco veículos que bateram em postes da CEB. Com essa conjunção, é impossível que não haja algum corte. Isso aconteceu em todas as grandes cidades do país", afirmou.

Leal disse ainda que a CEB vem tomando uma série de providências e investimentos para reduzir o número de cortes no fornecimento e o atendimento aos clientes. "Estabelecemos, desde o início das chuvas, um plano de ação que visa agilizar os atendimentos de emergência no sentido de solucionar com mais rapidez as quedas. Também investimos em redes novas, subestações e tecnologias novas. Quem teve algum equipamento elétrico ou eletrônico danificado em decorrência do corte no fornecimento, faça um pedido para a CEB, que vai investigar e fazer o ressarcimento. Em até 15 dias, o cliente vai saber se recebe ou não", justificou.

Os agentes da Defesa Civil passaram a terça-feira atendendo ocorrências relacionadas às chuvas. O órgão visitou Vicente Pires, Colônia Agrícola Samambaia e Taguatinga Norte. Procurado pelo Correio para esclarecer à população sobre quais foram os danos que as chuvas causaram no DF e o que os moradores podem fazer para se proteger de possíveis riscos, os oficiais se recusaram a falar com a reportagem, apesar das inúmeras ligações. A previsão do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) é de chuva, pelo menos, nos próximos três dias.

Mudança
A Colônia Agrícola Vicente Pires foi criada logo depois da inauguração de Brasília. As chácaras, com área mínima de dois hectares, eram destinadas à produção de legumes, verduras e hortaliças. A ideia era distribuir essa produção na cidade, para reduzir a dependência externa. Mas, nos últimos 20 anos, os lotes rurais foram fracionados em centenas de terrenos urbanos.

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