O próximo governo precisará contar com todo o poder de articulação possível para lidar com a classe trabalhadora do Distrito Federal. O grau de comprometimento dos recursos públicos para 2011 dificultará a negociação sobre a pauta de reivindicações dos sindicatos, o que deverá gerar um clima de tensão entre os dois lados. Apesar disso, a equipe de transição promete desenvolver um diálogo permanente, mas, se as promessas de Agnelo Queiroz (PT) não saírem do papel, a pressão das entidades vai crescer. ;É óbvio que vai ter conflito, até porque os interesses nem sempre convergem, mas o governador eleito tem grande credibilidade entre as categorias;, diz a presidente local da Central Única dos Trabalhadores (CUT-DF), Rejane Pitanga.
Segundo a sindicalista, existem pendências antigas a serem resolvidas pelo governador eleito, como o plano de saúde dos servidores. Apesar da relação próxima entre os órgãos sindicais e o Partido dos Trabalhadores, Rejane ; que, aliás, é a primeira suplente de deputado distrital pelo PT de Agnelo ; explica que há autonomia na atuação de ambos. ;Sabemos que não vamos ter todas as demandas atendidas em um ou dois meses, mas a relação vai depender da forma como o governo vai conduzir as conversas com a classe;, diz. De acordo com o presidente regional do PT e ex-coordenador-geral do Sindicato dos Servidores do Judiciário (Sindjus), Roberto Policarpo, o Executivo criará uma mesa permanente para dialogar com os dirigentes, seguindo o exemplo do governo federal.
Para tanto, será escolhido um nome no governo encarregado das negociações. Policarpo explica que Agnelo não conseguirá atender todas as exigências e que a equipe de transição fará um diagnóstico para planejar as medidas prioritárias. ;Ninguém vai começar o ano discutindo aumento. O governo vai conversar abertamente com as categorias, que o apoiaram nas eleições. Mas sabemos que os conflitos vão acontecer, naturalmente, nos momentos de impasse;, avalia.
O maior receio dos petistas é de repetir as falhas ocorridas na administração de Cristovam Buarque (PDT) (veja Memória). ;A relação daquele governo com os movimentos sindicais foi ruim, com muitos confrontos, mas Agnelo saberá construir outro caminho;, diz o presidente do PT-DF. ;Aquele era um outro momento. Hoje, estamos em outro nível de maturidade;, comenta Rejane. Por sua vez, Cristovam recomenda cautela ao colega. ;Eu aconselho Agnelo a não começar nada cujos analistas financeiros digam que não será possível pagar;, ensina o senador reeleito.
Para o ex-secretário de Planejamento Ricardo Penna, o primeiro ano de governo será de muitas dificuldades nessa área. Ele destaca que o orçamento de 2011 está comprometido e não há folga para negociações. Além disso, existe uma série de leis aprovadas nos últimos anos que determinam o reajuste salarial, no próximo ano, de 31 categorias do serviço público. Isso sobrecarregará em R$ 300 milhões a folha salarial, um acréscimo de 5,4%.
A contratação de mil policiais militares e 400 professores, ainda neste ano, aumentará mais
R$ 200 milhões os gastos a partir de janeiro. Além disso, na opinião de Penna, as categorias custeadas com verbas do Fundo Constitucional do DF ; das áreas de segurança, saúde e educação ; deverão exigir reajuste correspondente ao crescimento do repasse federal, de 13%. ;As demandas são gigantescas para um orçamento apertado, e o governo não vai suportar a pressão;, diz o ex-secretário.
;Vamos à luta;
Washington Dourado, dirigente do Sindicato dos Professores (Sinpro-DF), destaca que a entidade manterá uma relação de independência em relação ao GDF. Entre as exigências do grupo para o próximo ano estão: isonomia salarial dos educadores com base na remuneração dos servidores de nível superior de outras categorias; plano de saúde; vale-refeição; e participação na formulação do projeto pedagógico. Para o sindicalista, a expectativa nas negociações é positiva. ;Agnelo é aliado do governo federal, formou uma bancada forte na Câmara Legislativa e tem condições de criar uma relação muito melhor do que os governos anteriores. Mas, se ele não atender nossas reivindicações, vamos à luta e entraremos em greve, se for preciso;, diz Dourado.
No penúltimo dia de campanha no segundo turno, Agnelo se reuniu com servidores públicos federais e distritais no Teatro dos Bancários. O petista prometeu convocar os concursados para diversas áreas do governo, realizar novas seleções e discutir com as categorias políticas específicas nas áreas de habitação, previdência e saúde. O então candidato também se comprometeu a valorizar a classe, com reajustes de salário e melhoria das condições de trabalho. A fim de minimizar os problemas, o grupo de gestão pública da equipe de transição dará início às avaliações sobre as demandas. O coordenador é José Walter, nome indicado pelo PMDB. A partir de 1; de janeiro, o governo terá um negociador oficial.
Memória
Disputa com professores
Cristovam Buarque (então no PT) assumiu o Governo do Distrito Federal em 1995 e manteve a promessa da gestão anterior de pagar o vale-refeição aos professores da Fundação Educacional. ;Quando assumi, técnicos me disseram que não era possível pagar esse vale. Paguei durante oito meses e acabou o dinheiro. Eu hoje sou conhecido como o governador que cortou o vale;, diz Cristovam. Esse foi um dos pontos que abalaram a relação com o Sindicato dos Professores (Sinpro).
Em abril de 1996, os professores decidiram iniciar uma greve que durou 45 dias. Entre as reivindicações estava o reajuste salarial de 46,19%, referente às perdas acumuladas no ano anterior, e o pagamento do tíquete-alimentação. Dois anos depois, quando Cristovam entrava na corrida pela reeleição, a classe fez nova paralisação com uma pauta de 52 exigências. A greve durou quase dois meses e foi uma das mais longas da história. Uma das líderes dos professores era a atual presidente da CUT-DF, Rejane Pitanga (PT).
As negociações não deram resultado, Cristovam perdeu o apoio de uma das suas principais bases e não conseguiu vencer o concorrente, Joaquim Roriz (então no PMDB). O peemedebista prometeu um reajuste de 28% aos educadores, não cumpriu a promessa e também enfrentou diversas greves. Na avaliação de Cristovam, o embate com os professores foi um dos motivos da derrota eleitoral.
Reajustes
Veja compromissos feitos nos últimos dois anos pelo GDF
que serão pagos pela próxima gestão:
; Em 30 de março de 2010, foi aprovado, na Câmara Legislativa, o Projeto de Lei n; 1.550. A medida garantiu reajuste, gratificações e redução de jornada de trabalho a 24 categorias do serviço público distrital. Os aumentos entre 7% e 15% foram escalonados. O impacto financeiro na folha de pagamentos de 2011 é de R$ 204 milhões.
; Em 24 de dezembro de 2009, foi sancionado o projeto de lei que concedeu aumento de 35% a 3,2 mil servidores do GDF. Os beneficiados são profissionais da carreira de assistência social, como pedagogos, psicólogos e educadores socioeducativos, além de 670 aposentados e 200 pensionistas. O último aumento, de 12,5%, ocorrerá em agosto de 2011. Ao total, o reajuste representará o incremento de
R$ 55,7 milhões da folha.
; Em 17 de março de 2010, a Câmara Legislativa aprovou o aumento linear de 10,04% no salário dos professores da rede pública de ensino. O impacto em 2011 na folha salarial do DF será de
R$ 42,1 milhões.