Helena Mader
postado em 09/07/2011 08:00
Muitos criticam o tombamento de Brasília com o argumento de que a legislação engessa o crescimento da cidade. Outros defendem a preservação da capital com tamanho fervor que não aceitam sequer mudanças essenciais para a manutenção da qualidade de vida dos brasilienses. Diante de opiniões tão diversas, o grande desafio é buscar saídas aos inegáveis problemas da área tombada ; como os puxadinhos e invasões de área pública ; sem alterar o projeto original de Lucio Costa. Para buscar essa solução, representantes do governo e da comunidade vão se reunir na manhã de hoje em audiência pública que vai debater o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB). O projeto de lei, que deve ficar pronto até o fim do ano, vai estabelecer novas diretrizes de ocupação em regiões como Plano Piloto, Candangolândia, Cruzeiro e Sudoeste.
Mas a elaboração da nova lei já inflama os ânimos, principalmente da comunidade das quadras 700 da Asa Sul. Durante audiências públicas anteriores, surgiram propostas para mudar a destinação dessas áreas, que atualmente só podem ser ocupadas por residências. Apesar das restrições legais, escritórios de advocacia, salões de beleza e, principalmente, pousadas, sempre funcionaram irregularmente nas 700. Agora, alguns empresários querem aproveitar as discussões sobre o PPCUB para tentar emplacar a mudança de destinação, abrindo as portas para a instalação de comércio.
O assunto motivou uma enorme mobilização, já que a maioria dos moradores é contra. O administrador de empresas Amilton Figueiredo, 57 anos, prefeito comunitário da 705 Sul, percorreu as casas da quadra para colar um recado aos vizinhos. No papel afixado na porta das residências, ele chama os moradores para participar da audiência pública desta manhã. ;A lei diz que as quadras 700 são unicamente para residências unifamiliares. Não vamos tolerar os comércios aqui;, garante Amilton.
A aposentada Ana Girão, também moradora da 705 Sul, engrossa o coro. ;Isso vai permitir a volta das pousadas, que sempre foram nosso grande motivo de reclamações. Elas abrigam criminosos, traficantes e prostitutas, tirando o sossego de toda a comunidade;, critica. A reação acirrada de moradores da região e a posição contrária a eventuais mudanças são alvos de críticas do arquiteto e professor da Universidade de Brasília (UnB) Frederico de Holanda. Ele entrou na polêmica, aquecida por trocas de e-mails entre pessoas contra e a favor da proposta. ;Acho tudo isso muito contraditório porque as pessoas falam alto para defender o tombamento, mas as 700 estão cheias de irregularidades, como cercas em áreas públicas e altura acima do permitido;, destaca.
Mudança
O governo vai analisar a proposta. ;O Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) determina que façamos essa discussão sobre a possibilidade de instalação de comércio nas quadras 700;, explica o secretário de Habitação, Geraldo Magela. ;Particularmente, acho que não se deve tratar as Asas Sul e Norte da mesma forma e sei que a maioria da comunidade é contra. Isso será levado em conta;, diz.
O superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Alfredo Gastal, também defende o debate. ;As pessoas ficam com essa relação umbilical com o Plano Piloto e esquecem que estão no meio de uma região metropolitana com mais de 2,5 milhões de pessoas. O que ameaça a preservação da cidade é a absoluta falta de planejamento urbano;, afirma. ;Não se pode ficar com esse radicalismo absoluto, com essas atitudes xiitas. A cidade não é uma múmia paralítica e nem Lucio Costa via Brasília dessa maneira. É preciso enfrentar os problemas e buscar soluções por meio do debate e o PPCUB é um bom instrumento para dar mais vitalidade à cidade;, finaliza Gastal.
Participe
A plenária para debater o PPCUB será realizada hoje, no Museu Nacional da República. Pela manhã, participarão moradores do Plano Piloto, Vila Planalto e Telebrasília. À tarde, reúne-se a comunidade do Cruzeiro, Sudoeste e Octogonal.
Novas diretrizes
O Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília funcionará como uma espécie de plano diretor da área tombada da capital federal. O texto será transformado em um projeto de lei, que deverá ser submetido à Câmara Legislativa. O trabalho de preparação do PPCUB está sendo elaborado por uma empresa privada, escolhida por meio de licitação pública. Os técnicos realizaram vistorias em todos os pontos da área tombada, identificando irregularidades e analisando possíveis soluções. Agora, será feito um levantamento por meio de fotos de satélite.