Cidades

Sem demissão publicada no Diário Oficial, Bandarra volta ao trabalho

Ana Maria Campos
postado em 02/06/2011 07:24

Duas semanas depois de ter a demissão aprovada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o ex-procurador-geral de Justiça do Distrito Federal Leonardo Bandarra retornou ontem ao trabalho e recebeu um lote de processos na área criminal. A situação inusitada decorre de burocracia. O conselheiro Luiz Moreira, relator do processo administrativo disciplinar que concluiu pela participação de Bandarra em crimes de concussão (quando um agente público usa o cargo para obter algum benefício pessoal), corrupção, vazamento de informações e extorsão, ainda não encaminhou a decisão, tomada no último dia 17, para publicação no Diário da Justiça. Dessa forma, as penas administrativas ainda não estão em vigor.

Desde que deixou o cargo de chefe do Ministério Público do DF em junho do ano passado, Bandarra passou a atuar na 13; Promotoria Criminal, onde tem a atribuição de apresentar denúncias perante a Justiça e acompanhar ações penais em tramitação.
Ex-procurador-geral de Justiça do DF, Bandarra atua na 13ª Promotoria Criminal do Ministério Público
Neste ano, Bandarra ainda não havia trabalhado, uma vez que esteve afastado compulsoriamente do cargo por força de decisão do plenário do CNMP. Quando essa determinação venceu, em abril, ele entrou com pedido de férias. Agora, está à disposição do trabalho. O promotor recebeu processos que deram entrada no Ministério Público na última terça-feira.

Quando o acórdão do CNMP for publicado, Bandarra e a promotora de Justiça Deborah Guerner terão os salários de R$ 25,7 mil bloqueados. Enquanto isso, manterão todas as prerrogativas do cargo. Por decisão do CNMP, eles deverão ser punidos com a suspensão do trabalho e demissão. Primeiro, ficarão afastados da função temporariamente pelo período de 60 dias por supostamente terem pedido ao ex-secretário de Relações Institucionais do DF Durval Barbosa que retirasse da internet, com a ajuda de hackers, uma nota com conteúdo ofensivo.

Bandarra ainda foi condenado a 90 dias de suspensão sob a acusação de influenciar no trabalho do promotor Mauro Faria de Lima, em 2009, quando ele se preparava para ajuizar uma denúncia de peculato contra o então comandante-geral da Polícia Militar (PM), Antônio Cerqueira. Ele é acusado de advocacia administrativa, com o promotor Nísio Tostes, da Auditoria Militar. Ambos negam qualquer interferência na atuação do colega.

No período em que durar a suspensão de Bandarra, um integrante do Ministério Público Federal, a ser designado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deverá protocolar na Justiça uma ação por perda do cargo contra Bandarra e Deborah. Enquanto tramitar a ação, eles permanecerão impedidos de trabalhar e sem receber salários. Mas tudo isso só poderá ocorrer a partir da publicação da decisão do CNMP. Nem mesmo os advogados dos promotores poderão protocolar os recursos no próprio conselho e depois no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar reverter a decisão relacionada à demissão.

A assessoria do CNMP informou ontem que não há previsão para publicação do acórdão. Segundo o Correio apurou, Luiz Moreira ainda não recebeu o voto do conselheiro Achiles Siquara que pediu vista no julgamento ocorrido em 6 de abril e apresentou posição pela absolvição de Bandarra na sessão de 17 de maio. Siquara foi o único voto a favor de Bandarra, contra a posição de outros nove conselheiros. No caso de Deborah Guerner, o placar foi unânime pela demissão.

Advogada de Bandarra, Gabriela Bemfica disse ontem que Bandarra se apresentou para trabalhar porque as férias que havia tirado terminaram na última terça-feira. ;Bandarra se colocou à disposição para trabalhar, conforme conveniência do Ministério Público. Não há outra coisa a fazer, uma vez que não existe suspensão em vigor e ele não poderia se ausentar do trabalho;, explicou a advogada.

Consulta
A procuradora-geral de Justiça do DF em exercício, Zenaide Souto Martins, enviou ao CNMP uma consulta sobre como proceder neste caso. A promotora Deborah Guerner não retornou ao cargo porque está de licença médica. Existe um questionamento do Ministério Público sobre a veracidade da alegada doença de Deborah, mas o caso vem sendo ainda discutido em incidente de insanidade mental em julgamento no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1; Região. O assunto começou a ser analisado na sessão do dia 19 de maio, mas o julgamento foi suspenso por pedido de vista da desembargadora federal Ângela Catão. Enquanto isso, Deborah se baseia em atestados médicos para não trabalhar.

Bandarra nega participação nas denúncias feitas por Durval Barbosa em depoimentos prestados nas investigações da Operação Caixa de Pandora. Ele afirma ser vítima de um complô produzido com o objetivo de prejudicá-lo por causa de seu trabalho à frente do Ministério Público. De acordo com seus advogados, não existem provas diretas do envolvimento dele nos crimes descritos no CNMP e pelo MP na Justiça.

Na Justiça
Essa acusação é discutida também na esfera criminal. Bandarra e o promotor Nísio Tostes, da Auditoria Militar, foram denunciados pelo procurador regional da República Ronaldo Albo. A denúncia foi recebida por maioria no plenário do Corte Especial do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1; Região. A defesa de Bandarra deve entrar com um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar trancar a ação penal.

Longa lista de acusações

; Leonardo Bandarra e Deborah Guerner são acusados de terem se desvirtuado e usado os cargos para a prática de crimes. As primeiras denúncias contra o ex-procurador geral de Justiça do Distrito Federal e a promotora foram publicadas no blog do jornalista Roberto Kuppê. Segundo o blogueiro, a dupla tentava beneficiar empresas em contratos de coleta lixo na capital da República.

; Irritados com a acusação, Deborah e Bandarra teriam procurado, por intermédio da servidora Cláudia Chagas, o então secretário de Relações Institucionais do DF Durval Barbosa. Em depoimento, o delator da Caixa de Pandora confirmou ter sido contatado pelos promotores para tirar a nota do ar de forma ilícita. Para tanto, teria contado com a ajuda de dois técnicos da Codeplan.

; Com a aproximação, eles teriam criado um relacionamento de cumplicidade. Em troca de propina, Deborah e Bandarra teriam vazado detalhes da Operação Megabyte a Durval, um dos alvos de ação policial de busca e apreensão. Além disso, a dupla de promotores é acusada de tentar extorquir José Roberto Arruda. De posse de vídeo no qual o ex-governador aparece recebendo dinheiro de Durval, eles teriam cobrado R$ 2 milhões para não divulgar as imagens. Em depoimento, Arruda confirmou a chantagem.

; Por conta das denúncias, o Ministério Público e a Polícia Federal cumpriram mandatos de busca na residência do casal Guerner, onde apreenderam documentos, dinheiro e vídeos de cofre instalado em um bunker escondido no jardim da casa. Em junho de 2010, o CNMP abriu processo administrativo disciplinar contra os dois promotores. No fim do ano passado, os conselheiros decidiram afastar Bandarra e Deborah das funções por 120 dias.

; O julgamento do caso foi iniciado em 6 de abril deste ano, mas foi interrompido diante de pedido de vista. Antes da retomada da sessão, Deborah acabou presa por fraude processual e o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1; Região recebeu denúncia contra Bandarra e Nísio Tostes por advocacia administrativa. Os dois teriam pressionado, em 2009, o promotor Mauro Faria a não denunciar o então comandante-geral da Polícia Militar do DF, coronel Antônio Cerqueira.

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