postado em 06/09/2011 07:32
Quase desconhecida para a maioria dos brasilienses, a Vila Cauhy só aparece no noticiário em tempos de chuva, alagamento das ruas e perigo de desabamento das casas. A vila faz parte do Núcleo Bandeirante e tem esse nome em homenagem a um de seus mais renitentes defensores, Jorge Cauhy, comerciante, pioneiro, deputado distrital, morto em 2005.A Vila Cauhy fica à margem da BR-040, próximo ao viaduto que liga o Balão do Aeroporto ao Núcleo Bandeirante. A ocupação urbana, até hoje não regularizada, começou há mais de 40 anos numa área destinada ao Clube de Regatas do Guará. A estimativa de número de habitantes varia de 1,4 mil a 5 mil, gente abrigada em casas modestas, muitas delas ainda em madeira, incrustadas à beira do Córrego Riacho Fundo, responsável por muitas das tragédias ocorridas em tempos de chuva.
Desde que ganhou a Praça da Vitória, há seis anos, a Vila Cauhy deixou de ser uma invasão escondida atrás do matagal e do lixo. Construída à entrada do bairro, a praça é um portentoso conjunto de equipamentos de madeira ; teatro de arena, coreto, pergolado, pracinha, academia ; ainda pouco utilizado pelos moradores. Talvez porque o que sobra em beleza falta em funcionalidade.
A vila guarda um segredo colorido e saboroso: muitos moradores vivem da prestação de serviços às empresas que organizam festas e eventos. Um pioneiro no empreendimento ensinou o ofício para um, que ensinou para outro e para outro; até se transformar numa vocação do bairro.
Quando não está em canteiro de obra, o pedreiro Luciano Araújo de Souza, 44 anos, reforça o orçamento doméstico ajudando a decorar ambientes. Depois de ter aprendido a técnica, ele mesmo preparou a casa de madeira para o aniversário de 4 anos da filha, Luciana. O resultado foi tão bom que está lá até hoje. Varanda, teto, parede e sala foram revestidos com um arco-íris de plástico colorido.
Depois de ter morado em São Paulo, em Votorantim, em Sorocaba e em Peruíbe, Luciano descobriu que não existe melhor lugar para se abrigar das durezas da vida que a Vila Cauhy. ;Aqui é sossegado e perto de tudo. Perto da Rodoviária e do Aeroporto, posso ir pra onde eu quiser;, brinca. Ele só reclama da demora do governo em regularizar os lotes da vila ; ;os políticos só aparecem de quatro em quatro anos;.
Dona Alice e seu Raimundo nem reclamam mais. Casados há 52 anos, moram na vila há 25, num generoso terreno onde vivem também dois filhos. Alice Severino da Rocha Vicente, 81 anos, diz que está ficando ;um caquinho;. Rodeia-se de imagens sagradas ; Nossa Senhora Aparecida em um quadro luminoso, Imaculada Conceição à entrada, Menino Jesus pendurado em cima do sofá e uma prateleira habitada por santinhos vários.
Na borda do começo da BR-070, a Vila Cauhy esconde-se da multidão de carros em ruas estreitas e com esgoto a céu aberto e toca a vida reciclando latinhas, vendendo cocada recheada, pirulito de caramelo, fazendo salgados e decorando salões para festas e esperando ; para não se sabe quando ; a bendita escritura do lote.