Antonio Temóteo, Flávia Maia
postado em 10/09/2011 08:00
Pouco tem sido feito para evitar acidentes como o que levou à morte um garoto de 9 anos no Paranoá. A burocracia que os diretores das escolas públicas do Distrito Federal têm de enfrentar a fim de conseguirem pequenos consertos nas unidades faz com que problemas simples de serem solucionados se transformem em zonas de perigo para os alunos. Um exemplo é o fio de eletricidade desencapado que, possivelmente, foi a causa da morte do aluno na Escola Classe 4, na tarde da última quinta-feira. Além disso, os colégios começaram a receber a verba do Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (PDAF) (leia Para saber mais) apenas no segundo semestre letivo e pelo menos 49 das 459 unidades de ensino não estão com o dinheiro em mãos para fazer reparos necessários à segurança dos estudantes.
A Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDF)até tem uma equipe para realizar a manutenção preventiva, mas o contrato com as empresas responsáveis pelo serviço esteve suspenso durante o ano passado inteiro, o que contribuiu para a deterioração da infraestrutura dos centros de ensino. Os profissionais precisam ser acionados pela regional de ensino depois que a escola comunica o problema. ;Não há um prazo certo para atender o pedido. Dependendo do serviço, como um muro caído, por exemplo, pode ser no outro dia;, explicou Clerton Evaristo, assessor especial da Secretaria.
Em janeiro deste ano, o GDF anunciou a operação Escola Arrumada. Na empreitada estavam previstos pequenos ajustes nas escolas como trocas de lâmpadas, de vidraças quebradas e pintura de muros e paredes. Porém, dos 12 colégios visitados pelo Correio ontem, sete precisavam de consertos a fim de garantir a segurança dos estudantes. Entre os principais problemas estavam salas com vidros quebrados, fios de eletricidade desencapados, pregos expostos, canaletas quebradas e parquinhos com brinquedos enferrujados.
A Escola Classe (EC) 28 de Ceilândia, por exemplo, foi fundada em 1978 e, desde então, nunca passou por uma reforma de grande porte. Por falta de manutenção, o antigo parquinho foi desativado, já que colocava em risco as crianças. Agora, resta apenas o concreto e os arames que prendiam os brinquedos no chão. A fiação elétrica também está em péssimo estado. ;A gente fica arrumando de um lado, ajeitando de outro, mas chega uma hora que não tem mais de onde tirar;, conta a vice-diretora, Eunice Sousa. O colégio ainda não recebeu o dinheiro proveniente do PDAF.
No Centro Educacional Darcy Ribeiro, no Paranoá, parte do alambrado da escola foi remendado com arame farpado. No interior do colégio, é possível encontrar fiação elétrica sem a proteção adequada. Já a Escola Classe 401, no Recanto das Emas, funciona há 11 anos improvisada em salas com paredes de madeira, com fiação velha. ;No tempo seco, dispensamos os alunos mais cedo porque tememos incêndios. Se começa fogo na escola, nós não vamos conseguir salvar as crianças;, alerta a diretora.
Burocracia
Os diretores reclamam que os processos dentro da Secretaria de Educação são lentos e, quando as equipes de manutenção chegam, o problema pode estar pior. Por isso, preferem pegar o dinheiro do próprio bolso, organizar eventos beneficentes ou tentam encaixar a reforma nas cláusulas previstas no PDAF. ;Com tanta burocracia, fica difícil trabalhar. Para reformar o parquinho, vamos fazer uma festinha;, contou a diretora da Escola Classe 29 de Ceilândia, Márcia Silvana Pereira.
O diretor do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro-DF), Rodrigo Rodrigues, avalia que os últimos governantes foram negligentes com a educação pública. ;Na escola em que leciono, no Paranoá, um ventilador pegou fogo e são comuns os casos de curto-circuito em tomadas. Também falta água porque a tubulação é antiga. Telhas e vidros estão quebrados. Isso é reflexo do descaso;, protestou.
Palavra de especialista
Mais autonomia
;A lei nacional de diretrizes e bases educacionais diz que as escolas precisam de padrões mínimos para funcionamento e qualidade. Para oferecer um bom ensino, um colégio necessita de infraestrutura e isso inclui biblioteca, salas arejadas, espaços amplos. Não podemos mais admitir no país, e, principalmente, no DF, banheiros quebrados, pisos esburacados, fiação desencapada. Uma escola infantil precisa de brinquedos para estimular o raciocínio dos alunos, estudantes de ensino médio necessitam de laboratórios e livros. E para que isso tudo funcione, é essencial que exista manutenção. Por isso, as escolas precisam de orçamento próprio a fim de que a equipe de gestão possa atacar as necessidades mais urgentes. Diretores têm que ter mais autonomia para gerenciar as unidades. O governo precisa acompanhar e fiscalizar a aplicação dos recursos, mas a descentralização de orçamentos e gestão é algo fundamental.;
Professor Célio da Cunha, professor da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em Políticas Educacionais
Para saber mais
Dinheiro em caixa
Com intuito de descentralizar as verbas e manter a escola com dinheiro em caixa, a Secretaria de Educação instituiu o Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (Pdaf) em 2008. Cada escola recebe de acordo com o número de alunos e as principais necessidades. A verba não pode ser usada para reformas nas escolas, mas pequenos consertos são autorizados. O dinheiro é destinado a necessidades pedagógicas e administrativas. A média anual é de R$ 38 por aluno e, no Distrito Federal, cada colégio recebe de R$ 30 mil a 90 mil.