Brasília arde há cinco dias. Ontem, para piorar, foi registrada a maior temperatura do ano. Por volta das 15h, os termômetros marcaram 33,3; C, o quarto recorde em menos de um mês. Já a umidade relativa do ar ficou em 13%, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Em meio ao sufoco, os bombeiros e brigadistas tiveram trabalho para conter 40 focos de incêndio. Desde o início do ano, 21,9 mil hectares (o equivalente a quase 22 mil campos de futebol) de área verde foram consumidos pelo fogo, sendo que 11,9 mil somente de quinta-feira até ontem. No ano passado, foram 8,2 mil hectares. O maior estrago é na Floresta Nacional (Flona), que perdeu 70% de sua vegetação, o que representa 6,5 mil hectares dos quase 10 mil de área total.
Sem chuvas há 94 dias, as regiões de Brazlândia, Gama, Guará, Taguatinga e Águas Lindas (GO) são as que mais sofrem com as queimadas e a fumaça, que deixa o céu da capital cinza e a população com dificuldades para respirar. Desde o último dia 7, seis áreas florestais perderam grande parte de sua mata. O Jardim Botânico, a Fazenda Água Limpa, da Universidade de Brasília (UnB), e as reservas da Aeronáutica e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tiveram 15,4 mil hectares consumidos, o que representa 75% do total. A Flona e o Parque Ecológico Ezequias Heringer, localizado no Guará, também foram castigados pelo fogo.
;Não temos uma situação crítica, como na última quinta-feira. O fogo está controlado, mas ressurge em algumas áreas. Hoje (ontem), o dia de ações foi intenso. Não conseguimos precisar ainda o estrago total, mas a ajuda aérea e o trabalho preventivo têm sido essenciais para estabilizar a situação;, ressaltou Renata Fortes, assessora especial do gabinete da Secretaria de Meio Ambiente do DF.
O Parque Ezequias Heringer começou a pegar fogo às 12h de sábado. Por volta das 22h do mesmo dia, os bombeiros tinham controlado o incêndio, mas agentes do Instituto Brasília Ambiental (Ibram) e chacareiros viram um rapaz de bermuda correndo pelas matas e ateando fogo novamente. Ontem, uma área de vegetação mais densa foi queimada e, devido à dificuldade de acesso, as equipes contaram com o reforço aéreo. Ainda pela manhã, um helicóptero do Corpo de Bombeiros passou pela área fazendo uma avaliação. Logo depois, o Hércules C-130, da Força Aérea Brasileira, despejou 12 mil litros de água para tentar conter o fogo.
Na área 1 da Floresta Nacional, onde a diretoria estima que mais de 85% dos 3.353 hectares de mata tenham sido devastados, o incêndio voltou a fazer estragos. Nas proximidades do Incra 7, era possível ver a fumaça preta de longe. Dois aviões foram contratados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio), do Ministério do Meio Ambiente, para ajudar os 105 bombeiros e 22 brigadistas a combater as chamas. Além disso, outros dois aviões de pequeno porte e o Hércules despejavam água no local. Essa é considerada a pior tragédia ambiental da reserva. Na área 4, o fogo se aproximou do Córrego Capão da Onça, que abastece Brazlândia.
Fauna
A preocupação em conter esse foco específico é a proximidade com o espelho d;água e o Ribeirão das Pedras, locais nos quais os animais se refugiam. É lá que tatus, capivaras, veados, tamanduás-bandeira e outros animais se alimentam e fazem uso da água cristalina. ;Ainda não fizemos um levantamento de animais mortos. Encontramos nesses dias cobras, lagartos e pequenos pássaros queimados. Um levantamento será feito quando os incêndios diminuírem;, afirma a chefe da Flona, Miriam Ferreira. O ICMbio pedirá à Polícia Federal que investigue se o fogo foi provocado de maneira criminosa.
No local, era possível ver ontem carcarás sobrevoando a vegetação queimada. Nas áreas já devastadas, eles andam sobre a fuligem em busca de alimentos. Segundo a superintendente técnico-científica do Jardim Botânico Vânia de Araújo Soares, existe o risco de que esses animais invadam o perímetro urbano para fugir do fogo e procurar alimentos.
Para ter comida de volta, será preciso esperar. As árvores podem levar de cinco a 10 anos para cresceram novamente. No céu, a fumaça também só deve se dissipar depois da chuva, que não tem data para chegar. Ontem à noite, a lua estava envolta pelo vapor espesso. ;Quando o ar está muito poluído, a lua aparenta essa cor embaçada;, explicou o meteorologista Hamilton Carvalho.
Recordes
Em 1963, foi registrado o período mais crítico da seca na cidade, com 164 dias sem chuvas. Este ano bate o recorde de ter alcançado a mais severa repetição de índices críticos da história. Foram dois dias chegando aos 10% de umidade do ar: em 9 de agosto e 5 de setembro. Os recordes de calor dos últimos 10 dias ainda não ultrapassaram o dia mais quente da história do DF, medido em outubro de 2008, em 35,8; C.