postado em 04/07/2011 07:26
Um duelo entre consumidores e anunciantes. Essa pode ser a impressão de quem se depara com o número de processos movidos contra campanhas publicitárias em 2010. Dos 376 questionamentos e pedidos de intervenção levados ao Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar), os de autoria da população representam 43% do total. O equivalente a 163 documentos. Nem mesmo as representações de empresas concorrentes são tão volumosas, elas atingem apenas 29% do total ou 108 pedidos de análise.O motivo de tanta desconfiança por parte do público está na frequência com que anúncios da televisão, por exemplo, usam letras miúdas no canto da tela. As frases passam tão rapidamente que é praticamente impossível saber o que estava escrito. Esse tipo de prática, que omite a informação, na realidade, serve mais para enquadrar a campanha nas exigências estipuladas pela legislação do que para informar quem está assistindo. Outro problema está na promessa de benefícios irreais, como pílulas de emagrecimento ou antídotos contra queda de cabelo, as conhecidas propagandas enganosas.
A quantidade de reivindicações populares no conselho mostra que o cidadão percebe o uso dos artifícios publicitários e se incomoda. Ainda assim, advogados ressaltam que não é raro encontrar uma vítima da falta de informação. Por isso não é preciso apenas estar de olho na tela ou nas condições impressas abaixo de uma foto chamativa, mas nas regras que são apresentadas no momento de fechar negócio.
O coordenador do curso de publicidade e propaganda do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), Nicolas Caballero, explica que a propaganda, durante muitos anos, foi acusada de manipulação total, mas que a ideia caiu por terra com as novas teorias da comunicação. ;A publicidade é negociada com o público alvo. Se eu compro um produto e ele não me atende, por mais que a propaganda tente me convencer do contrário, eu não vou aceitá-lo. A gente sabe que as campanhas publicitárias incentivam o consumo, e sobre isso não há dúvidas;, diz.
Omissão
Ainda que não exista a persuasão livre de julgamentos, o professor de direito do consumidor do UniCeub, José Galvão, afirma que a publicidade enganosa, por meio da omissão de detalhes é a mais comum atualmente e afeta diretamente as escolhas. ;Todos estamos sujeitos a isso e não é possível individualizar o problema. Por isso, cabe ao Ministério Público ou ao Conar tomar conta dos casos e investigar, o que não exclui a possibilidade de denúncias pelo cidadão.; No entanto, quando a ilusão criada é decisiva na hora da compra e prejudica o cliente, a reparação deve ser pedida caso a caso. ;Pode-se exigir o cumprimento em juizo, aceitar a substituição por um item ou serviço equivalente ou ainda rescindir o contrato, pedir o dinheiro de volta e pleitear perdas e danos;, recomenda.
Para a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor Mariana Ferraz o direito à informação, assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor, é um dos princípios que deveria nortear qualquer anúncio. Por isso se faz imprescindível apresentar durante uma campanha qual a utilidade do objeto, o preço, as características e os riscos envolvidos. ;Se algum desses pontos estiverem confusos, é necessário reivindicar. Além disso, é preciso estar atento à má-fé e aos mecanismos ilusórios aplicados para vender o que não está anunciado.;
Bula
Parte do problema também está nas exigências criadas pela própria legislação. Algumas regras, criadas sob o pretexto de facilitar o entendimento, aumentam exageradamente a lista de
informações obrigatórias para o período extremamente curto de uma publicidade. ;A função não é servir de bula, mas despertar interesse. Em São Paulo há uma lei municipal para incluir nos lançamentos imobiliários o nome do escritório de arquitetura que fez o projeto;, conta Edney Narchi, vice-presidente executivo do Conar. ;Isso não é necessário nem relevante. Certamente um lobby dos escritórios para ter o nome
veiculado sem gastar um tostão;, queixa.
Narchi também defende que os principais questionamentos levantados pelos consumidores tratam sobre a honestidade ou legalidade das propagandas veiculadas nos meios de comunicação. Uma análise mais aprofundada dos índices de reclamação, para o porta-voz do Conselho, mostra que o número de processos ainda não atingiu níveis alarmantes. Para ele, as agências publicitárias estariam, na média, bem adaptadas às regras brasileiras de anúncio.
Entretanto, o vice-presidente do Conar também defende que o fato de a empresa seguir as regras não dispensa os futuros clientes da marca de lançarem um olhar apurado e cauteloso ao avaliar o produto exposto. ;É preciso submeter toda informação à massa crítica. Principalmente porque é um posicionamento parcial, vindo de um comerciante que, como nós todos sabemos, está interessado em vender;.