postado em 15/11/2010 08:28
O ano de 2010 está no fim e, mais uma vez, a história se repete: milhares de brasilienses voltaram a ter problemas com instituições financeiras e com operadoras de telefonia fixa e móvel. No Distrito Federal, os dois setores reproduziram o cenário já verificado em 2009. Eles ficaram novamente no ranking dos três principais motivos de reclamações no Instituto de Defesa do Consumidor do DF (Procon). A outra principal razão de dor de cabeça para os brasilienses nos últimos dois anos foram as compras no varejo (veja quadro).Uma particularidade do balanço deste ano é que a telefonia perdeu o posto de segundo lugar, ocupado em 2009, e deu lugar ao setor varejista. O Procon-DF registrou um recuo de 3,2% na quantidade de atendimentos referentes às empresas de telefonia. Ainda assim, o setor ocupa a terceira posição no
ranking dos motivos de reclamações.
Esses dois segmentos estão entre os mais problemáticos da década. Tanto especialistas quanto consumidores chamam a atenção para a necessidade de ações incisivas sobre esses setores. As razões que levaram os consumidores do DF a se queixarem da telefonia e dos serviços financeiros em 2010 são as mesmas registradas em anos anteriores. No caso das instituições financeiras, os aborrecimentos estão relacionados, principalmente, ao desrespeito à lei da fila ; que determina espera máxima de 20 minutos em bancos nos dias comuns e de 30 minutos para dias de pagamentos de salário. Outro motivo de constantes reclamações é o envio de cartões de crédito sem que o cliente tenha solicitado. Quando o assunto é telefonia, os problemas mais recorrentes são as cobranças indevidas na fatura, como serviços não solicitados, multas e a dificuldade na rescisão de contratos.
Em 2010, houve vários atendimentos no DF por conta da discordância dos clientes quanto aos juros cobrados pelas administradoras de cartão, nos casos de utilização do crédito rotativo. Nessa modalidade, o titular faz o pagamento do valor mínimo discriminado na fatura e, no mês seguinte, tem que arcar com a diferença acrescida de tarifas, que variam de 11% a 15%. O diretor-geral do Procon-DF, Oswaldo Morais, afirma que, em situação desse tipo, cabe ao consumidor estar atento às altas taxas de juros previstas para a quitação do mínimo, que nem sempre são expressas claramente em contrato.
O diretor da entidade lembra que, na semana passada, a Associação Brasileira das Empresas de Cartão de Crédito e o Ministério da Justiça assinaram um acordo em que a primeira se comprometia a explicitar nos contratos os riscos e consequências do crédito rotativo.Mas a regra passa a valer somente em maio de 2011. Além de explicar melhor como funciona o pagamento mínimo, a Abecs assumiu o compromisso de redigir contratos mais claros e de interromper o envio de cartões sem solicitação.
Mudanças
Para Oswaldo Morais, os segmentos dos serviços financeiros devem ser alvo, em breve, da mesma ofensiva a que foi submetido em 2010 o setor de telefonia. Ele relata que, obedecendo a uma orientação do Departamento de Proteção ao Direito do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça, o Procon-DF chamou diversas vezes as principais empresas gestoras do sistema para negociar. ;Argumentamos que elas eram as campeãs de insatisfação e mostramos quais eram os principais problemas;, conta Morais.
Ele acredita que as negociações devem ser estendidas a outros segmentos e prevê ainda um amadurecimento progressivo no relacionamento entre fornecedores e clientes no Brasil. ;O Código de Defesa do Consumidor completou duas décadas de existência este ano e muita coisa já mudou. A tendência é que continue mudando para melhor;, diz ele, que atribui a redução na quantidade de reclamações contra telefônicas à rigidez na ação contra o setor.
A advogada Maria Inês Dolci, que coordena a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (ProTeste), não tem uma visão tão otimista. Para ela, a recorrência das reclamações referentes aos mesmos setores no país todo demonstra que as políticas de regulação e fiscalização dessas atividades têm sido insuficientes. ;O que foi feito até agora ainda não surtiu efeitos. São os mesmos problemas sempre e temos um grau de solução muito baixo. A questão tem sido tratada de maneira muito pontual em lugar de ser atacada de frente;, explica Maria Inês. ;Os órgãos reguladores têm que começar a adotar posições bastante firmes para que o consumidor não saia prejudicado;, acrescenta a especialista.
Já o varejo foi alvo de reclamações principalmente por questões relativas a defeitos em produtos e em dificuldades na efetuação de troca e ressarcimento. Oswaldo Morais frisa que, segundo o código, o cliente que adquirir artigo com defeito tem direito a troca imediata. Já quem comprou algo em perfeitas condições, mas se arrependeu do negócio depende da gentileza do vendedor para obter a substituição.
A norma só não se aplica quando a aquisição foi feita via internet ou por qualquer outro meio a distância. Um exemplo são os catálogos e revistas de compras, que trazem fotografias do estoque. ;Se o cliente comprou sem ver o produto, ele tem um prazo de sete dias para arrependimento. Deve ter direito a troca ou ser reembolsado. É obrigatório, está previsto no código;, informa Oswaldo Morais, do Procon.
Dificuldade para fazer acordos
No balcão de atendimento do Procon-DF, que funciona no Setor Comercial Sul, as reclamações contra serviços de empresas financeiras e de telefonia são diárias. Não é difícil encontrar quem tenha sido lesado por um dos dois segmentos. Na última semana, a publicitária Márcia Ungarelli, 53 anos, travava uma batalha por acreditar ter sido cobrada indevidamente por uma operadora telefônica. Já a consultora de etiqueta Sophia Rossi, 52, foi vítima de um erro cometido pela operadora de seu cartão de crédito.
Márcia teve dificuldades para negociar com a operadora. ;Eu moro em Pirenópolis (GO), onde não tem Procon. A operadora me vendeu um pacote no valor de R$ 70 mensais e informou que o valor era promocional por dois meses. Acontece que, quando terminou a promoção, a conta saltou para R$ 260. Eu não havia sido informada de que haveria uma diferença tão alta;, relata Márcia, que, por meio da intervenção de uma atendente do Procon de Brasília, conseguiu que a empresa a dispensasse do pagamento do valor maior. ;Agora, vou decidir por um plano mais barato;, contou, após ter resolvido o problema.
Sophia não teve a sorte de solucionar sua dificuldade em apenas um dia. A consultora de etiqueta recebeu pelos Correios uma proposta de parcelamento do saldo devedor de seu cartão de crédito. Como não desejava fazer a quitação, ignorou a correspondência. Acontece que o valor total que ela devia pagar naquele mês era próximo do custo das parcelas oferecidas pela operadora. A empresa computou em seu sistema que a cliente havia aderido à opção de dividir o pagamento do débito, arcando com juros. ;Estamos tentando consertar, mas ainda não chegamos a um entendimento. Acho que vou ter dor de cabeça por um bom tempo;, lamentou.