Luiz Calcagno
postado em 14/12/2010 08:00
A combinação entre sol e chuva, além de 17 dias de greve dos servidores da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap), deixou o Distrito Federal coberto pelo mato. A vegetação tomou conta de todas as regiões administrativas e, mesmo sete dias após o fim da paralisação dos funcionários, os candangos ainda se incomodam com o matagal. Em alguns pontos, a grama alta virou depósito de entulhos. A visibilidade dos motoristas também diminuiu em retornos e balões de diversas vias do DF. No Plano Piloto, passagens subterrâneas nos Eixos Norte e Sul ficaram cercadas pela vegetação. Em parte dos casos, o problema gera insegurança.
Motoristas que entram no Parque da Cidade pelo acesso das quadras 910/11 Sul, por exemplo, não conseguem ver os carros que seguem na preferencial, porque o mato é alto à esquerda da via. O risco de acidentes é grande. No mesmo local, à direita, a companhia fez a poda. A estudante Agrisandra Almeida, 26 anos, passou pelo local e disse que precisa dirigir com o dobro de cuidado, porque não consegue ver os carros na pista. ;Quem tem uma caminhonete talvez não passe por isso. Temos sempre que dirigir com cuidado, mas ninguém precisa de uma dificuldade a mais;, reclamou.
O instrutor de direção Paulo Henrique Gomes, morador da Colônia Agrícola Samambaia, também se queixou dos riscos de acidente. Ele contou que, por causa da profissão, visita diversas cidades e constata: em todas elas o mato na beirada das vias prejudica a visibilidade de motoristas. ;Toda a região foi tomada pelo mato. Principalmente nos balões você não consegue ver quem vai entrar. Boa parte das entradas do Parque da Cidade estão assim. Ontem estive no Setor de Indústrias Gráficas do Núcleo Bandeirante e passei pelo mesmo problema;, contou.
Nas áreas verdes das entrequadras das quadras 700, na W3 Sul, mato e entulhos intimidam quem passa pelo local. A doméstica Priscila Coelho, 18 anos, moradora de São Sebastião, trabalha na 711 Sul e contou para a reportagem que, no fim do dia, não tem coragem de ir para a parada sozinha. ;É um lugar cheio de árvores. Com o mato alto, a área verde vira esconderijo para bandidos. Eu fico com medo de ter alguém ou de ter um bicho. Todas as cidades merecem uma atenção maior do governo, mas acho que pelo menos o Plano Piloto deveria ser bem cuidado;, disse.
Na 107 Norte, as áreas verdes entre os prédios também ficaram tomadas pelo mato. Moradores reclamam de ratos nas ruas bem como da proliferação de baratas. O administrador Sérgio Leandro Araújo, 34, disse estar indignado com o que chamou de ;descaso;. ;Se está assim no Plano, que é a capital do Brasil, imaginem nas outras cidades. O número de ratos na quadra cresceu com esse matagal. O parquinho das crianças está inutilizado. Nós pagamos impostos para viver bem;, protestou.
Esforço
Quem depende das passagens subterrâneas do Eixão também fica com medo. Marcone Silva, 32 anos, morador de Planaltina, passa semanalmente pelo atalho da 215 Norte e lembra que, quando não está no corredor escuro, está cercado de vegetação. ;É um descaso. É final de governo e a situação é terrível. Nós pagamos impostos para nada. Acho que pelo menos o Plano Piloto deveria estar mais bem cuidado;, observou. A doméstica Fernanda Augusta Silva, de Valparaíso (GO), concorda: ;Passo todo dia por aqui. Tenho medo. O túnel já é perigoso e com mato, fica ainda pior;.
Procurada pelo Correio, a Novacap se manifestou por meio da assessoria de imprensa. Segundo o órgão, o GDF concentra esforços para colocar o DF em ordem no menor tempo possível. A Operação Cidade Limpa destacou cerca de mil trabalhadores que envolvem, além da companhia, o Serviço de Limpeza Urbana (SLU) e a Defesa Civil, para que a poda de mato e árvores esteja concluída até o Natal.
SERVIÇO SUSPENSO
A greve dos servidores da Novacap foi a mais longa dos últimos anos e terminou no último dia 7. Os servidores cruzaram os braços em 22 de novembro. Cerca de 90% dos servidores aderiram à greve e apenas os serviços emergenciais tiveram continuidade. Serviços como tapar buracos, desentupir bocas de lobo e podar mato e árvores ficaram totalmente prejudicados.
PALAVRA DE ESPECIALISTA
Proximidade com insetos
;Com o crescimento do mato, cresce o número de abrigos de animais e insetos que geralmente vivem escondidos, como ratos e baratas. O risco é de animais se esconderem ali, sentindo-se protegidos, e a população conviver com eles. Além das baratas, os besouros se proliferam. A situação é pior em locais muito próximos à mata e ao cerrado, onde se escondem, por exemplo, cobras. No Plano Piloto, que está longe da vegetação natural, não existe esse perigo. A proliferação de doenças transmitidas por roedores também é um risco, mas acredito que a quantidade de mato não é suficiente para esse tipo de ocorrência. Outro perigo é que o mato alto geralmente acumula lixo, vidros, recipientes e, nesse caso, com o aumento de insetos, pode crescer o número de mosquitos da dengue, por exemplo. A única saída é aparar o mato e mantê-lo baixo, para que animais e insetos fiquem mais longe da população.
Ivone Rezende Diniz é professora do Departamento de Zoologia da Universidade de Brasília (UnB)
[VIDEO1]