postado em 12/05/2011 07:00
Uma semana depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) estender a possibilidade de união estável para casais homossexuais, o entendimento continua causando impacto na sociedade e repercutindo nos mais diversos setores da sociedade. Os ministros do Supremo dizem que já estavam preparados para o tamanho reflexo ocasionado pelo posicionamento da Corte. Carlos Ayres Britto, relator do processo que resultou na histórica decisão, afirmou ontem ao Correio que a Suprema Corte tem a exata noção da dimensão do entendimento firmado na semana passada.Procurado pela reportagem, Ayres Britto disse que a imensa repercussão sobre o tema já era esperada pelos ministros, antes mesmo do término do julgamento. ;Tudo isso é esperado. No início, a gente estranha, mas depois a gente se acostuma;, afirmou. Segundo o relator, daqui para frente será uma situação comum se deparar com casais gays pleiteando direitos até então reconhecidos somente para heterossexuais.
;Virão casais homossexuais para se habilitar a concorrer para adotar uma criança, irão postular visita íntima nos presídios. Haverá também pessoas do mesmo sexo indo aos bancos para pedir financiamento de casa própria. Outros pedindo a declaração conjunta de Imposto de Renda. Já esperávamos toda essa repercussão. Aliás, foi para isso mesmo que decidimos dessa forma. Se tirássemos deles (casais gays) as consequências da decisão, o que sobraria seria a relação física, o que eles já têm;, observou o ministro.
No último dia 5, os ministros do STF decidiram por 10 votos a zero que companheiros homossexuais podem formar uma entidade familiar. Em seu extenso voto, proferido um dia antes, quando o julgamento foi iniciado, Ayres Britto ressaltou a importância de a sociedade afastar o preconceito. Segundo o ministro, a ;equiparação vale para todos os fins e efeitos;, portanto , não pode ser privilégio de alguns .
De acordo com o ministro Marco Aurélio Mello, que também se posicionou favorável à união homoafetiva, os demais tribunais, órgãos administrativos e também os cartórios estão obrigados a cumprir o entendimento do STF. ;Decisão do Supremo é para se cumprir. Todas as regras válidas para casais heterossexuais agora são aplicáveis também aos parceiros homossexuais;, alertou.
Partilha
Com base na decisão do STF que garante todos os direitos civis a casais homossexuais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou ontem, pela primeira vez, o precedente firmado pelo Supremo, ao conceder o direito a partilha a um homem que se separou do companheiro com quem viveu por 11 anos. Por maioria de votos, a Segunda Seção do STJ concluiu que as regras do direito da família podem ser aplicadas a casais homossexuais. No caso em questão, os patrimônios do casal estavam registrados no nome de apenas um deles. Após a separação, a parte que se sentiu prejudicada foi à Justiça. O homem, cujo nome não foi identificado por questão de sigilo, ganhou em primeira instância, na Vara de Família do Rio Grande do Sul, o direito à pensão alimentícia e também à partilha do patrimônio do casal.
Já o Tribunal de Justiça gaúcho manteve o entendimento referente à divisão patrimonial, mas retirou a pensão alimentícia. No recurso protocolado no STJ, o homem que ficou com os patrimônios buscava reverter a decisão que definiu a divisão dos bens, sob a alegação de que o caso não poderia ter sido julgado por uma vara de família.
Primeira a votar, ainda em fevereiro, a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, posicionou-se pelo reconhecimento de que há união estável entre casais homossexuais. ;O direito aos bens é de ambos, mesmo que registrado unicamente em nome de apenas um dos parceiros;, disse, na ocasião. Acompanharam o voto da relatora os ministros João Otavio Noronha, Luiz Felipe Salomão e Aldir Passarinho Junior, enquanto Sindnei Benetti e Vasco Della Giustina foram contra.
Na retomada do julgamento, ontem, o ministro Raul Araújo, que havia pedido vista do processo, seguiu o voto da relatora, alertando para o caráter vinculante do entendimento firmado na última quinta-feira pelo STF. Também seguiram o voto favorável aos casais gays os ministros Isabel Gallotti e Sidnei Beneti. Assim, o STJ manteve o posicionamento da Justiça gaúcha. ;A negação aos casais homossexuais dos efeitos inerentes ao reconhecimento da união estável impossibilita a realização de dois dos objetivos fundamentais de nossa ordem jurídica, que é a erradicação da marginalização e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;, disse a ministra do STJ Nancy Andrighi.