Depois de muita polêmica com moradores de condomínios e com cooperativas habitacionais, a Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) decidiu cancelar a licitação para a venda de 151 lotes, marcada para amanhã. A empresa alegou que suspendeu a concorrência pública para adequar o edital a exigências do Tribunal de Contas do Distrito Federal. Mas, nos bastidores, havia muita pressão política contra a venda. O edital incluía lotes vazios em condomínios do Setor Jardim Botânico e a comunidade do bairro fez até carreatas para reclamar da licitação. Cooperativas habitacionais também ameaçavam ir à Justiça contra a venda de projeções no Guará. As associações alegam que a área é de interesse social e, por isso, deve ser destinada a pessoas de baixa renda na fila de espera por moradia.
Na região do Jardim Botânico, o edital da Terracap incluía 20 lotes nos condomínios Portal do Lago Sul, Estância Jardim Botânico, San Diego e Mansões Califórnia. Eles fazem parte da etapa 1 do Setor Jardim Botânico, cujos imóveis residenciais ocupados foram vendidos diretamente aos moradores em 2007. Na época, os ocupantes pagaram cerca de R$ 80 mil por lote de 800 metros quadrados, valor muito inferior ao estipulado agora pelo governo. Os valores fixados na concorrência da Terracap variavam entre R$ 424 mil e R$ 648 mil.
A licitação de lotes vazios é uma determinação do Ministério Público do DF, que vem pressionando o governo para resolver o problema desses terrenos. Um Termo de Ajustamento de Conduta assinado entre o MP e o GDF determina que a venda direta vale apenas para os imóveis ocupados para fins residenciais, ou seja, terrenos vagos ou comerciais têm que ser licitados. Mas, logo depois do lançamento do edital de licitação incluindo lotes vazios do Setor Jardim Botânico, a reação da comunidade foi grande. Quem pagou pelos imóveis no passado reclama de ter que comprar novamente as áreas, por preços considerados altos.
O diretor de Desenvolvimento e Comercialização da Terracap, José Raimundo Santos Lima, afirma que a decisão de suspender a licitação prevista para amanhã foi tomada unicamente para atender a uma série de recomendações do TCDF. A corte pediu à Terracap que inclua no edital detalhes sobre os lotes que estão obstruídos, com informações sobre o tipo de edificação que existe no local. ;O Tribunal também pediu que enviássemos laudos de avaliações do lote. Tudo isso já foi feito e na próxima licitação vamos colocar esses terrenos novamente à venda, com exceção dos imóveis do Setor Jardim Botânico. Nesse caso, a decisão será do governo;, explica Raimundo. Os imóveis incluídos no edital de junho, que também havia sido suspenso pela mesma razão, serão colocados à venda no próximo certame, com os 131 terrenos que deixarão de ser licitados amanhã.
Ocupados
A Terracap pode vender lotes públicos que tenham sido ocupados irregularmente. Nesse caso, a empresa tem que informar o participante da licitação sobre esse contratempo. O comprador tem que indenizar quem construiu a edificação no local e fica responsável pela desocupação do imóvel. A partir de agora, o governo terá que incluir nos editais detalhes sobre o tipo de construção que existe no lote. Fotos da área serão incluídas no site da Terracap.
Cobrança dos moradores
Além dos lotes vazios em condomínios, a inclusão de terrenos das novas quadras do Guará 2 também gerou polêmica. Seriam vendidos 14 lotes nas quadras QE 48 e 58. Os imóveis mais amplos, com área entre 1,6 mil metros quadrados e 2,5 mil metros quadrados, seriam destinados à construção de edifícios e foram orçados entre R$ R$ 2,7 milhões e R$ 3,2 milhões. Terrenos de 625 metros quadrados também haviam sido incluídos no edital, para a edificação de prédios de até três andares. Nesse último caso, o imóvel teve preço estabelecido em R$ 1,6 milhão.
Mas cooperativas habitacionais prometem recorrer ao Judiciário caso o governo volte a oferecer esses lotes nos próximos editais. ;A lei determina que 40% dos lotes sejam destinados às cooperativas e isso não está sendo cumprido. Se a Terracap insistir em licitar lotes nessas quadras, vamos pedir à Justiça a suspensão da venda. Em outras tentativas, já conseguimos suspender a venda com ações e desta vez não será diferente;, garante Antônio Moraes, da Organização das Entidades Habitacionais do DF. Ele se baseia no Plano Diretor Local (PDL) do Guará, que classifica as novas quadras do bairro como área de interesse social. Com essa classificação, os terrenos não podem ser licitados por preço de mercado e devem ser destinados a pessoas de baixa renda ou cooperativas.
No caso da venda de lotes vazios nos condomínios do Jardim Botânico, a pressão contrária chegou ao alto escalão do GDF. Na última quinta-feira, uma comissão de moradores se reuniu com o secretário de Governo do GDF, Paulo Tadeu. Depois de muita costura política, eles conseguiram o compromisso do governo local de retirar os lotes vazios da etapa 1 do Setor Jardim Botânico do edital de licitação. Mas a decisão de cancelar todo o edital de 1; de setembro somente saiu publicada na edição de ontem do Diário Oficial do Distrito Federal.
O presidente da Associação de Moradores do Setor Jardim Botânico, Luiz Carlos Dantas, comemorou a suspensão da licitação. Mas ele garante que a comunidade da região vai manter uma vigilância constante para evitar que a ideia de vender os lotes seja retomada. ;Também apresentamos uma série de reivindicações ao governo, como a definição da poligonal do Setor Jardim Botânico. O governo de imediato reconheceu que não poderia fazer a licitação desses lotes;, afirma Dantas.
Associações
De acordo com a Lei n; 3.877/06, 40% de todas as áreas de interesse social devem ser destinadas a cooperativas habitacionais, 40% são para beneficiar os cadastrados na lista única da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do DF (Codhab) e os 20% restantes são destinados aos demais programas do GDF, como os que beneficiam pessoas portadoras de necessidades especiais.