postado em 28/09/2011 06:28
A distrital Eliana Pedrosa (DEM) teve o privilégio de conseguir um benefício médico que a maioria dos servidores da Câmara Legislativa não sabe nem sequer da existência. Os cinco deputados que integram a Mesa Diretora desconsideraram um parecer técnico do Fundo de Assistência à Saúde da Casa (Fascal) para autorizar uma cirurgia de catarata na parlamentar fora dos padrões do plano oferecido aos servidores. Ela se valeu de uma brecha legal, que poucos conhecem, com poder de delegar à esfera política a decisão sobre liberar ou não casos extraordinários. Foi a única entre deputados e servidores a ter esse tipo de autorização desde dezembro de 2009, quando a regra foi criada pelos próprios distritais. Em maio deste ano, a deputada precisou fazer uma cirurgia para tirar a catarata dos dois olhos. Nos padrões apresentados pelo médico de Eliana, o Fundo não cobria o tratamento. A distrital, então, conseguiu diretamente com os colegas da Mesa Diretora autorização para o ressarcimento dos gastos com a cirurgia. Foi a primeira e única até agora a se beneficiar de uma cláusula enxertada na regulamentação interna da Câmara Legislativa que permite aos distritais contrariar o parecer técnico do Fascal e tomar a decisão política de estender internações, bancar cirurgias e criar benefícios fora do plano a deputados e servidores. Trata-se da Resolução n; 243 de 2009, que altera a estrutura de organização do Fascal. Apesar de a resolução especificar que as mudanças são ;sem aumento de despesa;, o artigo 7; abre uma margem da qual se valeu a deputada Eliana. O dispositivo estabelece o seguinte: ;Fica a Mesa Diretora autorizada a promover ou adicionar alterações sobre assuntos de prorrogações de internações, percentuais de mensalidades, participações nas consignações e novos auxílios ou benefícios;.
Com base nessa resolução, em 26 de maio deste ano, foi publicado o Ato da Mesa n; 61. Ele autoriza a ;utilização de material especial em procedimento cirúrgico em ambos os olhos de associado do Fascal;. O material está especificado no artigo 1; do ato. Trata-se de lente multifocal restor usada na cirurgia de Facectomia com implante de LIO, especificação técnica para um dos tipos de operação de catarata. O processo não identifica o nome do paciente, especificado como requerente 001-000762/2011.
Protocolo
O espelho de acompanhamento do processo registrado no sistema de protocolo da Câmara (que é de acesso restrito aos servidores) mostra que o caso começou a tramitar em 24 de maio. Dois dias depois, a Mesa Diretora autorizou o procedimento que favoreceu a deputada. Ao recorrer diretamente aos colegas da Mesa Diretora, Eliana Pedrosa encurtou etapas para conquistar o reembolso médico. Todos os processos analisados pelo Fascal podem ter até três etapas de avaliação. Assim que um pedido de procedimento é apresentado, ele passar a ser analisado por técnicos. Se o parecer é negado, pode ser apresentado recurso à gerência do Fundo e, em caso de nova negativa, a situação ainda é submetida ao Conselho Administrativo do Fascal. A deputada, no entanto, fez a primeira tentativa. Não conseguiu e recorreu diretamente aos colegas da Mesa, no que foi prontamente atendida.
Eliana pode, assim, quitar uma fatura de R$ 4,6 mil, custo das lentes usadas em sua cirurgia. O que o Fascal poderia oferecer era um outro tipo de tratamento, que chegaria a R$ 1,6 mil no total, ou seja, um terço do valor autorizado pela direção da Câmara. A exceção permitida pela Mesa Diretora é a primeira desde que o dispositivo do artigo 7; entrou em vigor há dois anos. Não que a deputada seja a única a precisar adequar o plano de saúde da Câmara à medida de suas necessidades médicas.
O Correio apurou com fontes ouvidas na Casa que nos últimos dois anos o Fascal foi procurado por dezenas de servidores que entram com processo na tentativa de que o Fundo banque intervenções ou internações fora do plano de saúde. ;Desde 2009, há quase uma centena de processos, a maioria deles negados, pois o Fundo tem limites orçamentários e a maioria dos servidores nem sabia da existência de uma resolução que delega à Mesa Diretora o poder de decidir sobre esses casos;, explicou um servidor com acesso a dados do Fascal, mas que prefere preservar a identidade para evitar retaliação. De fato, quem consulta o site da Câmara no item ;normas da Fascal; vai achar vários atos da Mesa e resoluções referentes ao Fundo. Menos o 243 que permite moldar o plano de saúde da Câmara aos problemas dos servidores e deputados.
Dispositivo
A Resolução 243 foi editada em dezembro de 2009, no auge da Caixa de Pandora, quando o então presidente da Casa, Leonardo Prudente, renunciou ao cargo após ser acusado de participar do esquema de corrupção. No lugar dele, assumiu Wilson Lima (PR), que era primeiro-secretário, mas que, diante da confusão, acabou elevado a presidente
da Câmara. Foi na função interina que Wilson Lima assinou o dispositivo que dá à Mesa Diretora poderes de avaliar questões de plano de saúde.