Jornal Correio Braziliense

Cidades

DF é o sétimo no país com o maior número de pessoas que vivem sozinha


A individualidade e a independência observadas na rotina de Brasília não se refletem apenas na geografia urbana, nos monumentos e nos traçados da capital do Brasil, mas também no estilo de vida dos habitantes. Entre as 27 unidades da Federação, o Distrito Federal é a sétima região onde há mais pessoas que moram sozinhas. Dos mais de 774 mil domicílios, 12,67% têm apenas um inquilino.

O número supera a média nacional, de 12,18%. Abaixo, aparecem estados populosos, como São Paulo e Santa Catarina.


Pela primeira vez em toda a série histórica, é mais comum encontrar um só indivíduo por residência do que unidades habitacionais com cinco moradores (11,53%). Os dados são do Censo Demográfico 2010, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (veja arte).

Os motivos que levam alguém a morar sozinho são variados. E a culpa não é das longas distâncias ; catalisadores do isolamento de algumas pessoas ; nem da quantidade de espaços vazios no cenário da metrópole. A alta renda per capita, a baixa taxa de fecundidade, o crescente fluxo de migrantes pela capital e a longevidade contribuem para o desenho desse quadro.

Especialistas ouvidos pelo Correio ponderam que o perfil dos solitários não se restringe àqueles que migram de outros estados em busca de trabalho e estudo. Tampouco é composto de pessoas sem vínculos sociais ou familiares. É cada vez mais comum tratar-se de uma opção, impulsionada pelo desejo de privacidade.

Para o publicitário Douglas Silveira, 32 anos, viver sozinho é uma questão de escolha. Há quatro anos, ele mora em Brasília, numa quitinete de 40 metros quadrados, no Sudoeste. Veio para a capital, após passar 28 anos no Rio de Janeiro. Diante de uma proposta de trabalho, ele alçou a primeira experiência fora da cidade natal, como sempre sonhou.

Para ele, não dividir o apartamento com outras pessoas nunca será encarado como solidão. ;Para mim, é muito prazeroso ter a possibilidade de saber que, ao chegar em casa, vou poder ficar comigo mesmo. E que só encontrarei pessoas caso opte por isso;, esclarece.

Mudança
Em amostras coletadas pelo IBGE nos censos de 2000 e de 1991, a realidade era oposta à atual. No recorte obtido na década de 1990, por exemplo, os domicílios com cinco moradores superavam em muito aqueles com apenas um. Eram 42 mil a mais. Dez anos depois, embora a diferença tivesse diminuído, ainda era grande o abismo entre os índices. Enquanto cerca de 51 mil pessoas moravam sozinhas no DF, 85 mil domicílios abrigavam cinco pessoas.

A supervisora de Divulgação de Informações do IBGE no DF, Sônia Baena Maciel, explica que a queda nos números de residência com cinco indivíduos nesses quase 20 anos pode ser explicada, entre outras coisas, pela diminuição na taxa de fecundidade. ;Quanto menor o número de filhos, menores são as famílias. O maior poder aquisitivo, aliado à alta escolaridade, favorece a opção de morar sozinho;, avalia.

O economista Roberto Piscitelli sugere tratar-se de um público variado. Dentro da análise, ele cita os jovens que veem para o DF em busca de estudo e trabalho.

;Eles ficam na cidade transitoriamente. São pessoas iniciando a vida, que ainda não se fixaram regularmente e que, muitas vezes, vivem precariamente, em quitinetes. Temos também aqueles que moram sozinhos por conveniência. Nesse caso, não podemos nos esquecer dos flats, que não devem estar no cálculo.;

Idosos
A longevidade do brasiliense também influencia os dados. Atualmente, a expectativa de vida das mulheres na capital é de 79 anos, como aponta a demógrafa Ana Boccucci. Ela também cita a baixa taxa de fecundidade como uma das responsáveis pela reversão do panorama. Segundo ela, em Brasília, esse número é de 1,8%, o que reflete em encolhimento dos núcleos familiares. ;Há muitos idosos morando sozinhos no DF. O Lago Sul é um local da cidade onde existem pessoas mais velhas, que já criaram os seus filhos.;

O aposentado José Wilson da Silva, 60 anos, afirma que o curso da vida o levou a morar sozinho. Após dois casamentos desfeitos, ele decidiu se aventurar. A paraplegia, fruto da poliomielite que teve na infância, segundo ele, não é impedimento para a independência. A casa onde mora, no Gama, tem cinco cômodos.

José Wilson preferiria morar com a família. Ele tem uma filha, fruto do primeiro casamento. Mesmo assim, não gosta de ser taxado como solitário. ;Só são sozinhos aqueles que querem ser. As pessoas com limitações físicas também podem morar sem ajudantes;, enfatiza.


PALAVRA DE ESPECIALISTA
Independência financeira
;Há muitas razões que levam as pessoas a morarem sozinhas atualmente. Como um primeiro enfoque, podemos ressaltar que Brasília é a cidade dos concursos públicos e há um exôdo muito grande. Com uma renda melhor, as pessoas têm condições de comprar um imóvel. Outra percepção é que Brasília era considerada há alguns anos a capital brasileira das separações. Também podemos citar a construção de imóveis pequenos em profusão na cidade. Em nível social, observamos que as pessoas estão se casando depois de atingirem um certo grau de maturidade, e isso significa mais tarde. Há duas décadas, por exemplo, as meninas se casavam com 20 anos. Hoje, as pessoas querem se formar, ter uma independência financeira. Existe um maior grau de egocentrismo e o nível de exigência também aumentou. O jovem se apaixona e se casa, mas a pessoa mais madura se torna seletiva. Sem contar que, quem já viveu sozinho, adquiriu um monte de manias. As pessoas hoje têm outras preferências e interesses, e não só constituir família. Podemos pensar na internet também. Hoje, as pessoas têm um contato virtual incrível. Apesar de fugir do contato real, não vejo isso como um isolamento, é mais uma opção. A vida se tornou mais prática também e isso fez com que as pessoas consigam viver tranquilamente sozinhas sem a necessidade de se ter alguém em casa com elas.;
Alexandre Marques, psicólogo particular