Cidades

A cada ano, Distrito Federal ganha 65 mil moradores

Helena Mader
postado em 08/05/2011 08:00

Uma dúvida intriga o comerciante Antônio Alves Silva, 66 anos. Dono de um quiosque às margens da Avenida Hélio Prates, ele não sabe se o seu negócio fica em Taguatinga Norte ou em Ceilândia Sul. ;É difícil saber, acho que estou exatamente na divisa;, brinca. Bem ao lado do trailer dele, há uma placa que diz ;bem-vindo a Ceilândia;, mas as taxas que recebe mensalmente são da Administração Regional de Taguatinga. Os questionamentos de Antônio se repetem em diversos pontos do Distrito Federal. Com o crescimento urbano rápido, é difícil distinguir hoje onde começa uma cidade e termina a outra.

Os limites territoriais da capital federal mudaram muito nas últimas décadas. Criado para ser uma região polinucleada, ou seja, com vários núcleos urbanos independentes, o DF se transformou em uma grande região metropolitana, que inclui pelo menos 10 municípios do Entorno. Aqui, o processo de conurbação foi rápido: em apenas meio século, as diferentes cidades da capital do país cresceram umas sobre as outras, tornando complicada a delimitação. Esse fenômeno acontece quando um centro urbano cresce para além das fronteiras administrativas, absorvendo regiões vizinhas. As localidades, assim, emendam umas nas outras, como aconteceu entre Ceilândia e Taguatinga.

A tendência é que o processo continue e que cidades ainda com fronteiras bem delimitadas, como Recanto das Emas e Riacho Fundo, por exemplo, acabem por se fundir. Como o ritmo de crescimento médio anual da população do Distrito Federal na última década foi de 2,5%, isso significa que, todos os anos, a capital federal ganha pelo menos 65 mil novos moradores. Isso é mais do que toda a população de Brazlândia. Ou seja: o quadrilátero ganha o equivalente a uma nova cidade por ano. Nas próximas duas décadas, a capital federal vai ganhar mais cerca de 1,5 milhão de habitantes. E essas pessoas terão de ocupar os espaços hoje vazios do território.

Além da conurbação entre Taguatinga e Ceilândia, outras regiões se unem a essas duas cidades, como Guará, Vicente Pires, Águas Claras e Samambaia. Elas se uniram em uma única mancha urbana sobre o quadrilátero do Distrito Federal. Nos últimos 30 anos, a população cresceu 113%, o que levou esses novos moradores a buscar opções de moradia. A pressão habitacional e a falta de planejamento urbano também motivaram a criação de mais de 500 condomínios irregulares. Todos esses fenômenos incharam o território e, com isso, o fenômeno se consolidou.

O geógrafo e professor da Universidade de Brasília (UnB) Aldo Paviani, especialista em planejamento urbano, diz que essa é uma tendência de todos os grandes centros urbanos do país. Mas a rapidez com que isso aconteceu no Distrito Federal chama a atenção. ;Em São Paulo, há o chamado ABCD Paulista. Você sai de uma cidade e entra em outra sem perceber, porque tudo está emendado. Mas lá o fenômeno da urbanização levou pelo menos 250 anos. Aqui, em menos de 50 anos as cidades-satélites já estavam conurbadas;, explica o especialista (leia Quatro perguntas para).

Planejamento
Ceilândia é hoje a cidade mais populosa do Distrito Federal, com mais de 402 mil habitantes. O crescimento desordenado contribuiu para que a localidade se juntasse a outras cidades. A criação de parcelamentos ilegais de baixa renda, como o Pôr do Sol e o Sol Nascente, incharam a população. Nessas áreas, a falta de equipamentos públicos e de infraestrutura são motivo de reclamação constante dos moradores.

Na maioria das regiões metropolitanas, o aparecimento da conurbação é inevitável. Por isso, é importante que as autoridades se antecipem para planejar a ocupação das áreas livres entre as cidades ; ou para protegê-las, quando se trata de unidades de preservação ambiental. A gerente de Estudos Territoriais da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Sedhab), Cláudia Varizo, lembra que a concepção original do DF previa uma unidade da Federação polinucleada. ;Mas houve uma mudança no projeto original e a cidade teve uma ocupação extensiva, com urbanização contínua. A partir da década de 1990, esse fenômeno se consolidou;, explica.

Ela afirma que não há como questionar essa dinâmica da ocupação do território, mas lembra que o governo precisa planejar a ocupação daqui para a frente. ;Hoje, o ideal é fazer a ocupação próximo a áreas consolidadas e ao longo dos eixos de transporte;, justifica Cláudia.

Área tombada
A subsecretária de Planejamento Urbano da Sedhab, Fernanda Guimarães, explica que a conurbação precisa ser avaliada com muito cuidado quando se trata da área tombada de Brasília. Isso porque construções próximas ao centro da cidade não podem interferir na paisagem da zona protegida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pela Unesco. ;Não é só a área tombada que precisa ser preservada, o seu horizonte, a sua paisagem também devem permanecer protegidos. Por isso, é necessário acompanhar com muita atenção a ocupação em áreas próximas ao centro tombado;, alerta.

A preocupação da Sedhab é justificável. A pressão sobre o Plano Piloto é crescente por conta da concentração de serviços públicos, como saúde e educação, e dos empregos na zona central de Brasília. O fluxo diário de pessoas em direção ao Plano Piloto estimulou o fenômeno, já que as pessoas querem e precisam ficar cada vez mais perto do centro da cidade para tentar diminuir os deslocamentos e os gastos.

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