Adriana Bernardes
postado em 28/02/2011 06:53
Quando o acidente de trânsito não provoca a morte imediata da vítima, a decisão do motorista de fugir sem prestar socorro pode representar uma sentença de morte. Especialistas explicam que, quanto mais rápido o atendimento médico, há mais chances de sobrevivência e menos possibilidade de sequelas. E prestar socorro não significa, necessariamente, tocar na vítima ou levá-la a um hospital. Basta pegar o telefone e avisar aos serviços de emergência. A corrida contra o relógio para salvar a vítima é tão importante quanto a qualidade do atendimento. Diretor do Departamento de Atendimento Pré-Hospitalar da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Carlos Eid destaca que o tempo-resposta ; aquele entre a lesão e o primeiro atendimento ; é crucial para a vítima. Tanto que em alguns grandes centros do mundo, como Toronto (Canadá) e Nova York (Estados Unidos), as autoridades fixaram como meta que 80% dos chamados sejam atendidos em até 10 minutos.
Mas não basta ser rápido. O socorro precisa ser feito por pessoa habilitada. ;Ligue para a emergência. Enquanto o socorro não chega, sinalize o local para evitar outro acidente. Caso esteja bem treinado e se sinta capaz, tente interagir com a vítima. Do contrário, siga as orientações do socorrista;, aconselha Eid. Diretor de Assistência às Urgências e Emergências da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, Ayrton Barroso acrescenta que pessoas sem capacitação podem piorar ou provocar lesões ainda mais graves nas vítimas. Não há estimativa de tempo médio de resgate no DF, segundo Barroso, coordenador do Samu e das urgências e emergências dos hospitais.
Falta de solidariedade
O pedreiro José Bezerra de Lima, 72, nunca vai saber se o filho, Wesley Cardoso dos Santos, 23 nos, sobreviveria ao atropelamento ocorrido na madrugada de 2 de agosto de 2009, na DF-290, em Santa Maria. ;Não sei se ele morreu na hora. Mas ficou largado lá no chão. Sei que tem o assombramento da hora (o susto), mas um ser humano precisa ajudar o outro. Dando socorro, ameniza metade do crime;, comenta.
O motorista do carro que atropelou Wesley fugiu sem prestar socorro, de acordo com os investigadores da 33; Delegacia de Polícia (Santa Maria). Eles concluíram o inquérito na semana passada e indiciaram Reginaldo Gomes de Souza por homicídio culposo, agravado pela omissão de socorro. Ficou comprovado, por meio de perícia, que ele trafegava a 110km/h numa via em que a velocidade máxima permitida é 80km/h. O amigo dele, Luciano Xavier da Purificação, que estava no carro no momento do acidente, também está indiciado por omissão de socorro. ;Testemunhas contaram que a vítima ficou presa no para-brisa e Reginaldo freou para ela cair. Ele alega que fugiu por medo de ser linchado, versão confirmada por Luciano;, informou uma fonte policial.
Desculpas no tribunal
Titular da promotora de Delitos de Trânsito, Laura Beatriz Rito relata que, em juízo, as alegações mais comuns são perturbação, nervosismo e medo de linchamento. ;No caso de risco de linchamento, primeiro o autor tem que se resguardar. Se ficar constatado que a vítima já não tem sinal de vida, não se pode prestar socorro a quem não precisa. Mas as autoridades devem ser avisadas do ocorrido imediatamente;, destaca a promotora.
Apesar das justificativas dos condutores, Laura Beatriz diz que, geralmente, a fuga é uma tentativa de se safar das punições. ;É deprimente. O socorro é um dever humanitário. Mas, por medo de serem processadas, a fuga prevalece sobre a vida humana. É de um egoísmo total. A vida humana não tem valor;, lamenta. E por conta desse comportamento, muitos parentes de vítimas sofrem com a perda e com a impunidade. Segundo Laura Beatriz, muitos processos acabam arquivados porque a polícia e o MP não conseguem descobrir a autoria do crime.
Punição exemplar
No caso do biólogo Pedro Davison, 25 anos, morto na faixa central do Eixo Rodoviário Sul em agosto de 2006, a fuga do condutor não impediu que a polícia o prendesse. O júri popular condenou o motorista Leonardo Luiz da Costa. O juiz fixou pena mínima de seis anos de cadeia. O Ministério Público considerou a punição branda e recorreu ao Tribunal de Justiça do DF, onde o recurso ainda não foi julgado pelos desembargadores.
No canteiro verde, uma bicicleta pintada de branco marca o local do acidente ;não para lembrar a morte, mas a necessidade de respeito à vida;, afirma Pérsio Davison, 63 anos, pai do jovem. ;Ele (o motorista) dirigia em alta velocidade, na faixa central do Eixão, onde é proibido o tráfego de carros, atropelou e fugiu. Esse rapaz demonstrou desrespeito com a vida ao assumir essas condutas e mais ainda porque não prestou socorro;, enumera.
Injustificável
Na avaliação do professor da Universidade de Brasília (UnB) Hartmut Günther, especialista em psicologia do trânsito, várias possibilidades podem levar o condutor a fugir do local de um acidente. Entrar em estado de choque é uma delas, assim como o medo de ser preso e responder pelos crimes de lesão ou homicídio culposo ou doloso no trânsito. ;Nesse momento, a pessoa não está raciocinando bem e vai embora. Também existem os que acham que fugindo vão se safar;, destaca. ;Agora, se antes do acidente essa pessoa se comportou de maneira irresponsável, em alta velocidade ou alcoolizado, por qual razão vai começar a se comportar responsavelmente quando fere outra?;, questiona. Para Günther, seja qual for o motivo, não há justificativa para a omissão de socorro.
Telefones de emergência
Corpo de Bombeiros - 193
Polícia Civil - 197
Polícia Federal - 194
Polícia Militar - 190
Polícia Rodoviária Federal - 191
Pronto-socorro - 192