Cidades

Professor de Arquitetura move ação contra três estudantes da UnB

Roberta Machado
postado em 11/02/2011 07:56

Três alunos do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) respondem a processo por danos morais movido por um professor. O docente Neander Furtado Silva, que ministra a disciplina de projeto de arquitetura 2 (PA2), pede R$ 20 mil de indenização devido a um manifesto feito pelos estudantes em 2010. Na ocasião, a turma empilhou as carteiras do ateliê de desenho como forma de protesto contra a metodologia de ensino de Neander. Foram coladas ainda duas cartas do Centro Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo (Cafau), ressaltando a necessidade de uma mudança de atitude do professor em sala de aula.

O docente ingressou com a ação em 7 de janeiro, alegando que o ateliê teria sido invadido pelos integrantes do Cafau com a intenção de se fazer passar por estudantes de sua disciplina. Neander ainda afirma que teve a honra atingida por pichações difamatórias feitas pelos alunos com dizeres como ;verdade e agressão; e ;devagar é que não se vai longe;. Após o ato dos estudantes, o docente redigiu uma carta para dar início a um processo administrativo contra os envolvidos no episódio. ;Manifestações desse tipo e teor constituem-se em cerceamento da liberdade de ensino e da autonomia intelectual;, dizia o documento. Como os alunos não foram punidos, Neander optou pela ação judicial.

Para os estudantes, a medida foi exagerada. ;Não estávamos questionando o professor. Levamos críticas sobre a metodologia dele ao conselho da faculdade duas vezes;, reclamou o estudante de arquitetura do 8; semestre Luiz Eduardo Araújo, um dos processados pelo professor. O conselho julgou as reclamações improcedentes. Entre os questionamentos dos alunos, estava a metodologia de ensino, principalmente a predileção do docente por um programa de computador que nem todos os alunos dominavam.

A defesa dos universitários foi assumida pelo advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, também conhecido como Kakay. O jurista, que geralmente só atende a grandes clientes, ofereceu seus serviços gratuitamente aos jovens. ;Eu fundei o Centro Acadêmico de Direito da UnB e escrevia artigos virulentos contra os professores da época. Nunca ninguém me processou. Fiquei estupefato com a situação. O professor fez uma reclamação ao conselho e, como não teve a resposta que queria, usou o Judiciário, no meu ponto de vista, para intimidar os meninos;, acusou o advogado.

Kakay deve apresentar seus argumentos no próximo dia 23, quando será realizada uma audiência de conciliação. Ele adianta que não deve entrar em acordo com o professor. ;A ideia é propor uma reconvenção e processar o docente. Quem teve a honra ultrajada foram os alunos. É um abuso, o ambiente universitário é de livre expressão;, criticou o advogado.

Novo protesto
Em apoio aos alunos processados, o atual Cafau organizou um novo protesto no último dia 3. As carteiras foram novamente empilhadas, desta vez com o apoio de cartazes e dizeres nas paredes como ;liberdade de expressão;. Alguns estudantes ainda se amarraram e se acorrentaram como forma de manifesto contra a ação protelada pelo professor. ;Foi uma intervenção de caráter artístico e político, completamente pacífica. Achamos que o professor se equivocou ao processar os estudantes, pois eles não o estavam agredindo, só questionaram a metodologia;, afirmou o atual presidente do Cafau, Otávio Sousa.

Por meio da assessoria da UnB, o diretor em exercício da Faculdade de Arquitetura, José Manoel Sanches, afirmou que irá cobrar mais agilidade da comissão que investiga o conflito entre Neander e os alunos. Uma nova comissão, com o objetivo de avaliar a qualidade de ensino da faculdade, também deve ser instaurada a pedido de Sanches. Os advogados do arquiteto afirmaram que o professor não pode dar declarações até que esteja encerrado o processo.

17 estudantes condenados

Ao mesmo tempo em que três alunos são processados por um professor, outro docente da UnB saiu vitorioso de um litígio semelhante. Na última terça-feira, a professora de tecnologia farmacêutica Mônica Valero saiu vitoriosa em um processo movido em 2005 contra 17 alunos do curso de ciências farmacêuticas. Ela vai receber uma indenização por danos morais de R$ 8,5 mil.

Naquele ano, os estudantes divulgaram um documento de quatro páginas intitulado ;Manifesto da mediocridade;, no qual afirmavam que professora não havia concluído o doutorado, e ainda levantavam a hipótese de que ela teria comprado a vaga no corpo docente da instituição.

Além de Mônica, o manifesto citava outras três professoras, que preferiram não ingressar com a ação judicial contra os alunos. Após a distribuição do documento, as duas docentes substitutas criticadas pelos universitários pediram demissão da instituição. A quarta professora era chefe de departamento do curso na época, e optou por não se envolver na disputa.

Mônica Valero conta que decidiu processar os alunos somente depois que esgotaram-se as opções dentro da universidade. ;Como eu sofri as críticas mais duras, entrei com um processo administrativo na UnB;, contou. Após seis meses de investigações, os estudantes foram levados a um colegiado da instituição para pedir desculpas formais a Mônica. ;Como não fiquei satisfeita com essa decisão interna, decidi entrar por contra própria com o processo. Eu esperava que eles sofressem uma suspensão ou advertência;, ressaltou.

Desde o início do processo, passaram-se quase seis anos. Os alunos já estão formados, e muitos nem mesmo moram mais em Brasília. Para a professora, a espera valeu a pena. ;Estou satisfeita. Nunca foi pelo valor indenizatório. Eu queria que eles tivessem uma lição de vida;, garante a docente. Mônica ainda ressalta que a ação não servirá como forma de cerceamento da liberdade de expressão dos estudantes, e sim como exemplo para outros professores que se sintam agredidos em sala de aula.

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