Ações criminosas podem estar por trás da maior tragédia já registrada na história da Floresta Nacional (Flona). O Corpo de Bombeiros estima que, até o fim do dia de ontem, 85% dos 3.353 hectares de vegetação da área 1 da Flona foram devastados pelas chamas. A região é dividida em quatro partes, que, somadas, têm tamanho equivalente a 10 mil campos de futebol. Em outros cantos do Distrito Federal, o fogo também não dá trégua. De janeiro para cá, estima-se que 17,5 mil hectares de mata foram destruídos. Desse total, 7,5 mil apenas de quinta-feira até ontem.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, suspeita que invasores de terra sejam os responsáveis por atear fogo em locais de interesse de grileiros. Chacareiros que ocupam clandestinamente parte do território da Flona também podem ter causado o estrago. Somente este ano, o ICMbio notificou 80 deles, sob acusação de uso indevido dos recursos naturais. Na próxima semana, o instituto pedirá que a Polícia Federal investigue as denúncias de crime ambiental.
Há quatro dias, o Distrito Federal arde em chamas. Ontem, mais uma vez, militares e brigadistas tiveram muita dificuldade para controlar os focos de incêndio. A fumaça no horizonte era visível. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a umidade caiu a 12% e a temperatura chegou a 32,8;C.
Ameaçado de fechar devido ao incêndio que consumiu parte da Reserva da Aeronáutica, o Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek foi o primeiro a receber atenção especial. Coberto por uma nuvem de fumaça durante todo o dia, o encerramento das atividades aeroportuárias só não ocorreu porque um avião C-130 da Força Aérea Brasileira (FAB) entrou em ação. Do Hércules, adaptado para o combate ao fogo, foram despejados na mata situada à cabeceira da pista de pousos e decolagens mais de 24 mil litros de água.
Controlados os focos nas redondezas do aeroporto, por volta do meio-dia, o comandante da FAB, Juniti Saito, autorizou o envio do C-130 para socorrer a Flona, que ardia em chamas. Reabastecido, o avião fez um voo rasante apagando parte das labaredas com 12 mil litros de água. Além do Hércules, dois aviões de pequeno porte, 90 bombeiros, 22 brigadistas e dezenas de voluntários se mobilizaram para combater as chamas,que avançavam rapidamente sobre a vegetação.
O ponto mais crítico era às margens da BR-070, na altura da QNG, em Taguatinga Norte. A fumaça assustou os motoristas que passavam pela rodovia. Muitos deles, solidários aos combatentes, estacionaram seus veículos e tentaram apagar os focos utilizando galhos de árvores.
[SAIBAMAIS]Relato
A chefe da Flona, Miriam Ferreira, traz um relato que reforça a tese de crime ambiental na área de preservação ambiental da floresta. Ela e outros técnicos sobrevoavam a região pela manhã, quando o fogo, até então controlado, começou a se alastrar novamente por meio de dois focos. Algumas testemunhas contaram que pessoas em atitude suspeita foram vistas minutos antes de o incêndio avançar sobre árvores e plantas. De acordo com ela, os invasores de terras públicas estão se aproveitando da seca para destruir a mata sem serem notados. ;Autuamos muita gente por fazer mau uso dos recursos da Flona e isso gerou um descontentamento dessa população, que decidiu se vingar cometendo esse tipo de crime. Eles querem desmatar algumas regiões para parcelarem terrenos irregularmente;, afirmou Miriam. Até o fechamento desta edição, os bombeiros contabilizaram 33 focos de incêndio de pequeno porte em todo o DF, que destruíram 48 hectares.
O que diz a lei
A Lei Federal n; 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, conhecida como Lei de Crimes Ambientais, prevê punição para quem provoca incêndios florestais. A prática pode render reclusão de dois a quatro anos e multa. Se o crime é culposo (sem intenção), a pena é de detenção de seis meses a um ano, além de multa. O Código Penal Brasileiro, de 1940, em seu artigo 250, também estabelece penalidade a quem ateia fogo em áreas verdes. A pena é de reclusão de três a seis anos, além de multa, que aumenta em situações especiais, entre elas quando o crime é cometido com intuito de obter vantagem financeira ou em lavoura, pastagem, mata e floresta.