Flávia Maia
postado em 09/05/2011 08:00
O carnaval em Santa Maria custou caro aos cofres públicos. Os valores especificados nas notas de empenho para a contratação das bandas foram muito maiores do que elas normalmente costumam cobrar. Os números que constam nos documentos, expedidos em 4 de março, mostram indícios de que os cachês foram superfaturados. O total chega a R$ 150 mil. Além dos altos preços, uma das bandas contratadas por Lúcio Carlos de Oliveira, um dos diretores da Administração Regional de Santa Maria, tem como guitarrista um irmão dele e é agenciada pelo seu filho. O administrador da cidade, Márcio Gonçalves, e Lúcio de Oliveira justificam que a escolha das bandas foi feita por meio de um edital de convocação, ;rigidamente cumprido;.
A programação carnavalesca em Santa Maria contou com a participação de cinco grupos de axé. Nenhum deles de sucesso nacional. A Mesh in Ville, banda integrada pelo irmão de Lúcio Carlos de Oliveira, recebeu R$ 28mil por um show de duas horas.
Sem se identificar, a reportagem entrou em contato com os músicos da Mesh in Ville e pediu um orçamento. Eles pediram R$ 7,5 mil para uma apresentação de cinco horas, quase 70% menos do que o pago pela administração. ;Não tem nada a ver o fato de o meu irmão ser membro da banda. Ele é um músico qualquer, que, às vezes, fica meses sem ganhar nada;, alegou Lúcio de Oliveira.
A diferença gritante de preços também foi constatada com a banda Obsessão, que, por uma performance de duas horas, ganhou R$ 32 mil. À reportagem, um dos integrantes do grupo, Fábio Pão, informou que eles costumam cobrar, em média, de R$ 2 mil a R$ 3 mil por apresentação.
Já o orçamento pedido pelo Correio aos conjuntos Minha Metade, Mitiê do Brasil e Moleke Show coincidiu com a quantia paga pela administração. Cada um recebeu, respectivamente, R$ 25 mil, R$ 35 mil e R$ 30 mil para se apresentar no carnaval da administração regional.
A empresa responsável pelas três bandas, a JBR Produções, esteve envolvida com superfaturamento de cachês na festa de aniversário de São Sebastião, ocorrida em junho do ano passado. O evento acabou cancelado por causa das supostas irregularidades (veja Memória).
Responsável por diversos eventos de axé em Brasília, o produtor musical Carlos Alberto Boca afirmou que os preços estão fora dos cobrados no mercado. ;Geralmente, uma banda local ganha, no máximo, R$ 5 mil;, garantiu. ;Pago R$ 25 mil quando trago um artista que faz muito sucesso em outras regiões do Brasil. Nesse cachê, estão inclusas as despesas com hospedagem, passagens e equipamentos;, ressaltou. O produtor contou ainda que contratou este ano um dos grupos da JBR por R$ 5 mil, R$ 30 mil a menos do que pagou a Administração Regional de Santa Maria.
Apenas cachês
Os R$ 150 mil gastos na festa se referem apenas aos cachês. Para montar a infraestrutura de palco, som e iluminação, o poder público desembolsou mais R$ 49.995. O administrador da cidade, Márcio Gonçalves, afirmou que os valores pagos aos artistas foram baseados no edital de convocação publicado em 15 de fevereiro. O documento exigia que as bandas apresentassem três contratos de eventos anteriores provando que o valor pedido é o de mercado. ;Estou respaldado por essas notas fiscais, que provam que não pagamos nada a mais;, afirmou.
A exigência da comprovação é ordem da Secretaria de Cultura do Distrito Federal, mas o próprio órgão admite que a regra não impede os pagamentos superfaturados, uma vez que as notas podem estar em dissonância com os preços cobrados no mercado. ;Estamos tentando criar outros métodos para quantificar os cachês dos artistas, porque muitos cobram mais caro quando é para o governo;, comentou o chefe da Unidade de Administração Geral da Secretaria de Cultura, Alexandre Rangel.
O valor usado na promoção do carnaval de Santa Maria estava previsto no orçamento da cidade e, segundo o administrador, se não fosse gasto na data prevista, o dinheiro teria que ser devolvido ao GDF. A Secretaria de Cultura, porém, explicou que, como a verba estava prevista no orçamento, a sobra de dinheiro poderia ser destinada a outra atividade cultural na cidade. ;A população de Santa Maria é carente, ninguém viajou no carnaval. Queríamos bandas que animassem o pessoal;, disse o administrador.