Cidades

Em entrevista ao Correio, Agnelo fala sobre Copa, violência e saúde

Ana Maria Campos
postado em 23/10/2011 08:00

Zurique ; Agnelo Queiroz não esconde que os assuntos relacionados ao Esporte são a menina dos olhos de sua administração. O governador do Distrito Federal viajou para Zurique abatido pela crise com o ministro do Esporte, Orlando Silva, que respingou em sua passagem pela pasta entre 2003 e 2006. Na Suíça, no entanto, ele se revigorou com as boas notícias anunciadas pela Federação Internacional de Futebol (FIFA) na distribuição dos jogos da Copa do Mundo.

Brasília sediará sete partidas no Mundial de 2014 e ganhou o direito de dar o pontapé inicial na Copa das Confederações. Apenas o Rio de Janeiro se igualou a Brasília no número de jogos do torneio de futebol mais importante do planeta. Não é pouca coisa para uma cidade sem times na primeira divisão e nenhuma tradição no esporte.

Em entrevista ao Correio, em Zurique, horas antes de embarcar de volta ao Brasil, Agnelo deixou claro que ainda sonha com a abertura da Copa do Mundo, designada pelo comitê gestor da Fifa para o Itaquerão, estádio do Corinthians, em São Paulo. ;Se eles derem conta, ótimo. Qualquer problema em São Paulo ou em algum outro lugar, evidente que Brasília está de braços abertos para assumir um papel maior do que o atual;, afirmou.

O governador também falou sobre as suspeitas de desvios de recursos no programa Segundo Tempo, criado na gestão dele no Ministério do Esporte. Disse que a crise na pasta não é um problema dele e sim de Orlando Silva, que o sucedeu. Sobre o denunciante, João Dias, dono de duas ONGs que teriam participado de um esquema de corrupção, Agnelo não tem palavras de ataque. Afirma desconhecer algo que o desabone e deixa o veneno para seus opositores: ;Querem criar um terceiro turno das eleições;.

Brasília sai vitoriosa no anúncio da tabela da Copa?
Com a abertura da Copa das Confederações, Brasília terá um peso muito grande. Um ano antes da realização da Copa, vamos começar a capitalizar os investimentos para a cidade. A Copa das Confederações é um belíssimo evento que reúne as melhores seleções do mundo, que são as campeãs dos continentes. Vamos chamar a atenção do mundo para Brasília. Esse é o nosso grande objetivo nesse evento: incluir Brasília no roteiro internacional do turismo. Foi uma vitória grande.

O senhor ficou satisfeito com a tabela da Copa de 2014, sem abertura do torneio em Brasília?
Vamos realizar sete jogos. É o maior número que uma cidade pode ter. Vamos, com isso, manter a cidade cheia durante todo o período da Copa, inclusive com o jogo do Brasil. Vamos aproveitar na plenitude o evento, do começo ao fim. Estou muito satisfeito.

Brasília não tem tradição no futebol. O fato de o senhor ter sido ministro do Esporte contribuiu para que Brasília tenha se destacado na distribuição das partidas?
Contribui porque é uma interlocução de quem tem a real dimensão da importância do bom evento que existe no mundo. Tomei as medidas necessárias para que, no período da decisão, Brasília estivesse num outro patamar do que encontrei. Nós não tínhamos condição de competir em absolutamente nada e hoje, nove meses depois, estávamos disputando o topo, a própria abertura até em melhores condições que São Paulo. O Itaquerão está levando a abertura da Copa do Mundo pelo aspecto mesmo da força econômica.

O senhor fez uma campanha muito voltada para a Saúde, mas é
possível perceber que o Esporte é o carro-chefe do seu governo. Por que é tão importante?
Para enfrentar os problemas sociais, é muito importante ter desenvolvimento econômico, gerar emprego, renda e oportunidade para as pessoas. Devemos fazer isso com a política inclusiva, que é dar oportunidade para a juventude se qualificar e ser inserida no mercado de trabalho. A gente só faz isso com desenvolvimento.

No programa do PT, o senhor apareceu dizendo que os desafios na Saúde eram maiores do que o senhor esperava. Pode marcar
nova data para a Saúde atingir um patamar de excelência?
O problema central hoje são as emergências. Há uma distorção pela falta de uma gestão correta há anos. Há uma cultura de usar a emergência para uma consulta normal, quase ambulatorial ou de pequenas queixas, de baixa gravidade. Isso é uma distorção absurda. É contra o sistema. Essa pessoa está disputando a atenção de uma equipe que poderia estar atendendo uma pessoa em estado grave, com risco de morte. Um pequeno atraso custa uma vida. No final de 2012, teremos mudado essa cultura com investimento na atenção básica, no Saúde da Família, e uma rede de urgência e emergência. Até lá já teremos todas as UPAs em funcionamento. Não tenho dúvidas de que, no final de 2012, teremos recuperado um sistema de saúde que estava absolutamente falimentar.

Um problema crescente no DF, segundo apontam os próprios índices do governo, é a violência. O senhor está preparado para resolver essa questão?
Esse é um problema mesmo, segundo os indicadores. Cabe a nós uma política de prevenção forte, fazer um trabalho na política social, que é cuidar da infância, da adolescência, da nossa juventude. Importante a escola em tempo integral que nós vamos começar a implantar no nosso governo progressivamente. Esse é um ponto importante, a ocupação dessa juventude, com alternativas de qualificação profissional, treinamento. A outra parte é mais de repressão, com a melhoria do nosso aparato de segurança, melhorar a inteligência, a capacidade de investigação e a parte ostensiva. Isso nós vamos fazer. A droga é um capítulo especial. Lançamos um programa de integração, articulado com o governo federal, desde a repressão, passando pelo tratamento e até o combate implacável ao tráfico.

Sabemos que Brasília tem uma polícia que em algumas situações age de forma política. Isso pode interferir no papel que ela tem na segurança pública?
Pode. Nós não podemos é deixar que isso ocorra. Temos vários exemplos dessa ordem no passado. Por isso, nossa procura incansável de profissionalizar nossas polícias. Não deixar politizar. Se tem uma direção consequente, austera, firme como deve ser a direção da segurança pública, que tem que funcionar com hierarquia, não tenho dúvida de que vamos superar certos vícios do passado.

Recentemente houve uma operação policial na área de desvio de recursos públicos em que os principais investigados fugiram.
O senhor acredita em vazamentos de informações em operações?
Sim. Infelizmente. Importante é que essas coisas serão apuradas rigorosamente. A própria fuga de presos da Papuda, da forma que se deu. Alguém tem dúvida de que foi acobertada por pessoas responsáveis pelos presos? Só que isso, por vários interesses, ninguém ia atrás. Nós estamos indo atrás e já tem resultados. Se 98% têm compromisso com a sociedade, essa pequena parcela que usa a instituição para outro interesse evidentemente que não pode macular toda uma instituição. A polícia não pode ser utilizada com fins políticos individuais, para proteger seus comparsas e ir atrás dos seus adversários.

Como o chefe da Polícia Civil em última instância é o governador, o senhor se sentiu constrangido pela operação de policiais no DF que
envolveu o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, um dos integrantes do comitê executivo da Fifa que decidiu a tabela da Copa?
Não. Estão em curso processos normais de investigação da polícia. Devem ser sempre processos imparciais, desenvolvidos normalmente.

O senhor se sente incomodado em ter de se submeter à política para
escolher alguns integrantes de sua equipe em área técnica, como
ciência e tecnologia, para uma composição de apoio ao seu
governo?
Eu sou uma pessoa da política e vejo com muita naturalidade que essa é a forma republicana das composições. As pessoas que ajudaram a vencer a eleição e querem construir um novo caminho para o Distrito Federal têm que participar do governo. Isso é legítimo. É uma forma de corresponsabilidade. Isso é muito diferente do que havia num passado recente, que era a compra das pessoas para ter apoio.

Vai ter mensalão?
Não aceito de forma nenhuma. Nunca fiz e não farei porque isso é o fim. Nós já tivemos uma forma desastrosa na nossa cidade e olha que não foi só no Legislativo. As instituições no DF foram contaminadas. Isso é gravíssimo.

O senhor tem uma parceria até de amizade com o senador Rodrigo Rollemberg, mas é clara a pretensão dele de disputar o governo. O senhor se incomoda?
Não me incomoda em absoluto. As aspirações são legítimas no mundo político. O importante é ter lealdade mesmo quando as opções são divergentes. Então, Rollemberg e o PSB são aliados de primeiro momento, ajudaram a construir essa vitória, ajudam esse governo a governar, com uma participação importantíssima em áreas estratégicas. A tendência é manter essa parceria. Aposto nisso. Se ele tiver um entendimento diferente disso, tem todo o direito. Mas precisa saber que para isso precisa construir um caminho fora do nosso governo. É preciso ser leal mesmo com o adversário.

O senhor foi do PCdoB e deixou o partido para se filiar ao PT. Essas coisas deixam sequelas. Neste momento de denúncias contra o ministro Orlando Silva, muito se fala num embate entre PT e PCdoB. O partido no qual o senhor foi filiado pode de alguma forma prejudicá-lo?
Acho que não. Sempre tive um comportamento muito reto com relação a isso. Segui o meu caminho, achando que era correto, sem ter pronunciado uma frase que pudesse denegrir, ofender e renegar o meu passado. Evidente que eu espero reciprocidade em atitudes políticas. Qualquer rompimento dessa posição, eu também terei o mesmo comportamento. Mas não vejo nenhuma dificuldade. O PCdoB participa do nosso governo.

O senhor está sendo acusado de receber recursos do Ministério do Esporte, como Orlando Silva. O que pode dizer?
Tive tentativas de ofensas na campanha. Desde lá, ficou claro que a acusação não é verdadeira e enfrentei. Desmascarei meus adversários e nunca fiz acusação a nenhuma outra pessoa por conta de ataques políticos, feitos de forma extremamente vil. Uma coisa até inimaginável na política ocorreu: pagar um indivíduo para ir à televisão no programa de um candidato.

O STJ abriu inquérito para investigar o senhor ,que agora, a pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deve ir para o STF. O senhor será investigado com o Orlando Silva. Mesmo assim, considera coisa de adversários?
Há uma crise no Ministério do Esporte que precisa ser tratada. Eu já saí de lá há seis anos, sem nenhum processo. Fiz um mandato absolutamente exitoso em todos os aspectos. Os meus adversários estão se aproveitando disso para fazer dessa crise lá um terceiro turno aqui. Esses que eu derrotei fragorosamente na eleição, com uma vitória maiúscula, querem fazer um terceiro turno retomando denúncias que desmascarei na campanha. E é justamente esse segmento do DEM e do PSDB que jogou a cidade no fundo do poço e agora se arvora em me atacar.

O senhor tem algum receio de que o João Dias possa atingi-lo de alguma forma?
Não. Em absoluto. Não tenho receio nenhum porque nunca fiz nenhum procedimento que possa me envergonhar, que seja errado. Nunca pedi a ele, nem a ninguém, que fizesse algo errado. É isso que me deixa absolutamente tranquilo. A convivência que tive com ele foi excelente. Ele foi candidato no meu partido na época, participou, teve um excelente desempenho, fizemos muitas atividades em conjunto. Não posso dizer que tenha algo que possa desabonar a minha conduta, nem algo com ele que fosse incorreto.

A situação do Orlando Silva ficou insustentável diante dessa avalanche de denúncias?
Não posso julgá-lo, nem seria correto, até porque fui o antecessor. Então, qualquer coisa que eu diga poderia passar impressão de algum tipo de ressentimento ou problema. Muito pelo contrário. Sempre tratei a minha saída de forma política e trato de forma política minha relação. Por isso, tenho uma boa relação com ele e tudo que foi encaminhado do Ministério do Esporte para Brasília, fizemos em altíssimo nível. Tanto é que Brasília é candidata a sediar a Universíade de 2017, com apoio do ministério.

A questão da Lei Geral da Copa e as divergências com a Fifa são a
fonte da desestabilização do ministro do Esporte?
Não. Essa posição em relação à lei é da presidente Dilma. E não é uma posição de intransigência. É uma posição de discutir os pontos divergentes. O Brasil tem um compromisso internacional assumido. Compromisso é para cumprir. Se fosse diferente, perderíamos a credibilidade num acordo internacional. A presidente Dilma não está discutindo nesses termos. Ela está discutindo uma solução dentro da legislação brasileira que atenda a organização do evento e a soberania brasileira.

O Itaquerão foi anunciado pela Fifa como o estádio que vai abrir a Copa do Mundo, mas a obra ainda está atrasada. Existe esperança de que isso seja revertido?
Não digo esperança. Vou torcer pelo desempenho de todas as cidades sedes porque disso depende o sucesso da Copa. São Paulo é uma cidade importantíssima, um grande centro do país, tem que ter um papel destacado no Mundial. Pensar diferente seria olhar apenas para o próprio umbigo. Mas não deixo de reconhecer que eles atrasaram e estão muito aquém de suas tarefas locais. Se eles derem conta, ótimo. Qualquer problema em São Paulo ou em algum outro lugar, evidente que Brasília está de braços abertos para assumir um papel maior do que o atual.

O senhor viajou num momento de turbulência política. Volta tranquilo para retomar a agenda?
Muito tranquilo. Brasília teve uma vitória estrondosa em Zurique. Estamos retomando a confiança na cidade das esperanças, das oportunidades. Essa é a marca de Brasília, de pessoas empreendedoras. Volto com essa vitória. E quanto aos problemas internos, estou mais tranquilo ainda. Terei oportunidade de desmascarar quem quer o terceiro turno. O tiro vai sair pela culatra porque eles serão desmoralizados.

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