A Faculdade da Terra de Brasília (FTB) encerra 2010 afundada numa crise que parece longe do fim. O último episódio de um ano cheio de turbulências para a instituição ocorreu no último dia 14, quando todos os 104 professores foram demitidos sem comunicação prévia. Até agora, nenhum recebeu os direitos trabalhistas. A direção da FTB alegou que a dispensa em massa atendeu a uma orientação do Ministério da Educação (MEC), que teria sugerido a contratação de docentes mais qualificados, mas o órgão federal negou qualquer ingerência na decisão.
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As demissões surpreenderam os servidores, que esperavam mudanças na postura da direção depois das sucessivas crises enfrentadas este ano, como denúncias de venda de diplomas falsificados, matrículas ilegais de estudantes e trocas de comando (leia Para saber mais).
Antes de anunciar o desligamento de todo o corpo docente, os gestores da faculdade, que conta com cerca de 1.200 alunos, esperaram encerrar o prazo para renovação das matrículas. Para os professores demitidos, tratou-se de uma manobra para não assustar os estudantes dispostos a concluir o curso na instituição.
;Eles esperaram os alunos pagarem pela renovação para depois demitir. Foram covardes. Você acha que algum estudante iria renovar a matrícula sabendo que o quadro de professores está 100% defasado? Lógico que não;, indignou-se uma ex-professora, que não quis ter a identidade revelada.
Outro professor demitido, que também preferiu o anonimato, vai além. Para ele, a intenção dos mantenedores é fechar as portas sem dar satisfação aos estudantes. ;Nos últimos dias, ouvi várias conversas de que eles iriam pegar o dinheiro da renovação das matrículas e sumir, inclusive sem pagar os direitos aos professores demitidos;, contou.
O diretor acadêmico da FTB, Abimael de Lima, garantiu que todas as acusações dirigidas à faculdade são falsas e que os descontentamentos são normais por parte de quem acabou de perder o emprego. ;A verdade é que mais de 60% dos nossos professores só tinham graduação. Vamos renovar o quadro com mestres e doutores. Não existe essa história de fechar;, assegurou.
Ele também alegou que a substituição dos docentes acolheu a uma recomendação do MEC. A reportagem entrou em contato com a assessoria de comunicação da maior instância em educação do país, que, por meio de nota, contestou a afirmação de Abimael. ;A Faculdade da Terra de Brasília (FTB) está sob processo de supervisão e com vestibular suspenso. O
Ministério da Educação ainda está averiguando as denúncias sobre a instituição e levantando informações para verificar a necessidade de abertura de processo administrativo. Esclarecemos que não houve orientação deste ministério para demitir qualquer funcionário;, diz o texto.O presidente do Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinproep/DF) lamentou a iniciativa da faculdade e já tomou providências para fazer com que os direitos dos docentes demitidos sejam respeitados. Na semana passada, o Sinproep protocolou denúncia no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pretende ingressar com uma ação coletiva na Justiça exigindo que a FTB quite sua dívida com os antigos servidores. ;Infelizmente, chegou a esse ponto. Agora vamos a todas as instâncias possíveis para garantir que as rescisões, férias e outros benefícios sejam pagos pela FTB;, afirmou o da entidade sindical, Rodrigo de Paula.
Já o presidente do sindicato que representa as instituições de ensino superior no DF, Renato Resende, preferiu cautela ao comentar a informação. ;Qualquer empresa tem o direito de demitir na hora que achar necessário. Por enquanto, não vejo nenhuma ilegalidade. Vamos torcer para que outros professores sejam contratados e os alunos não fiquem prejudicados;, ponderou.
Suspensão
Diante das denúncias de venda de diplomas pela FTB, o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino Superior do DF (Sindeps/DF) decidiu, em assembleia realizada em outubro, suspender o registro de filiação da FTB até que todas as denúncias seja apuradas.
A frase
Ex-professora da FTB,
que preferiu não ter o nome divulgado
Para saber mais
Histórico de problemas
Não é a primeira vez que a Faculdade da Terra ocupa espaço negativo no noticiário local. Há pouco mais de dois meses, o Correio revelou um suposto esquema de venda de diplomas falsos dentro da instituição. Segundo as denúncias, mais de 600 certificados podem ter sido entregues a alunos que nunca pisaram na FTB. Consta também que os autores da suposta fraude são os mantenedores da faculdade, os professores José Caitano Neto e Leonardo Pujatti.
A FTB teria emitido os certificados baseados em históricos curriculares falsos, elaborados dentro da própria instituição, e depois remetido-os para a Universidade de Brasília (UnB), responsável por validar os diplomas. Porém, em alguns casos, erros grotescos denunciavam a má-fé. Um exemplo é o histórico de uma mulher formada em história, mas que tem na grade apenas disciplinas relacionadas ao curso de biologia: zoologia dos invertebrados, genética, bioquímica, taxonomia das fanerógamas e outras. O MEC e o Ministério Público Federal (MPF) ainda apuram as denúncias. Se a fraude for confirmada, a FTB pode ser fechada e os responsáveis, presos.
Em outro problema que teve a FTB como protagonista em 2010, a Justiça determinou, em julho, o fechamento da instituição por falta de pagamento de aluguel nos últimos dois anos. Outra acusação era de que os cerca de 130 professores e os mais de 90 funcionários não recebiam há mais de dois meses. A instituição também era acusada de não recolher INSS e FGTS há pelo menos sete anos. A ordem de despejo fez com que pelo menos 500 estudantes pedissem transferência. Sem conseguir administrar as dívidas, o antigo dono vendeu a instituição para José Caitano e Leonardo Pujatti. (SA)
Lista de instituições em débito
;Educação não é mercadoria.; Com esse slogan, o Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinproep/DF) vai entrar em 2011. O objetivo é alertar os estudantes que pretendem ingressar em um curso superior de que a escolha da faculdade é determinante para uma boa formação e, consequentemente, para o ingresso no mercado de trabalho. Segundo o presidente do sindicato, Rodrigo de Paula, o primeiro sintoma de que uma instituição vai mal é quando o direito dos servidores começa a ser desrespeitado. ;Quando a faculdade não cumpre com as obrigações trabalhistas, isso vai gerar uma desmotivação por parte dos professores e, naturalmente, vai se refletir no ensino repassado aos alunos;, destacou Rodrigo.
O Correio obteve a relação de oito faculdades que estão em débito com seus funcionários, segundo o Sinproep, por não recolher FGTS, ou por atrasar salários, ou até pelo não pagamento de férias e 13;. São elas: Faculdade Darwin, em Águas Claras; Cecap, no Lago Norte; Faculdade Águas Emendadas (FAE), em Planaltina; Unisaber, em Ceilândia; Fortium, em Taguatinga; Alvorada, na Asa Norte; e Instituto de Educação Superior de Samambaia (Iesa).
A reportagem ligou para a sede de todas as citadas no relatório do Sinproep, mas conseguiu fazer contato com apenas duas. A direção da Cecap informou que o nome da instituição foi incluído indevidamente pelo Sinproep na lista. Segundo a diretora Kátia Cristina, problemas dessa ordem ocorreram em 2009, mas ela garantiu que a situação foi normalizada este ano. Já diretor-geral da Faculdade Águas Emendadas reconheceu o atraso no pagamento das férias e do último salário, mas disse que um acordo com os professores foi feito, na presença do sindicato. Nesse encontro, garante ele, ficou acertado que todas as pendências serão sanadas no dia 10 de janeiro. ;Esse foi um acordo que o Sinproep assinou. Tudo já está resolvido, por isso, acho irresponsável nos incluir nessa lista. Estamos fazendo uma gestão exemplar e não vamos permitir que a imagem da instituição seja manchada dessa forma;, protestou Rubem Boff. (SA)