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Primeiro centro de ensino médio de Brasília, o Elefante Branco chega aos 50

postado em 16/04/2011 08:00

Atualmente, a instituição tem 2 mil alunos, mas, em épocas passadas, chegou a registrar 5  mil matriculados nos três turnos de estudo
Era 1961. A cidade recém-inaugurada vivia em um ritmo frenético de obras, imprescindíveis para que um descampado em pleno cerrado assumisse ares de cidade, de capital da República. Em 22 de abril, sem pompa, iniciava as suas atividades o Centro de Ensino Médio Elefante Branco (Cemeb), o primeiro de Brasília. Não houve nenhum ato de criação. Foi uma estreia tímida para uma escola que mudaria a história da cidade e formaria grandes nomes da política, da justiça e das artes. Na próxima sexta-feira, o mítico Elefante Branco completa 50 anos.

Na verdade, o centro de ensino médio já existia desde 1960, quando foi criada a Comissão de Administração do Sistema Educacional de Brasília (Caseb) pelo Ministério da Educação. No início, o colégio funcionava nas dependências do atual Centro de Ensino Fundamental da Caseb, na 910 Sul. Um ano depois, as atividades foram transferidas para o prédio atual. Nos arquivos da escola e da imprensa, consta que a ansiedade era tamanha que a construção seguia em meio aos alunos, eficientes fiscais do andamento das obras.

O Elefante Branco significava a materialização dos ideais de educação concebidos por Anísio Teixeira, educador e criador do conceito de Escola Nova ; teoria que privilegiava o desenvolvimento intelectual e do pensamento crítico em detrimento da memorização. Brasília seria o modelo de ensino brasileiro. A estrutura se assemelhava à de uma universidade: havia matérias optativas, departamentos, laboratórios devidamente equipados. Além disso, o Elefante Branco ficou conhecido pelos cursos técnicos de engenharia, eletrônica, contabilidade e outros. ;A excelência no ensino era tamanha que chegamos a ter um ministro do Supremo Tribunal Federal como aluno de eletrônica. Ele estudou aqui três anos;, conta José Luiz Mazzaro, ex-aluno, atual professor de biologia da escola e coordenador da comissão que prepara os festejos do cinquentenário. Os cursos técnicos foram extintos recentemente.

A chegada da ditadura militar (1964-1985) e a sanção da Lei Federal n; 5.692, de 1971, que reformulou o ensino de 1; e 2; graus, deram início à decadência da escola. Ainda assim, durante os anos de comando militar, efervesceu nos corredores do Elefante Branco um movimento de resistência esquerdista que levou os órgãos de controle e repressão a chamar o colégio de ;Elefante Vermelho;. Mazzaro recorda: ;A escola era fechada para sediar reuniões de estudantes e membros da resistência política. A escola e a Universidade de Brasília são, historicamente, polos de resistência e movimento estudantil;. Mesmo após a queda da ditadura, os ares politizados não saíram do Elefante Branco.

Devastação
Assim também lembra o atual secretário de Trabalho do Distrito Federal, Glauco Rojas, aluno da instituição na década de 1990. ;Ali foi o meu berço, do ponto de vista da participação política. Foi um embrião, um divisor de águas na minha vida e nas decisões que tomei ao longo dela.; Rojas conta que, durante um protesto para reivindicar o impeachment de Fernando Collor, em 1992, de uma hora para outra, ele passou de manifestante a puxador da multidão. ;De repente, me vi com o microfone na mão, conduzindo a manifestação. Se hoje sou secretário de Estado, tenho certeza de que devo muito ao Elefante Branco.;

As salas frequentadas pelo hoje secretário de Trabalho receberam também homens e mulheres que anos depois conquistariam notoriedade. Entre eles estão o ministro do STF Joaquim Barbosa, o historiador e cientista político Luiz Felipe de Alencastro, o ex-procurador-geral da República Cláudio Lemos Fonteles, o tricampeão mundial de Fórmula 1 Nelson Piquet, a cantora e compositora Zélia Duncan e Honestino Guimarães, estudante perseguido e desaparecido em 1973, símbolo do vanguardismo da escola em movimentos estudantis.

O tempo, porém, foi implacável. A devastação está à vista nas rachaduras, no chão descolado, em paredes descascadas. Em 50 anos, nunca houve uma grande intervenção estrutural que desse manutenção no projeto moderno do arquiteto José de Sousa Reis. Os laboratórios foram desmontados, convertidos em salas improvisadas. Nunca foram substituídos, e até hoje os cerca de 2 mil alunos não têm instalações para o ensino prático de física e química. A instituição já chegou a receber 5 mil estudantes nos três turnos. Hoje, faltaria espaço para ampliar a oferta de vagas, já que parte do prédio é ocupada pelo Centro Integrado de Línguas (CIL).

Piso descolado em sala de aula: a precariedade tomou conta

Curiosidade
Não há uma versão oficial sobre a origem do nome da escola. Uma das mais aceitas é que a planta baixa da estrutura se assemelha às formas de um elefante. Uma outra sustenta que, enquanto o prédio era construído, uma funcionária do Ministério da Educação teria dito, durante uma vistoria, que o ;elefante não ficaria pronto; a tempo, referindo-se ao tamanho da obra.


Participe
Ex-alunos que quiserem contribuir com um documentário que está sendo produzido sobre a história do Elefante Branco podem entrar em contato com o professor Mazzaro pelo e-mail jlmazzvoce@yahoo.com.




O desafio de revitalizar
;Dá tristeza nos professores não ter a estrutura adequada. E nós temos um corpo docente incrível, com diversos doutores. JK aceitou o desafio de construir a capital no cerrado. Eu desafio o governo a revitalizar o Elefante Branco. Falta vontade política;, desafia Mazzaro. A Secretaria de Educação, coordenada por Regina Vinhaes, também ex-aluna do Elefante Branco, informou, por meio de sua assessoria, que está em curso um levantamento sobre a situação das escolas, mas não há nada previsto especificamente para o Elefante Branco.

O declínio de prestígio foi visto de perto pela funcionária Izetiana Arcanjo Martins. Dos 54 anos de vida, 33 foram passados na portaria do colégio. ;Foi meu primeiro e único emprego, graças a Deus. Houve um tempo em que isso aqui era uma maravilha, era agradável estar aqui. Mas vi a escola envelhecer de um jeito ruim;, desabafa. Tiana, como ficou conhecida, está prestes a se aposentar. Nos dias em que não há alunos na escola, o vazio a incomoda. ;Não tem ninguém para brigar;, diz, rindo.

Novos tempos
O desempenho da escola pode ter ficado ofuscado nos últimos anos, mas, em tempos de desvalorização da educação pública, o Elefante Branco ainda é uma miragem para os pais que procuram dar aos filhos uma oportunidade melhor ; a maioria dos estudantes mora fora do Plano Piloto. ;Aqui ainda é muito melhor do que nas escolas de outras cidades. Mas precisa melhorar a estrutura e a segurança;, opina Karen Albuquerque, 15 anos. ;Os países desenvolvidos investem em educação, preparam melhor os alunos;, reforça seu colega Victor Brandão, 14.

;Eu fui muito feliz nessa escola. Passei os melhores anos da minha vida aqui dentro. E gostaria que fosse assim também para quem estuda aqui hoje, o que, infelizmente, não é a realidade;, admite José Luiz Mazzaro. A partir do dia 25, o colégio abre as portas à comunidade para celebrar. O Elefante Branco tem a esperança de dias melhores. Tempos futuros mais parecidos com um excelente passado.

Confira a programação
Dia 25
A partir das 8h:
; Solenidade de hasteamento das Bandeiras Nacional, de Brasília e do Cemeb
; Celebração ecumênica de Ação de Graças pelo Cinquentenário do Cemeb
; Abertura da Exposição Elefante Branco: 50 anos ensinando, formando cidadãos e fazendo história; apresentação de documentário sobre Honestino Guimarães, seguido de debate
; Café da manhã comunitário com show de bandas formadas por ex-alunos

A partir das 14h:
; Aula da Saudade (Ex-alunos: Dr. Cláudio Lemos Fonteles,
ex-procurador-geral da República; secretários Regina Vinhaes, da Educação, e Glauco Rojas Ivo, de Trabalho); descerramento da placa do cinquentenário do Cemeb
; 15h: sessão solene da Câmara Legislativa do Distrito Federal,
no Salão Negro

Dia 27
A partir das 8h
; Plantio de 50 árvores típicas do cerrado na área verde frontal da escola e atividades esportivas, no decorrer da semana comemorativa
; 14h: programa Tromba Livre Especial 50 Anos, com artistas e políticos que estudaram na escola

Dia 29
; 8h: Abraço coletivo simbólico ao Cemeb e degustação do bolo gigante

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