Helena Mader
postado em 19/12/2010 08:29
As divergências sobre a cobrança de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) em condomínios irregulares ainda se arrastam na Justiça, cinco anos depois do início da emissão dos boletos, e causam prejuízos milionários aos cofres públicos. Muitos moradores desses parcelamentos alegam que não devem pagar o tributo porque não têm a escritura dos imóveis. O argumento é rechaçado pela Secretaria de Fazenda que, desde 2006, manda carnês de imposto a cerca de 110 mil imóveis em condomínios. Este ano, a inadimplência média dos contribuintes de parcelamentos irregulares foi de 65%. Como a estimativa de arrecadação nessas áreas é de R$ 59,8 milhões, a falta de pagamento causa um prejuízo anual de R$ 38 milhões ao governo. O rombo acumulado nos últimos cinco anos pode chegar a mais de R$ 190 milhões.
A falta de consenso na Justiça sobre o assunto é um estímulo para os inadimplentes. Desde 2005, quando o governo anunciou que cobraria o imposto dos condomínios, vários moradores e associações começaram a recorrer ao Judiciário contra a medida. As dezenas de decisões sobre o assunto foram divergentes. Alguns magistrados acataram os argumentos da comunidade, que se recusa a pagar o tributo antes do fim do processo de regularização. Outros juízes e desembargadores deram ganho de causa ao GDF, defendendo que os moradores desses parcelamentos têm que pagar o IPTU como qualquer cidadão proprietário de imóvel.
A origem da confusão em torno da cobrança são as diferentes interpretações do Código Tributário Nacional. A legislação estabelece como fato gerador do IPTU "a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel". A lei determina ainda que o imposto só pode ser cobrado em áreas onde existam pelo menos dois tipos de benfeitorias realizadas pelo poder público, como redes de abastecimento de água e esgoto, iluminação pública, escola ou posto de saúde.
Alegações
Os argumentos dos condomínios para entrar na Justiça contra o IPTU são vários. A primeira alegação foi de que o GDF não deveria exigir o tributo antes da regularização definitiva das terras, com a consequente entrega das escrituras. Eles afirmam não ter a posse nem a propriedade dos terrenos e, com base nisso, defendem que não devem pagar o imposto. "Além disso, toda a infraestrutura que existe nos condomínios fomos nós que fizemos. O Poder Público não gastou um centavo para construir os sistemas de água, esgoto ou iluminação", exemplifica a presidente da União dos Condomínios Horizontais, Júnia Bittencourt.
Mas o governo rebate essas alegações. O GDF argumenta que os ocupantes de lotes irregulares usufruem da infraestrutura pública de toda a cidade, como as vias pavimentadas, os hospitais e as escolas. Por isso, devem contribuir para os cofres públicos, como todos os cidadãos. O secretário-adjunto de Fazenda, Adriano Sanches, garante que os inadimplentes serão inscritos na dívida ativa e afirma que todos os ocupantes de imóveis urbanos devem pagar o tributo. "Se eles têm a posse ou o domínio útil, não importa se a terra é irregular, é preciso pagar o IPTU como todos", defende Adriano Sanches.
No condomínio Vivendas Bela Vista, no Setor Grande Colorado, cerca de 70% dos moradores se recusam a quitar o tributo desde 2006. Eles não têm nenhuma decisão judicial que ampare a falta de pagamento, mas a maioria discorda da cobrança e se recusa a colocar as contas em dia com a Secretaria de Fazenda. A comunidade argumenta que ainda não há consenso do Judiciário sobre o IPTU em terras da União. O síndico do Bela Vista, Vilson Silva Farias, é um exemplo disso. Ele nunca pagou os boletos e recebeu uma carta de inscrição na dívida ativa este ano. Os impostos devidos nos últimos três anos somam R$ 10 mil. "Essa enxurrada de cobranças começou agora. Já contatamos a nossa advogada para saber como vamos reagir a isso", reclama Vilson. "Não é correto cobrar antes da regularização. Já pagamos taxa de ocupação à União", acrescenta.
Erro no carnê
Na maioria das ações na Justiça em que os condôminos questionavam a realização da cobrança antes da regularização, o Judiciário não acolheu esse argumento. Também houve ações contra a emissão de boletos em nome do condomínio. Isso aconteceu quando o governo não conseguia identificar o ocupante do lote.
Em 2005, o GDF contratou uma empresa para fazer um levantamento de quantas casas havia em cada parcelamento irregular, a metragem de cada uma delas e os nomes de seus ocupantes. Como boa parte do trabalho foi feita por meio de fotografias aéreas e como muitos síndicos barravam a entrada dos técnicos, o cadastro do governo ficou defasado e sem informações sobre os reais compradores dos lotes. Isso levou a Secretaria de Fazenda a emitir carnês em nome do condomínio.
Em vários parcelamentos com esse problema, os moradores conseguiram barrar a cobrança. Casos chegaram até o Superior Tribunal de Justiça, que manteve o entendimento do Tribunal de Justiça de proibir que a Secretaria de Fazenda mandasse boletos com o nome do condomínio. Outras ações ainda tramitam. O grande problema é que, em caso de falta de pagamento, o número do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) da associação de moradores é incluído na dívida ativa.
Em Vicente Pires, o GDF tentou negociar com os moradores para tentar reduzir a inadimplência, que superava 50%. O então governador José Roberto Arruda se comprometeu com a Associação de Moradores da região a investir todo o dinheiro arrecadado com a venda dos lotes na urbanização da cidade. Mas, em contrapartida, pediu que a comunidade pagasse o IPTU. O governo começará a receber o dinheiro referente aos imóveis depois de um acordo com a União.
O diretor da associação, Glênio Silva, explica que a entidade sempre orientou os moradores da área a não pagarem o IPTU. "Não é correto fazer essa cobrança se não temos nenhuma contrapartida. As ruas estão esburacadas, não há nenhuma obra de infraestrutura", justifica Glênio. Ele acredita que quase 70% dos moradores da região até hoje não pagam o IPTU.