Cidades

Casal que perdeu os filhos em um grave acidente na BR-060 espera um bebê

postado em 23/10/2011 08:00
Em 17 de dezembro de 2010, a professoraVyviane Marques Arantes Campos Moraes sofreu o mais duro golpe da vida dela. Vítima de um acidente de trânsito, teve o pulmão perfurado (e operado duas vezes), a coluna fraturada na altura da vértebra L5, os ossos dos dois pés estilhaçados e o tendão do braço direito rompido (ela é destra). Mas foi o coração que, aos 35 anos, Vyviane sentiu congelar sem parar de bater. Ela perdeu os dois filhos, João Marcos, 7 anos, e Pedro Lucas, de apenas 3, na tragédia. A imprudência de um motorista que atravessou o caminho da família Campos Moraes arrancou de Vyviane a maternidade. Mas a força dela e do marido, Marcos Moraes, que lutam por justiça em memória dos filhos, e o amor do casal pela vida fizeram brotar uma semente de alento na trajetória dos dois. Em 11 de novembro, Vyviane entrará no quarto mês de gestação, quando conhecerão o sexo do bebê que esperam. Uma data que não apagará aquele 17 de dezembro, mas trará a perspectiva de dias melhores.

A gravidez é o início de uma jornada que devolverá ao apartamento do casal, no Bloco E da 304 Norte, o cheiro de criança, as marcas de dedo na parede, os bonecos espalhados pela casa. É dessa motivação que o casal vai se alimentar para enfrentar uma caminhada que também está no começo, deve ser longa, mas pode conduzir o casal a conhecer a Justiça dos homens, único desejo que motivou o bancário Marcos, 42, a se levantar da cama ainda convalescente para buscar reparação judicial pela morte de seus dois meninos.

[SAIBAMAIS]Nessa direção, o Ministério Público de Goiás (MP-GO) deu o primeiro passo. Denunciará nesta semana o motorista Fabrício Camargos Cunha Rodovalho, 28 anos, por homicídio com dolo eventual ; quando a pessoa, ao agir irresponsavelmente, assume o risco de matar. Engenheiro ambiental, Fabrício voltava do trabalho pela BR-060 em sua Saveiro quando, na altura do Km 179, zona rural de Abadia de Goiás, em Guapó (GO), se arriscou a uma ultrapassagem em pista com faixa contínua, onde essa manobra é proibida. Acertou frontalmente o Fiat Idea de Marcos e Vyviane, que planejavam chegar à casa dos avós maternos de seus filhos antes de anoitecer.

Para o promotor de Justiça que assina a ação, Marcelo Franco de Assis Costa, ao tomar a decisão de dirigir em alta velocidade, ultrapassar em local proibido e de intenso tráfego, Fabrício cometeu crimes ;não alheios à sua vontade;. Interrompeu a vida de duas crianças e comprometeu para sempre os planos do casal, que também ficou gravemente ferido no desastre.

Busca desesperada
Em uma história cadenciada pelos soluços de pais que perderam os filhos e pela leniência de autoridades competentes em dar respostas sobre as causas do acidente, o Ministério Público de Goiás fez a diferença. Agiu rápido em um processo que ficou pouco mais de seis meses adormecido na delegacia de Guapó, onde ocorreu o desastre. Antes de pedir socorro ao MP, o casal procurou três delegacias de Goiás na tentativa de descobrir em qual delas havia registro sobre o acidente.Marcos e Vyviane não encontraram informações porque, 180 dias após a batida, não havia inquérito aberto, embora duas testemunhas fossem policiais civis, lotados justamente na delegacia de Guapó.

Em 13 de junho, um dia após tomar conhecimento do caso, o promotor Marcelo Franco enviou ofício para a delegacia de Guapó cobrando providências para a apuração das causas do acidente. Assim, seis meses depois da tragédia, o inquérito foi finalmente aberto, no dia 15. Oito pessoas, entre elas o motorista que provocou o acidente, foram ouvidas pelo delegado Davi Freire Rezende, que assumiu as investigações. Mas ainda faltava a conclusão do laudo da perícia feita no dia da batida, cujo resultado foi adiado várias vezes e só ficou pronto em 4 de agosto, após o Correio publicar reportagens mostrando o drama do casal. A conclusão do Instituto de Criminalística de Goiás é que a Saveiro em alta velocidade e na contramão causou a morte dos irmãos João Marcos e Pedro Lucas.

A partir do inquérito que juntou a análise técnica de perícias e o relato de testemunhas, o Ministério Público concluiu que houve crime com intenção de matar. ;Ao conduzir acima da velocidade permitida e ultrapassar em local proibido, o denunciado assumiu o risco de produzir a morte das vítimas. O meio e a forma empregados (condução perigosa do veículo), por outro lado, ensejaram perigo comum a todos os que trafegavam no mesmo local;, sustenta Marcelo Franco, na denúncia.O promotor pediu no processo a suspensão da licença de dirigir do acusado sob pena de ele colocar outras vidas em perigo. A denúncia, no entanto, ainda será analisada pela Justiça, onde o caso pode ser decidido por júri popular.

Falta de estrutura
Na época, o coordenador da Divisão de Perícias Externas da Polícia, Jair Alves da Silva, justificou a demora na conclusão do laudo sobre o acidente com a falta de pessoal no órgão. Embora a perícia tivesse sido realizada no dia da tragédia, ainda faltava o relatório que apontaria as circunstâncias da batida. Quando pronto, o documento mostrou que a velocidade dos dois carros ao se chocar produziu umimpacto de 180km/h.

O que diz a lei
Pelo Código Penal, homicídio doloso prevê punição de 12 a 20 anos de cadeia. Como nesse caso há o atenuante de ser eventual, a pena é de até 12 anos. Os crimes de natureza culposa, quando não há a intenção de matar, são, no entanto, reparados com castigo mais leve, de dois a quatro anos.

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