Cidades

Artesã de São Sebastião cria grupo que recolhe pneus velhos faz pufes

A ideia está sendo muito bem recebida não só pela comunidade, como por muita gente que gostou da solução criativa. Mas há outro diferencial: dessa forma, elas também ajudam a combater os focos da dengue

postado em 13/12/2010 07:51
Hozana (na foto maior e à esquerda), Lúcia e Maria: esforços concentrados resultaram na Casa de Cultura e Educação PermanenteCriatividade e disposição não faltam para a artesã Hozana Alves do Nascimento, 38 anos. A moradora de São Sebastião consegue ver utilidade em coisas desprezadas pela maioria das pessoas. Em seu ateliê improvisado, produtos que iriam para o lixo ganham cor e finalidade. A última ideia da artista, além de ser ecológica, tem ajudado a incrementar a renda de mulheres da região. Preocupada com os casos de dengue na cidade, ela decidiu recolher os pneus velhos das ruas, que servem de criadouros para o mosquito Aedes aegypti, e transformá-los em pufes. Em três meses, Hozana e as companheiras de trabalho produziram mais de 30 peças. E a demanda tem aumentado a cada dia.

Tudo começou quando a artesã assistiu a um programa de TV que ensinou como fazer os pufes de pneu. O processo de transformação é simples. ;Só requer um pouco de força nos braços;, avisa a expertise. O objeto de borracha é embrulhado com quatro pedaços de malha e logo ganha cara de assento. Em menos de 10 minutos é possível conferir o resultado final: um pufe colorido e confortável. ;Nós queremos conscientizar as pessoas da importância de não deixar os pneus jogados e mostrar que temos uma solução para eles. A cidade de São Sebastião já foi um grande foco da doença. Queremos manter o mosquito longe;, afirma Hozana.

Também artesã, Maria Alves de Carvalho, 47 anos, irmã de Hozana, ajuda no trabalho e elogia a iniciativa. ;Tirar os pneus das ruas foi uma ideia maravilhosa. A dengue é uma doença que eu não desejo para meu pior inimigo, que eu não tenho;, conta, com a alegria de quem está curada. Em setembro passado, Maria contraiu a doença. Os sintomas surgiram durante uma viagem que ela fez ao Ceará, em vista à família. ;Passei duas semanas com febre, dor de cabeça e enjoo. Tive que tomar muito líquido e ficar de repouso. Foi terrível.;

A ideia está sendo muito bem recebida não só pela comunidade, como por muita gente que gostou da solução criativa. Mas há outro diferencial: dessa forma, elas também ajudam a combater os focos da dengueAlém de Hozana e Maria, outras seis artesãs participam do trabalho de transformação de produtos. Em 2005, as mulheres se juntaram para criar a Casa de Cultura e Educação Permanente da cidade. O objetivo inicial da organização não governamental (ONG) era dar aulas de reforço para crianças carentes da região. ;O trabalho foi ganhando dimensão, mas não demos mais conta de pagar o aluguel do imóvel;, explica Hozana. As contas de água e luz também eram rateadas entre o grupo.

A loja onde hoje funciona o ateliê é emprestada de um comerciante local. ;O espaço aqui é limitado para desenvolver as atividades sociais. Então, resolvemos concentrar os esforços no artesanato para juntar recursos e complementar a renda. Neste ano, vamos apresentar nossos projetos para conseguir apoio e retomar a atividade com as crianças;, destaca.

Doações
Todo o material usado pelas mulheres de São Sebastião é doado. Vizinhos e comerciantes ajudam a reforçar o estoque do ateliê. Doam vidros, potes de leite, latas de tinta, entre outros objetos que iriam para o lixo. Nas mãos das artesãs, tudo vira bem de consumo. Prendedores velhos se transformam em ímãs de geladeira, pedaços de cano de PVC e rolo de fita-crepe em pulseiras coloridas, e assim vão surgindo as criações. Mas o principal artigo está em falta. ;Não estamos mais encontrando pneus pelas ruas. Passamos a pedir nas borracharias da cidade. Mas agora, nem lá conseguimos mais. Esses dias, percorremos 10, mas sem sucesso;, lamenta Hozana.

Em contrapartida, a procura por pufes está de vento em popa. Cada unidade é vendida a R$15. As últimas 10 peças foram levadas por uma única cliente. ;Fiquei sabendo da ideia e vim conhecer. Testei e achei os pufes bonitos e confortáveis. Esse trabalho de reaproveitar um produto que estava poluindo a natureza é maravilhoso;, elogia a fiscal de limpeza pública do GDF Sueli Brandão, 39 anos. As peças adquiridas por ela vão mobiliar outra ONG: o Instituto de Artes e Cultura de São Sebastião, onde Sueli é voluntária. A instituição dá aulas de música e dança para 42 adolescentes da comunidade.

Além de ser uma fonte de renda, o artesanato é para essa equipe uma atividade de lazer. ;A gente se distrai, fica inventando, criando. Quando vê, já está pronto. Essa ideia do pneu tem sido muito elogiada. As pessoas chegam aqui e perguntam do que o pufe é feito, não acreditam que é de pneu;, relata Lúcia Souza Dias, 47 anos. Autodidata, ela começou a criar com 18 anos, quando ainda morava em Pedra Branca, cidade a menos de duas horas de Salvador (BA). ;Nunca fiz curso, sempre usei a intuição.;

A adolescente Ingrid Louize Nascimento, 14 anos, sobrinha de Hozana, segue os passos das mulheres mais experientes e os exemplos de família. Assim que termina a aula, a jovem, que cursa a 7; série, vai ao ateliê para ajudar as artesãs. ;Desde pequena vejo minha mãe e minha tia fazendo atividades manuais. Com o artesanato, aprendi a respeitar mais a natureza, compromisso que muitos colegas de escola não têm. Pelo contrário, alguns jogam lixo no chão sem se preocupar com o meio ambiente. Já nós fazemos ao contrário;, afirma a jovem. Fica a lição.

Transmissor
Tem o nome popular de mosquito da dengue, pois é o vetor da doença. O inseto é adaptado a zonas urbanas e precisa de uma pequena quantidade de água para se reproduzir. Por isso, sua proliferação se dá especialmente na época de chuva. Seus ovos são bastante resistentes, podendo sobreviver vários meses até a chegada da água, que propicia a incubação.

PASSO A PASSO

Material:
Pneu aro 14
; 4 pedaços de malha (de preferência com helanca) de 4m de comprimento e 25cm de largura

Como fazer:

; Cada parte de malha embrulha 1/4 do pneu

; Ao embrulhar, estique bem o tecido

; Cubra um lado do pneu e dê dois nós no tecido

; O laço precisa ser forte para não correr o risco de desatar

; Repita o procedimento com os três pedaços restantes, cobrindo as partes do pneu ainda visíveis

CONHEÇA
Interessados em colaborar nesse trabalho podem ligar para Hozana: 9124-9895. Ela também está disponível para esclarecer dúvidas sobre a forma de fazer pufes.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação