Guilherme Goulart
postado em 06/11/2010 08:00
Um erro de digitação provocou o calvário da piauiense Maria do Amparo Teixeira, 52 anos, na rede pública de saúde do Distrito Federal. O Hospital Regional da Asa Norte (Hran) admitiu ontem falha nos registros da mulher dada como morta em prontuário expedido pela instituição. Em nota divulgada à tarde, a diretoria reconheceu o problema e garantiu que já o corrigiu. ;Após apurar os fatos, constatou o equívoco da alta hospitalar por óbito de Maria Amparo Teixeira;, informou o documento. A nota esclarece ainda que o engano ocorreu no momento em que um servidor lançou os dados da alta hospitalar da paciente no sistema do Hran. O Correio apurou outro problema: o prontuário da liberação formal de Maria do Amparo após uma intervenção cirúrgica no local foi assinado por uma funcionária sem graduação em medicina. Ou seja: ela não estaria habilitada para oficializar a alta. Nenhum representante da diretoria do hospital nem o servidor envolvido na falha administrativa ou mesmo a funcionária que autorizou a alta quiseram dar entrevistas à reportagem.
Apesar de identificado o problema, o trauma provocado pela burocracia pública vai virar caso de Justiça. A doméstica aposentada processará o governo local por danos morais e materiais. A ação judicial em busca dos direitos de Maria do Amparo será encaminhada por meio da assessoria jurídica da Subsecretaria de Proteção às Vítimas de Violência (Pró-Vítima). ;Esse caso mostrou que é preciso tomar mais cuidado, pois uma falha dessas atrapalha demais a vida das pessoas;, afirmou a diretora executiva do Centro de Apoio Social do órgão assistencial, Maria Derminda da Silva Pereira.
Sem receita
Conforme o Correio publicou ontem com exclusividade, a moradora do Paranoá acabou envolvida em um drama que teve início em 23 de março deste ano. A mãe de três filhos passou por uma cirurgia na vesícula no Hran. O procedimento ocorreu com sucesso. A mulher ficou três dias internada e recebeu a liberação às 10h33 de 26 de março. Ao preencher o prontuário, no entanto, o empregado assinou o documento e escreveu ;alta com óbito;. Foi o suficiente para impedir Maria do Amparo de fazer consultas e exames e conseguir receitas de medicamentos.
A condição de morta diante das autoridades públicas interferiu no bem-estar da aposentada. Ela entrou em depressão ao não conseguir ser reconhecida como uma pessoa viva na rede pública de saúde. Para piorar, Maria do Amparo tem o organismo fragilizado. Precisa de cirurgias para a retirada de cistos no estômago, nos rins e no fígado. Sofre ainda de hérnia de disco. Os tratamentos para tudo isso ficaram emperrados por conta da falha no Hran. O desespero a fez tratar o caso como uma luta por ressurreição. A moradora do Paranoá encontrou ajuda na Pró-Vítima, órgão vinculado à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejus).
Ofício
Em setembro, Maria do Amparo conseguiu que uma servidora da Pró-Vítima a acompanhasse ao Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), onde a piauiense tentava atendimento médico. Foi essa funcionária que descobriu o erro no prontuário da paciente. Diante disso, a diretora Maria Derminda encaminhou um ofício para a direção do Hran em 18 de outubro ; em 30 de setembro, registrou ocorrência na 6; Delegacia de Polícia, no Paranoá. Ficou sem resposta até ontem, quando, por telefone, um servidor do Hran admitiu o problema e prometeu resolver a situação.
Para Maria do Amparo, a chance de solução do caso chega como um alívio. ;Estou muito feliz. Já chorei bastante, mas dessa vez de felicidade. Eu nunca quis prejudicar ninguém, mas também não quero ser prejudicada;, disse. Na próxima segunda-feira, a Pró-Vítima designará um servidor do órgão para acompanhar a aposentada em mais uma ida ao HBDF. Eles vão confirmar se a informação de óbito foi mesmo retirada do prontuário da piauiense. Se isso tiver ocorrer, Maria do Amparo estará livre para marcar consultas e cirurgias. Além de ter certeza de que está viva.
Solidariedade
A Subsecretaria de Proteção às Vítimas de Violência (Pró-Vítima) completou um ano de serviços à sociedade brasiliense em abril deste ano. Presta apoio psicológico, jurídico e social a vítimas e familiares de quem sofreu algum tipo de violência. Nesse período, foram contabilizados 955 atendimentos, 731 visitas domiciliares e 224 ações judiciais.
A NOTA NA ÍNTEGRA
Confira os esclarecimentos divulgados ontem à tarde pelo Hran:
;A Regional de Saúde da Asa Norte informa que, em 18 de outubro, foi notificada pela Diretoria Executiva do Centro de Apoio Social (Pró- Vítima) sobre o caso da paciente Maria do Amparo Teixeira e buscou esclarecimento.
Após apurar os fatos, constatou o equívoco da alta hospitalar por óbito de Maria Amparo Teixeira, lançado incorretamente por um servidor. Ciente dos fatos, a Direção Regional de Saúde da Asa Norte (DGSAN) imediatamente retificou o prontuário da paciente com as devidas correções.
Em 29 de outubro de 2010, a DGSAN encaminhou para a Pró-Vítima um ofício com esclarecimentos e informando a regularização.;
OPINIÃO DO INTERNAUTA
Leitores comentaram no site do Correio (www.correiobraziliense.com.br) a reportagem exclusiva sobre a história de Maria do Amparo Teixeira. Leia algumas opiniões:
Maxwilson Duarte
;Desrespeito, isso sim. Se fosse um filho do GDF, o caso já teria sido solucionado.;
Israel Alcântara
;Retrato da ineficiência do serviço público de saúde local.;
Sérgio Gonçalves
;Há coisas que, se a gente contar, ninguém acredita. Sugiro a dona Maria do Amparo contratar um bom advogado e pedir um polpudo ;danos morais; ao GDF.
Só assim erros como esse serão corrigidos mais rapidamente, sem criar mais transtornos ao cidadão de bem.;
André Rocha
;A diferença entre a senhora Maria do Amparo e os milhares de contribuintes que não conseguem atendimento na rede pública de saúde é o fato de os últimos ainda não terem seus atestados de óbito.;
Francisco Rocha
;A reportagem não cita a médica, não comenta se tentou ouvi-la. Não quiseram saber a versão dela para tal absurdo? E a direção do hospital, o que disse do ;novo; prontuário em branco que surgiu nos arquivos? É mesmo um descaso com a vida dos outros.;
Valdir de Castro
;Pois é, os hospitais públicos não atendem corretamente nem os ditos vivos ou fizeram isso para diminuir a fila de espera?;
Marcelo Gonzaga
;Se o sistema operacional utilizado pela Secretaria de Saúde do DF funcionasse, bastaria reverter a informação no prontuário. Não se sabe o que é pior: o servidor publico que marcou errado ou o sistema que não permite corrigir o erro.;
Adalberto Lima
;Mais uma falha de um servidor que deseja ter aumento de salário. Estamos de olho.;
Patrícia Monteiro
;É um absurdo! E por que não divulgam o nome do(a) profissional que cometeu esse erro? Será que corrigir é tão difícil assim? Será que o nome dela deixou de constar também nas contas de água, luz, IPTU, etc.? A situação é lamentável! Espero que ela consiga resolver esse problema o mais brevemente possível.;