Ana Maria Campos
postado em 05/06/2011 08:16
Um negócio altamente rentável, raiz de sucessivos escândalos na última década, volta a se tornar alvo de cobiça e lobby na capital do país. O governo de Agnelo Queiroz (PT) se prepara para lançar o edital para construção e operação do aterro sanitário que vai receber o lixo do Distrito Federal, um projeto estimado em R$ 30 milhões ao ano. Técnicos também discutem a forma de tratamento final dos resíduos da construção civil e de entulhos, um modelo que poderá abrir o mercado para usinas de reciclagem, outra possibilidade de lucro garantido pelo volume do lixo produzido com potencial de ser industrializado e revendido.Pela importância do assunto, a discussão saiu da esfera exclusiva da Secretaria do Meio Ambiente e do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) e passou a ser tratado como interesse de Estado, sob a coordenação do secretário de Governo, Paulo Tadeu. Está em jogo a destinação final de 9 mil toneladas de resíduos por dia, sendo 3 mil toneladas do lixo produzido nas residências e o restante oriundo de canteiros de obras e de restos de construções. Na última década (veja quadro), apenas com coleta, varrição e transporte dos resíduos enviados para o lixão a céu aberto do Jóquei Clube, próximo à Estrutural, o Governo do DF aplicou cerca de R$ 1,8 bilhão.
Agora o sistema vai se tornar mais complexo e caro com a destinação final dos resíduos, ampliando os interesses do mercado do lixo. ;Por determinação do governador, estamos discutindo toda a política de resíduos sólidos num comitê com representantes das secretarias relacionadas. É uma forma de coordenar as ações para que sejam adotadas de forma eficiente, num debate com a sociedade e com aval do Ministério Público e do Tribunal de Contas do DF;, afirma Paulo Tadeu.
Indecisão
Um dos primeiros cabos de guerra na discussão é o modelo a ser adotado pelo GDF. O governo anterior deixou concluído o estudo para concessão do aterro sanitário e também o edital de licitação. As regras estão previstas no Programa Brasília Sustentável, financiado com recursos do Banco Mundial (Bird). A tendência é que a administração de Agnelo mantenha essa forma, mas o governador ainda não anunciou uma decisão oficial. Empresários influentes têm procurado integrantes do governo para apresentar os prós e os contras. É provável que as empresas que hoje atendem o GDF ; a Delta Construções e a Valor Ambiental ; disputem o negócio.
Caso a opção seja por concessão, uma concorrência definirá a empresa que vai arcar com o custo da obra, tendo o direito de explorar o aterro, a ser implantado em Samambaia. O governo pagará uma tarifa pela prestação do serviço por tonelada de lixo. Vence a licitação quem apresentar o menor preço, desde que atenda às qualificações exigidas no edital. Outra opção à disposição do governador é o investimento, com recursos próprios, na construção do aterro e depois terceirização da operação, de forma que o sistema fique sob o controle do GDF. Nesse caso, o governo pode a qualquer momento alterar a tecnologia adotada e entregar os serviços a outra empresa, se considerar conveniente. O Poder Público, no entanto, terá de desembolsar em dois anos todo o custo da obra ; algo em torno de R$ 250 milhões.
Até agora, a concessão é considerada no Palácio do Buriti a forma mais viável, mas uma corrente do governo ainda luta contra esse modelo. Na hipótese da concessão, ainda há ajustes, como o prazo em que a concessionária poderá lucrar com o lixo. A iniciativa privada poderia explorar o empreendimento por 13 anos, mas empresários defendem um prazo maior, de 30 anos, renováveis por igual período. Existe ainda uma demanda para que o responsável pelo aterro sanitário receba também o entulho da construção civil para transformá-lo e comercializá-lo.
Além da tarifa, a concessionária poderá faturar com o aproveitamento do biogás produzido no aterro como fonte de energia. Pela ideia original, o aterro sanitário não receberá os resíduos da construção civil. Essa parte será disciplinada em projeto de lei a ser encaminhado ainda neste semestre para a Câmara Legislativa e que deve despertar lobbies de interesses variados. De acordo com o diretor-geral do SLU, João Monteiro, o projeto praticamente definido é o de que o entulho seja entregue a pequenas usinas distribuídas em regiões administrativas. Esses empresários não cobrariam pela destinação, mas poderiam faturar alto com a venda do produto reciclado. Foi o que ocorreu, por exemplo, com o entulho do Mané Garrincha, enviado a uma fábrica em Sobradinho.
História antiga
A construção do aterro sanitário já estava prevista no edital de licitação para a terceirização dos serviços de limpeza urbana em 2000, mas nunca foi viabilizada. A empresa Enterpa, que venceu a licitação, depois transformada em Qualix, alegava que o GDF não disponibilizou a área para a construção do aterro. Enquanto isso, todo o lixo do DF é despejado no Lixão da Estrutural, provocando há décadas danos ambientais.
A exploração do aterro também foi debatida no fim do contrato entre o GDF e a Qualix, em 2006. Por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público, o Executivo pretendia entregar para a Construtora WRJ a obra do aterro, sem prévia licitação. O debate é a origem do escândalo que provocou investigações contra o ex-procurador-geral de Justiça do DF Leonardo Bandarra e a promotora Deborah Guerner. O caso ainda está sob apuração no Ministério Público Federal.
Briga
A última licitação para coleta de lixo, realizada em 2007, provocou uma grande disputa judicial. A Delta Construções, que presta serviços desde o fim do ano passado, só conseguiu entrar no negócio por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao derrotar a Qualix que havia sido declarada vitoriosa pela comissão de licitação doServiço de Limpeza Urbana (SLU), apesar de ter apresentado preço mais baixo.