Sem tirar os olhos do espelho, as alunas repetem cada movimento feito pela professora. Ao som de hits antigos, como Gatinha manhosa, de Erasmo Carlos, e Pobre menina, de Leno e Lilian, elas se soltam. Pulam, requebram. Tudo sem borrar a maquiagem ou desarrumar os cabelos, como verdadeiras divas. Por trás de tanta disposição e animação, décadas de vidas bem vividas. Quem vê não pensa que naquela sala de dança estão mulheres entre 60 e 70 anos. Elas se reúnem três vezes por semana para mexer o corpo. Perdem calorias e ganham energia para viver melhor. Do convívio regular, nasceu a amizade. Além de cuidar do corpo, os encontros semanais ajudaram a criar laços afetivos e sociais. Nada de ficar em casa vendo o tempo passar. Agora, elas só querem saber de dançar.
O grupo ganhou um nome à altura das alunas: Divas Dance. Na academia VIP Training, onde ensaiam, são tratadas como celebridades. Quando chegam, cumprimentam todo mundo. Ganham até beijinhos dos instrutores. O entrosamento e a dedicação das meninas já renderam duas apresentações de dança ; uma na própria academia, para alunos e familiares, e outra aberta à comunidade na Administração do Lago Sul. ;Com os filhos já criados, as mulheres da nossa faixa etária tendem a se isolar e ver a vida passar. Aqui, a gente se diverte. Quem dessa idade não dá gargalhada quando se vê rebolando em frente ao espelho?;, diverte-se Maria José Janote, 62 anos.
Liderança
Assim como em qualquer turma, o grupo Divas Dance tem uma líder. Maria José é apontada pelas colegas, sem exceção, como a mais animada de todas. Durante os 60 minutos de aula, ela canta e dança sem parar. Duas das 15 alunas passaram a ser divas por conta da ;intimação; da líder. Outras três amigas já prometeram reforçar a equipe em janeiro próximo. ;Tudo que é bom a gente tem que dividir. Além da atividade física, direcionada para as nossas limitações, tem o prazer de encontrar a turma. É muito bom;, explica.
Além de animar as aulas, é Maria José quem promove as atividades sociais do grupo. A próxima será um amigo oculto nada convencional. O evento será solidário. A pessoa sorteada ganhará orações e vibrações positivas da diva oculta. O presente será para instituições de caridade, que receberão de cada dançarina uma cesta básica. Ela, assim como as demais colegas, tem filhos e netos. ;Meu marido fala que eu tenho que trocar a minha pilha; eu digo que ele está fora de moda, agora é chip;, diz.
O grupo também conta com uma mascote. Vania Lamounier, 49 anos, é a única aluna que ainda não bateu a casa dos 60. ;É um estímulo ver essas mulheres de idade mais avançada tão bem dispostas, praticando exercícios físicos. Participar das aulas tem sido uma experiência muito interessante para mim;, afirma. ;São todas tão alegres, tão agradáveis, que o convívio se torna essencial. Quem está com depressão por algum motivo, muda quando chega aqui;, relata Lilian Cardoso, 71 anos.
Apesar da idade avançada, Lilian esbanja disposição. Ela começou a praticar atividades físicas por recomendação médica depois de enfrentar um câncer de mama. Passou a fazer aulas de dança há seis meses, estimulada pela amiga Maria José. Agora, não quer mais parar de se exercitar. Antes de dançar e colocar a conversa em dia com as amigas, Lilian caminha 30 minutos na esteira e faz musculação. ;Olha, eu nunca tinha feito exercício na minha vida. Não consigo mais parar, saio daqui muito mais disposta.;
Disposição
Durante a aula, as divas mostram que levam a dança a sério. Elas acompanham passo a passo a coreografia de cada música. Ainda arruma fôlego para cantar. Mas é só a professora dar um intervalo para beber água que a falação rola solta. ;Às vezes, eu estou no escritório e escuto alguém gritar: ;Gente, deixa a tia falar;;, conta a professora de educação física Helena Alonso, 56 anos. Ela é mãe da ;tia Roberta;, a grande incentivadora das Divas. Helena leciona para as ;meninas;, enquanto a filha está viajando. ;A ideia é dar uma aula de dança com músicas que elas gostam e ao mesmo tempo trabalhar com as partes do corpo. Elas fazem agachamento, exercitam os braços, tudo com prazer. Muitas pessoas dessa faixa etária estão sozinhas e acabam se encontrando aqui.;
Depois de muita agitação e suor, elas fazem aula de relaxamento com a professora Maria Thereza Lima, 52 anos. ;Já me matriculei em várias academias e nunca tinha parado em uma. Esta aula, para mim, traduz tudo o que gosto em termo de arte. Saio daqui muito alegre, realmente transbordando de alegria ; alegria essa que me acompanha durante todo o dia;, disse a cantora Nádia Gaerther, 65 anos.
Para a decoradora Marilda Porto, 70 anos, a endorfina liberada durante as aulas traz ânimo para acompanhar o ritmo de vida dos filhos e dos netos. ;Passada a fase de encaminhar a família, chegou a hora de cuidar de mim;, reforça. A diva Vilma Moraes, 72, tem conciliado os afazeres domésticos com as atividades na academia. ;Estou sem empregada, fico cansada, mas não deixo de vir.;
Fim da aula. Uma aluna aproveita para comentar: ;As velhinhas estão mortas;. Outra responde de pronto: ;Cadê velhinha? Não estou vendo nenhuma aqui;. A reportagem também não viu.