Naira Trindade
postado em 27/12/2010 07:50
Os animais silvestres estão mais vulneráveis no Distrito Federal. Diariamente, o Batalhão de Polícia Militar Ambiental (BPMA) apreende ou captura pelo menos cinco aves, répteis ou mamíferos vítimas de tráfico, maus-tratos ou desorientados em casas do DF. Até novembro de 2010, 1.663 animais foram recuperados, um salto de 547%. Em 2009, os policiais encontraram 257 bichos. O crescimento é justificado pela intensificação da ações de repressão e pelo considerável crescimento de áreas queimadas no DF, que expulsam os bichos do habitat natural.Mais grave que o acréscimo nas apreensões ou nas capturas é a estimativa de mortes dos animais. A cada 10 répteis, aves ou mamíferos encontrados pela polícia, apenas um sobrevive. Os outros nove morrem sem conseguir retornar à natureza. Pelo cálculo, dos 1.663 animais localizados, 1.497 perderam a vida. E pouco mais de 100 resistiram à quarentena de mudança de hábitos para serem reinseridos no meio ambiente. ;As formas de transporte e manuseio em condições precárias acabam levando-os ao óbito. A maioria é encontrada ferida ou mutilada. Além disso, algumas espécies não se readaptam sozinhas à vegetação;, explica o capitão Fernando Passos, do BPMA.
Nas apreensões e nas capturas, as aves são as mais suscetíveis aos maus-tratos. Dos animais encontrados, 63% (1.062) são canários, papagaios, periquitos, entre outros pássaros. Em 2010, o índice de recuperação de aves polícia foi 539% superior em relação ao ano passado. ;As operações estão mais intensas, mas a população participa ativamente desses resgates. Cerca de 90% dos animais que pegamos neste ano foram a partir de denúncias da comunidade recebidas por ligações telefônicas.;
As queimadas em áreas florestais expulsam mamíferos e répteis dos habitats naturais. Emas, micos-saguis, capivaras e cobras são levados praticamente todos os dias pelos policiais para os Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) do DF. Foram 601 animais (296 répteis e 305 mamíferos) recuperados em 2010, contra 91 (52 répteis e 39 mamíferos) em 2009. ;Ficamos com menos viaturas (duas para todo o DF) em 2009, o que dificultava o recolhimento de animais. Este ano, contamos com mais dois veículos. O aumento depende também do clima. No período de seca, as queimadas aumentam e os animais ficam mais vulneráveis;, diz Fernando Passos.
Tráfico internacional
Brasília está na rota do tráfico de animais no país. As rodovias federais BR-020 e BR-040 são as campeãs em apreensões. Os animais costumam chegar pelos estados de Mato Grosso do Sul e da Bahia, de onde partem para a Europa. ;O tráfico de animais é a terceira maior atividade ilícita do mundo e, em Brasília, a realidade não é diferente;, analisa o capitão. Uma estimativa do Batalhão de Polícia Militar Ambiental é de que 40% dos brasilienses que saem de férias trazem animais adquiridos de maneira irregular quando voltam para casa. ;Um dos mais raptados é o mico-sagui. Motoristas os encontram na rodovia e brincam até eles ficarem tontos para os colocarem dentro do carro. Vinte minutos depois, ele acorda eufórico. Já aconteceu de carros capotaram por causa do mico.;
Líderes em capturas urbanas, Ceilândia e Samambaia são os pontos mais visitados pela polícia. ;A maioria das apreensões é feita em feiras, onde as espécies são muito maltratadas. ;Já vimos periquitos com bico pintado e penas arrancadas para se passarem por filhotes de papagaios. Apesar de autuarmos nessas regiões, nossa missão é preservar para que os animais não saiam da atividade natural;, esclarece.
A impunidade dos negociadores de bichos pode ser uma das razões pela qual o índice da ilegalidade é crescente. A Lei n; 9.605, de 1998, prevê detenção de seis meses a um ano e multa para quem adquire espécies silvestres porém, as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando tratar-se de crime culposo ou aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos. Ou seja, não é possível ser preso apenas por traficar animais silvestres. (Veja O que diz a lei).
Diferenças
Os animais silvestres são aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias, aquáticas ou terrestres, que tenham a sua vida ou parte dela dentro dos limites do território brasileiro e em suas águas jurisdicionais. Já os exóticos são aqueles que nasceram no território brasileiro. Espécies ou subespécies introduzidas pelo homem, inclusive domésticas que se tornaram selvagens, também são consideradas exóticas. As domésticas são aquelas com características biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem.
Devolução
Estima-se que dos 38 milhões de bichos que são retirados à força de seus habitats anualmente no Brasil, apenas cerca de 40 mil voltam à natureza. No DF, há 15 pontos utilizados pelo Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) para realizar as solturas, entre eles o Jardim Botânico, o Hotel-Fazenda Stracta e a Chapada Imperial. A reintrodução dos animais à natureza é a última fase do processo de reabilitação. Depois da apreensão, os biólogos induzem os bichos a uma quarentena devolvendo-os os hábitos de sobrevivência. O terceiro passo é ensiná-los a agir agressivamente na presença de humanos.
Novas regras para proteger os animais
Ficou mais difícil sacrificar um animal doméstico no Distrito Federal. Uma mudança na Lei n; 4.060/07, feita por meio do Projeto de Lei n; 684/08, de autoria da deputada Eliana Pedrosa (DEM), defende que, para chegar à medida extrema, é preciso que todas as tentativas de inseri-lo em um ambiente digno e saudável tenham sido frustradas. As sanções também não mudaram. Permanece a aplicação de multa para quem cometer ato de abuso ou crueldade contra qualquer animal, manter animais em lugares anti-higiênicos ou que lhes impeçam a respiração e obrigá-los a trabalhos excessivos ou superiores às suas forças.
E EU COM ISSO
Retirar animais da natureza pode transformar-se numa ameaça à reprodução natural das espécies. O afastamento desordenado do bicho de seu habitat tem provocado a extinção de muitos animais. Outro problema gerado pela convivência de humanos é o risco de contágio por doenças. Os animais levados de maneira ilegal para o convício familiar dificilmente recebem acompanhamento veterinário ou passam pelo processo sanitário a que os órgãos de controle submetem os legalizados. Assim, familiares e vizinhos acabam expostos aos riscos de contaminações, podendo criar um problema de saúde pública no país.
O QUE DIZ A LEI
Penalidade muito branda
A Lei Federal n; 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, prevê detenção de seis meses a um ano e multa para quem, entre outras coisas, ;vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente;. No parágrafo 4; do mesmo artigo, a previsão é de que a pena seja dobrada quando o crime for praticado contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração. Se o crime decorre do exercício de caça profissional, o infrator pode pegar até o triplo da pena. O artigo 7; da lei, contudo, diz que as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos, o que ocorre mesmo quando a maior pena é aplicada. Ou seja, não é possível ser preso apenas por traficar animais silvestres. Entre as penas restritivas de direitos com a mesma duração que teriam as restritivas de liberdade, estão a prestação de serviços à comunidade, a interdição temporária de direitos e o recolhimento domiciliar.
Balanço
Número de animais capturados ou apreendidos pelo BPMA no DF
Espécie - 2009 - 2010*
Mamíferos - 39 - 305
Répteis - 52 - 296
Aves - 166 - 1062
TOTAL - 257 - 1.663
* (Dados até novembro)