Helena Mader
postado em 02/04/2011 07:21
Depois de ser beneficiado pela delação premiada e conseguir redução de pena, o ex-secretário de Relações Institucionais do GDF Durval Barbosa ainda terá que enfrentar a Justiça outras tantas vezes, já que é réu em cerca de 40 ações. Como ajudou o Ministério Público do DF nas investigações da Operação Caixa de Pandora, ele poderá pleitear penas menores e até mesmo o perdão judicial em cada um dos casos que tramitam no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Mas Durval Barbosa corre o risco de perder a benesse antes que outras ações entrem na pauta de julgamento. Para especialistas ouvidos pelo Correio, os indícios de que ele ainda guarda informações importantes para as investigações são suficientes para a suspensão do benefício. A legislação que trata da delação premiada no Brasil não detalha quais são as normas para que o réu use esse mecanismo. Na maioria dos casos, as regras são estabelecidas durante o acordo firmado entre o acusado e os investigadores e, para ter validade, é preciso comunicar a Justiça sobre os termos firmados. Especialistas defendem uma regulamentação urgente da delação premiada para evitar abusos na utilização desse benefício.
Para o professor e coordenador do curso de Direito Penal e Econômico da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas, Celso Vilardi, o mecanismo é importante para desbaratar organizações criminosas e pode trazer grandes contribuições à Justiça. Mas ele acredita que a delação ainda precisa de regulamentação. ;Os maiores problemas que temos hoje são mais de forma que de conteúdo. Definitivamente, a delação pode contribuir para a elucidação de casos graves. Mas é preciso que sejam criadas normas claras para a sua utilização;, afirma o especialista.
Celso Vilardi defende que o réu deve perder o benefício caso não cumpra as regras do termo firmado com o Ministério Público no início das negociações. ;A delação consiste em um processo de barganha, de troca. A definição de regras é importante até para podermos verificar se o uso do benefício está sendo feito de forma adequada;.
Redução de pena
Outro aspecto que é criticado por especialistas é a decretação de segredo de Justiça nos casos que envolvem delação premiada. Como a colaboração com as investigações é sigilosa, os advogados dos acusados não têm acesso ao conteúdo das acusações para contestá-las. ;Assim, fica difícil verificar se os delatores estão mesmo falando a verdade. Porque eles podem mentir para criar estratégias de defesa;, justifica Celso Vilardi.
Na opinião da professora de direito penal e pesquisadora da Universidade de Brasília Soraia Mendes, a delação premiada é essencial para a conclusão de alguns tipos de processos. ;Se não fosse isso, muito dificilmente seria possível desbaratar algumas quadrilhas. O nível de comprometimento nessas organizações sempre é muito grande, é um delito que demanda uma organização tão forte que somente alguém de dentro pode prestar informações seguras;, explica a professora da Universidade de Brasília. ;Algumas pessoas criticam a redução de pena ou a concessão de penas alternativas, como aconteceu agora com o Durval Barbosa, mas é preciso deixar claro que não houve descriminalização;, acrescenta Soraia.
A Lei Federal n; 9.807/99, que cita a possibilidade de uso da delação premiada, determina que o juiz pode conceder a redução de pena de um ou dois terços ou até mesmo o perdão judicial. Mas a legislação estabelece que o réu só pode ter direito à benesse desde que ;tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal;. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, já advertiu que pode suspender o benefício concedido a Durval por conta da divulgação a ;conta-gotas; de vídeos que comprometem políticos de Brasília. Além da redução de pena, quem colabora com as investigações também tem direito a detenção em alas separadas, em caso de condenação à prisão.
Para o professor de direito penal da Universidade de Brasília Pedro Paulo Castelo Branco, o juiz responsável pelo caso ou o Ministério Público podem descartar o benefício da delação premiada, caso entendam que houve ;abuso; do réu. ;Esse processo de delação não pode ser abusivo, o acusado não pode ir soltando informações aos poucos, para fazer chantagens ou barganhas. Se ele vai para a delação premiada, tem que ajudar efetivamente a elucidar o crime fornecendo tudo o que tem;, defende o especialista. ;O réu pode até ficar calado, mas o delator que recebe benesse não pode esconder a verdade;, acrescenta.
Banco dos réus
Na última quinta-feira, a 2; Turma Criminal do Tribunal de Justiça do DF e Territórios analisou dois processos em que Durval figurava como réu por dispensa indevida de licitação. Em um dos casos, a pena foi reduzida de dois anos para um ano e meio. No outro caso, a penalidade também diminuiu, o que acarretou a prescrição do crime.
O que diz a lei
A Lei Federal n; 9.807/99, que trata da delação premiada, determina que o juiz pode conceder o perdão judicial, com a consequente extinção da punibilidade, ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal. O benefício só é concedido quando a delação leva à identificação dos demais coautores ou integrantes da ação criminosa. Além disso, a delação tem que levar à recuperação total ou parcial do produto do crime.
Segundo a norma, a concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso. No caso de condenação, o indiciado ou acusado que colaborar com a investigação policial e com o processo criminal terá pena reduzida de um a dois terços. Serão aplicadas em benefício do colaborador, na prisão ou fora dela, medidas especiais de segurança e proteção à sua integridade física, considerando ameaça ou
coação eventual ou efetiva.
Se estiver em prisão temporária, preventiva ou em decorrência de flagrante delito, o colaborador será custodiado em dependência separada dos demais presos.
No caso de cumprimento da pena em regime fechado, o juiz criminal pode determinar medidas especiais que proporcionem a segurança do colaborador em relação aos demais apenados.