O céu azul de Brasília está escondido atrás de uma camada de fumaça. Depois de amargar quatro dias de intensas queimadas no cerrado, os moradores da capital sofrem com os efeitos das chamas que atingiram o Jardim Botânico, a Floresta Nacional e a Reserva da Aeronáutica. Esse vapor cinza gera irritação nos olhos, tosse e alergias, além de atrapalhar o comércio, o trânsito e as atividades diárias comuns, como a lavagem das roupas. Para amenizar o sofrimento, a população criou alternativas.
No trânsito, o jeito é reduzir a velocidade, acender os faróis ou esperar a visibilidade melhorar. Por volta das 12h de ontem, o autônomo Edivaldo Barbosa, 38 anos, passava pela BR-070 quando viu o fogo avançar pela pista. Sem conseguir ver direito os outros veículos por causa da fumaça, ele parou o carro no acostamento. ;Estava voltando para casa e tive de reduzir a velocidade. É um absurdo o que está acontecendo na Floresta Nacional. Se alguém fez isso com cigarro ou queimando lixo, tem que ser punido;, protestou.
[SAIBAMAIS]No Lago Sul, o incêndio do Jardim Botânico, que despejava fumaça espessa sobre as casas da região, foi controlado. Porém, na manhã de ontem, muitos ainda sentiam os efeitos do incêndio. Gerente de uma loja de roupas, Mércia Conceição, 35 anos, preocupou-se, pois o cheiro deixado no local era muito forte. A opção foi abrir as portas e aumentar a quantidade de perfume borrifada diariamente. ;Antes, fazíamos isso duas vezes por dia. Agora estamos usando o aromatizador a cada 30 minutos;, relatou. Ela sofre no trabalho e em casa. Moradora da Vila Planalto, teve de improvisar para conseguir lavar roupas. ;Enfileirei os bancos e coloquei o lençol para secar dentro de casa.;
A proprietária de um restaurante no Setor de Mansões Dom Bosco apostou nos baldes d;água. Ela despeja o líquido no chão duas vezes ao dia. ;Fica sujo demais. É muita fumaça, mas a água ameniza. A quantidade de clientes diminuiu nesses dias. Agora, eles preferem vir, pegar a marmita e ir embora.; A má notícia é que o sofrimento deve continuar. Segundo a meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia Odete Chiesa, se não chover, a fumaça não vai acabar. ;Há incêndios por todos os lados. A névoa seca piora a situação. Só a chuva melhora, e não temos previsão para que ela aconteça;, explicou.
Risco de pneumonia
Fruto das queimadas no DF, a fumaça também prejudica a saúde dos moradores. Ela vem carregada de monóxido de carbono (CO), que diminui a qualidade do ar respirado. ;Nessa época já é difícil respirar por causa da seca. Sem a quantidade de oxigênio necessária, os problemas respiratórios aumentam ainda mais;, ressalta o pneumologista Ricardo Martins, do Hospital Universitário de Brasília (HUB). A inalação da fumaça pode causar falta de ar, tosse seca, mal-estar, dor de cabeça, tontura, indisposição e cansaço, entre outros sintomas.
Os mais afetados são as crianças, os idosos e aqueles que apresentam algum tipo de alergia. Eles não têm as defesas necessárias para se proteger da poluição do ar e, se não forem medicados corretamente, podem desenvolver pneumonia. ;A inflamação pode começar com a irritação do nariz, da faringe, dos brônquios, dos bronquíolos e do pulmão. Se não for tratada, é capaz de gerar uma secreção espessa, que vai ocasionar a pneumonia;, ressaltou a coordenadora da especialidade de alergia e imunologia na Secretaria de Saúde do DF, Marly Marques da Rocha.
Segundo ela, para evitar os sintomas mais graves, é necessário fazer a prevenção adequada: aplicar soro fisiológico nas narinas, ingerir muito líquido, lubrificar os olhos com colírios indicados por um médico e fazer nebulização com soro. Aqueles que moram muito perto dos focos de incêndio podem usar máscaras e colocar baldes de água, umidificadores ou toalhas molhadas nos quartos.