Cidades

Regras rígidas e custo alto levam cirurgias para Goiás

Helena Mader
postado em 22/05/2011 07:17
Brasília tem normas rigorosas para a realização de cirurgias plásticas, que exigem salas amplas, profissionais qualificados e suporte para o paciente. As novas regras, editadas em julho do ano passado, deixaram os procedimentos mais seguros. Desde então, nenhum paciente morreu em decorrência de operações estéticas no Distrito Federal. Mas a adaptação das clínicas de Brasília fez o preço das plásticas crescer cerca de 30%. Esse aumento dos valores cobrados aqueceu o mercado do turismo de cirurgia e levou centenas de pacientes a buscar médicos em outros estados, principalmente em Goiás. Alguns profissionais da capital também trocaram a cidade por clínicas no Entorno, que viram o movimento crescer rapidamente nos últimos meses.

O preço não é o único fator que leva brasilienses a procurar centros especializados fora da cidade, mas é um dos principais atrativos. A maioria das pessoas que busca cirurgias em outros estados também se preocupa com a qualificação do médico e com a infraestrutura das clínicas. Em Goiânia (GO), por exemplo, há hospitais com excelente infraestrutura para a realização de operações. Mas há pacientes que abrem mão da segurança em troca de orçamentos muito abaixo dos preços de mercado. Em alguns casos, os cirurgiões que derrubam os valores e operam fora de Brasília não têm nem sequer título de especialização e fazem os procedimentos em locais sem nenhuma segurança. Pelo menos duas brasilienses morreram no ano passado, depois de se submeterem a procedimentos no estado vizinho (leia Memória).

A esteticista Anilda Xavier não encontrou no DF orçamentos que coubessem no bolso dela. Realizou, então, cirurgias plásticas em Goiás, mas com um médico que atende em BrasíliaA esteticista Anilda Alves Xavier, 45 anos, procurou três médicos no Distrito Federal antes de optar por uma cirurgia plástica em outra cidade. Ela buscou vários orçamentos aqui, mas não encontrou nenhum que se adequasse ao seu bolso. Para fazer abdominoplastia (retirada de excesso de pele e gordura do abdômen), lipoaspiração, colocar silicone e enxertar gordura nos glúteos, optou por um hospital de Goiânia.

O médico que realizou a cirurgia da esteticista atende no DF, mas opera em Goiás, onde os custos das clínicas e dos hospitais são muito mais baixos. ;Economizei quase R$ 5 mil fazendo a plástica em Goiânia. É claro que levei o preço em consideração, mas também peguei muitas referências sobre o médico, porque jamais colocaria a minha vida em risco;, comenta Anilda. As consultas de revisão e o pós-operatório foram feitos no consultório do profissional em Brasília. ;Goiânia é aqui do lado, são apenas três horas de viagem. Acho que vale pela economia;, acrescenta a esteticista, que permaneceu em Goiânia por três dias após a operação e depois retornou a Brasília.

Termo de compromisso
As normas que deixaram as cirurgias plásticas mais seguras ; e mais caras ; no Distrito Federal fazem parte de um termo de compromisso assinado há 10 meses por representantes do Ministério Público do Distrito Federal, da Vigilância Sanitária, das clínicas e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. As regras dividem os estabelecimentos hospitalares em quatro tipos (leia quadro na página seguinte).

Não há nenhum levantamento preciso sobre o número de procedimentos realizados todos os anos no Distrito Federal. Hoje, existem cerca de 150 cirurgiões plásticos com títulos de especialistas atuando em Brasília. Cada um realiza, em média, entre seis e 10 cirurgias por mês. Com isso, é possível estimar que são realizadas pelo menos 900 operações na capital federal mensalmente ; ou mais de 10 mil por ano. Esse número pode ser muito maior, já que há médicos que operam quase 20 pacientes por dia. Lipoaspiração e aumento de seios estão entre os procedimentos mais procurados.

O vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Ognev Cosac, critica alguns pontos do termo de compromisso firmado com o Ministério Público do DF, como a exigência de que as salas das clínicas tipo 3 tenham pelo menos 25m;. ;Isso inviabilizou boa parte das clínicas e foi uma medida equivocada, porque não é o tamanho da sala de cirurgia que vai deixar o procedimento mais seguro, mas, sim, um conjunto de elementos;, comenta.

Ele conta que as adaptações deixaram o custo das clínicas de 20% a 30% mais alto. ;Só o contrato com a UTI móvel custa cerca de R$ 800 por mês, mesmo que não haja utilização. Um oxímetro custa R$ 8 mil. Os equipamentos que fazem a gravação da monitorização saem por cerca de R$ 20 mil. Todas as clínicas que fazem o procedimento de anestesia tiveram que acrescentar isso aos seus orçamentos;, explica o cirurgião. A clínica onde ele trabalha é classificada como tipo 2, mas já estão sendo feitos projetos de ampliação das salas para mudar a classificação para o tipo 3.

Para Ognev Cosac, o aumento dos custos é uma das razões que levaram ao crescimento do fenômeno do turismo de cirurgia. ;Em busca de preços mais baixos, alguns pacientes saem de Brasília para operar em Valparaíso, Anápolis, Luziânia ou Goiânia, onde as clínicas não têm que seguir as mesmas exigências daqui. O turismo de cirurgia cresceu demais, mas acredito que as pessoas têm que levar em consideração, em primeiro lugar, a segurança;, finaliza.

Riscos
O promotor de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde, Diaulas Ribeiro, critica o crescimento do fluxo de pacientes em busca de cirurgias nos municípios vizinhos. ;Quem disse que cirurgia plástica tem que ser barata? Ela precisa ser segura e é isso que implantamos aqui em Brasília;, comenta Diaulas, que elaborou as regras do termo de compromisso firmado com as clínicas.

;A paciente vai para outra cidade, faz várias operações e, no dia seguinte, já quer voltar para Brasília para não ter que gastar diária de hotel. As pessoas precisam saber como é grande o risco que estão correndo;, alerta o promotor. Ele menciona o caso da assessora do Ministério das Cidades Kelma Macedo, brasiliense que fez três cirurgias delicadas em um hospital de Goiânia, em abril do ano passado. No dia seguinte, ela pegou a estrada e voltou para Brasília. Teve embolia pulmonar e morreu uma semana após o procedimento. ;Essa cirurgia exige 15 dias de repouso. E em menos de 24 horas, a Kelma já estava na estrada, sentada em posição inadequada;, relembra Diaulas.

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