Cidades

Sem vagas, motoristas abusam do desrespeito no Setor de Autarquias Sul

Em uma das áreas mais críticas do Plano Piloto para o estacionamento de veículos, há mais carros do que vagas. Tamanho do desrespeito contrasta com os poucos fiscais do Detran

Roberta Machado
postado em 16/03/2011 07:00
Ousadia: aviso de proibido estacionar não inibe as irregularidadesMotivados pela falta de vagas na região central do Plano Piloto, motoristas tomam conta das áreas de circulação próximas ao Setor de Autarquias Sul (SAS). Pedestres precisam contornar os veículos que passam o dia estacionados em calçadas e canteiros, burlando a fiscalização esporádica do Departamento de Trânsito (Detran). A liberdade tomada pelos condutores é tanta que, nos horários críticos, o trânsito é prejudicado pelos carros parados ao longo dos dois lados das vias, nos retornos e até mesmo sobre as faixas de pedestres, sempre com a bênção de flanelinhas.

Às 13h, quando começa o expediente de Leonardo Alves, 34 anos, não há vagas nos arredores, por exemplo, da Caixa Econômica Federal (CEF), do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Controladoria-Geral da União. Por um tempo, ele estacionou nos espaços irregulares, mas, depois de ser multado e ter o carro arrombado, o servidor público optou por não parar em locais proibidos. Hoje, ele enfrenta uma fila de uma hora no estacionamento rotativo do prédio da CEF, onde trabalha. ;Aqui, nunca tem vaga. Quando estou com pressa, prefiro parar na quadra residencial;, contou.

Mesmo com o risco das multas, alguns motoristas optam por largar os veículos em áreas irregulares. Quem lucra com a situação são os flanelinhas, responsáveis pelo serviço de manobrista. Por R$ 50 mensais, eles comandam a retirada dos carros durante as operações do Detran. ;Se der problema eu tiro e aviso a recepção dos prédios. Todo mundo desce correndo para tirá-los da grama;, conta o vigia João Santana, 28 anos, que guarda até uma centena de chaves no mesmo dia.

As visitas do Detran, no entanto, não são frequentes. O gerente de fiscalização do órgão, Marcelo Madeira, ressalta que o SAS, ao lado do Setor Bancário Norte, é uma das áreas mais críticas do DF. ;A situação é tal, que a gente não consegue entrar com o guincho para fazer as remoções. Os carros chegam a atrapalhar a segurança, porque ali não entra um caminhão de bombeiros;, alertou. Mas ele admite que os agentes só são enviados para punir os motoristas quando há denúncias ou operações especiais.



O efetivo do Detran não é suficiente para que um agente permaneça no local. Enquanto a frota de veículos no DF cresceu 35% entre 2006 e 2010, a quantidade de funcionários do órgão caiu 30%. Hoje, são apenas 130 a cargo da fiscalização ; há quase 1,25 milhão de veículos. Madeira calcula que seja necessário no mínimo um homem para cada 2 mil carros em circulação em Brasília. A proporção exigiria cinco vezes mais servidores do que o efetivo atual. Enquanto o concurso para o órgão permanece suspenso, a frota não para de crescer.

Sem alternativa
Nos últimos anos, alguns canteiros do SAS foram transformados em espaços pavimentados, mas a situação continua a piorar. E para o especialista em trânsito Paulo Cesar Marques da Silva, a simples ameaça de uma multa não é o suficiente. ;A fiscalização não atua com a firmeza necessária. É possível que alguns prefiram correr o risco de serem multados, pois o valor vale mais a pena;, avalia o professor da Universidade de Brasília (UnB). As multas por estacionar em local proibido chegam a R$ 127. O aluguel de uma vaga no SAS pode custar até R$ 350.

De acordo com o professor, o excesso de automóveis pode ser resultado de uma política deficiente no transporte público e nas áreas de estacionamento. ;Ninguém precisa parar na porta do local e trabalho. As empresas podem criar sistemas que permitam que as pessoas parem o carro em lugares ociosos;, ressalta. Ele cita órgãos como a Câmara dos Deputados, que disponibiliza transporte gratuito aos funcionários que estacionam na Procuradoria-Geral da União.

O servidor público José Demontier, 55 anos, enfrenta a guerra diária nos estacionamentos do SAS há oito anos. Morador do Setor de Clubes Sul, o servidor público levaria mais de uma hora para fazer de ônibus o caminho que percorre em 5 minutos de carro. Ele também encontra problemas na hora de ir embora. ;A situação tem piorado nos últimos 10 anos. Quando preciso sair, às vezes, perco até 10 minutos, pois o flanelinha tem de tirar dois ou três carros para abrir caminho;, reclamou.

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