Guilherme Goulart
postado em 17/01/2011 08:14
Crescimento desordenado, expansão do Entorno, aumento populacional, mau gerenciamento da segurança pública e avanço do uso e do tráfico de drogas, em especial o crack. Esses são alguns dos fatores que levaram à escalada da violência na capital do país na última década, segundo a opinião de especialistas. ;O DF tem inúmeras zonas de crescimento desordenado. É nelas em que ocorrem a favelização de Brasília e a consequente exclusão social. Isso tudo influencia a violência;, indicou o professor George Felipe Dantas, consultor em segurança pública.A análise do acadêmico se faz a partir da evolução demográfica ocorrida no Distrito Federal entre 2000 e 2010 e dos índices de homicídios registrados no período no Plano Piloto e nos arredores. ;O aumento da população influencia toda a criminalidade. E os assassinatos arrastam uma série de delitos. Se as mortes apontadas em determinado levantamento estão altas, é provável que outros crimes graves ocorridos na mesma localidade também estejam. E a situação piora se não há o apoio dos equipamentos do Estado, como é o caso do Entorno;, explicou.
O especialista citou como exemplo pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) que estudou a curva de assassinatos praticados na capital do país entre 1980 e 2000. Em 20 anos, o aumento da taxa cresceu 187%, com a população candanga. No início da década de 80, o índice candango estava em 12,3 casos por grupo de 100 mil habitantes. Mas pulou em 2000 para 35,4 mortes intencionais em relação à mesma quantidade de pessoas. A perspectiva colocou o DF próximo dos números nacionais. Em 2009, a região chegou aos 756 homicídios, taxa de quase 30 registros por 100 mil habitantes.
O professor Dantas também chamou a atenção para falhas históricas por parte das autoridades da segurança pública do DF. Uma delas passa pelos postos comunitários de segurança, adotados durante o governo de José Roberto Arruda (2007-2009). ;Acredito que houve um equívoco de gestão. A criminalidade preocupa e tem de ser combatida de maneira específica e não no atacado, como vinha sendo feito;, avaliou o consultor. Isso talvez explique em parte a mudança da tendência de queda dos homicídio até 2007 e de aumento a partir de então.
Políticas públicas
Para o sociólogo e especialista em segurança Antônio Flávio Testa, as soluções para conter o avanço da criminalidade se encontram no investimento em políticas públicas. Ele citou planejamento familiar, educação, atenção à infância e à juventude e programa de primeiro emprego como o início de uma mudança no perfil da sociedade. ;Certamente, isso reduziria a incidência do uso de drogas e a vulnerabilidade da juventude. A repressão é a última instância, mas é comum colocarem no primeiro plano;, criticou.
Segundo o também professor da UnB, a chegada do crack à realidade candanga contribuiu para o aumento das estatísticas na capital do país. ;É um problema de política social e está ligado a vários delitos, entre eles o sequestro relâmpago, que revela grande crescimento na década. O bandido viciado tem crise de abstinência e passa a roubar e a sequestrar, principalmente em regiões onde há mais dinheiro. Aqui, no caso, a maioria dos ataques ocorre em Brasília e Taguatinga;, afirmou o especialista.
Assim como o professor George Dantas, Testa destacou ao longo da análise da criminalidade no DF na última década o quase desaparecimento de crimes como o roubo a banco. ;É onde houve bastante investimento em tecnologia, mas a maioria do setor privado;, salientou. Para Dantas, as taxas de violência podem sofrer diminuições, também por conta da atuação da segurança privada, a partir da fiscalização da venda de bebidas alcoólicas. ;O problema é onde você bebe e com quem você bebe. Muitos dos crimes ocorrem nas ruas;, resumiu.
Combate
O secretário de Segurança Pública do DF, Daniel Lorenz, disse que uma das metas do novo governo passa pelo combate ao tráfico de drogas, especialmente o crack. A intenção dele é fazer um trabalho de inteligência capaz de descobrir a origem das pedras consumidas no Distrito Federal. ;Se soubermos que a droga vem de São Paulo, por exemplo, a ação é uma. Se for produzida aqui, o trabalho policial será completamente diferente. Vamos levantar o DNA do crack, e isso será feito por meio de um convênio com a Polícia Federal;, revelou.
Em relação aos postos comunitários de segurança, Lorenz explicou que serão mantidos por força de convênio com o Ministério da Justiça. O projeto, firmado no governo Arruda, prevê inclusive a instalação de mais 14 pontos como pré-condição para liberação de outros programas. Apesar disso, o secretário garantiu que haverá mudança na forma de atuação dos policiais militares. ;O planejamento será executado de tal modo que a população tenha pronto atendimento nos postos em funcionamento no DF, que serão equipados com aparelhos de comunicação e estruturas móveis (carros e motos);.
Colaborou Adriana Bernardes
Ineficiência
Apontada como solução para diminuir a criminalidade, a instalação de postos comunitários de segurança foi a principal aposta da gestão Arruda. Dessa forma, o ex-governador acreditou que manteria a polícia mais perto da comunidade. A meta era instalar 300 unidades, equipadas com carros, motos, rádios e computadores. Mas a principal crítica ao projeto ficou por conta do fato de os PMs não poderem deixar a base para atender as ocorrências.
Crescimento
As primeiras apreensões de crack pela Polícia Civil do DF ocorreram em 2006, quando se retiraram das ruas 2,90g. A partir de então, a circulação da droga aumentou expressivamente. A polícia recolheu das mãos de traficantes e de usuários 562g em 2007, 4,3kg em 2008, 11,9kg em 2009 e 18,8kg até julho do ano passado.
MEMÓRIA
O crime em Brasília
A violência no Distrito Federal chega com os primeiros habitantes, a partir de 1956. É época da construção da cidade, das empreiteiras, dos operários e dos engenheiros. Também de ladrões que furtam carteiras e material de construção. Há duelos na ponta da faca. Nos anos 60, a cidade é inaugurada e alcança 140 mil habitantes. Há muitos prostíbulos, e o revólver toma o lugar da peixeira. Surgem assassinatos à bala. Já os anos 70 são dominados pelos filhinhos de papai, os pegas de rua e o uso e o tráfico de drogas. Em tempos de ditadura, os playboys não são punidos. E surge o primeiro homicídio marcante da história da capital. A menina Ana Lídia Braga, 7 anos, morre asfixiada, depois de violentada. Gangue de filhos de bacanas é suspeita, mas o crime acaba impune. Com a chegada aos anos 80, Brasília testemunha a explosão da violência na periferia. Tem rebelião no Complexo Penitenciário da Papuda, e bandidos ganham fama e destaque na imprensa. Outro caso emblemático ocorre no DF: o garoto Pedro Rosalino Braule Pinto, o Pedrinho, é sequestrado em 1986. Só seria reencontrado 16 anos depois, em Goiânia (GO). Nos anos 90, as gangues de adolescentes viram quadrilhas de bandidos. Traficantes criam a merla. Na década seguinte, surgem os primeiros casos de sequestro relâmpago. E o crack consome a capital.